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Réveillon em Colônia: uma lição de Hegel

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köln keine gewalt gegen frauen

As notícias recentes confirmam o que prognosticamos a respeito do trágico Réveillon em Colônia (Köln), na Alemanha: o brutal ataque de assédios sexuais em massa perpetrado por imigrantes muçulmanos contra as mulheres alemãs foi muito pior do foi relatado a princípio.

Contra a inicial centena de casos de assédio sexual relatados à polícia, o número já subiu para 379. Dois fatores óbvios precisam ser levados em consideração: a proverbial reclusão germânica para falar de si próprio e o estranhamento completo da população de uma cidade civilizada em ter de ir à delegacia relatar um caso de assédio sexual de anônimos inidentificáveis numa multidão, quando esperam que a polícia já esteja suficientemente bem informada.

Há entendimentos fragmentados a respeito de muitas notícias que chegam antes de se formar um todo coerente, como é comum em investigações policiais – e com fatos e ideologias distendidos num contínuo de tempo extenso.

Por exemplo, os relatos diziam que o gang raping foi levado a cabo por homens jovens e embriagados. Isto levaria a crer que foi algo como uma festinha que perdeu o controle. Da mesma forma, reportagens sobre a vida de terroristas islâmicos agindo na América e na Europa recentemente costumam se focar bastante no fato de que a maioria não tinha um passado tão religioso e era freqüentadora de espaços amorais dominados por drogas e música ocidental como o rap.

O que a inteligência técnica mais tem revelado, pelo contrário, é que são estes os espaços perfeitos para o crescimento do fanatismo religioso (o que qualquer conhecedor superficial das periferias brasileiras sabe), e que tais fatos relevam, justamente, que os atos foram premeditados.

Além, é claro, de levantar uma suspicácia: por que os chamados “refugiados” são, em sua maioria absolutíssima, homens jovens envoltos em atividades questionáveis, e não as famílias fugindo do terrorismo que são alardeadas pela imprensa?

refugees welcome kolnA chanceler alemã Angela Merkel já começou a voltar atrás em seu programa de aceitar quase indiscriminadamente refugiados (a maioria muçulmanos e sírios) após a pressão popular contra os “rapefugees”; já a cidade de Colônia, que fez a campanha pública #RefugeesWelcome, nesse fim-de-semana teve uma manifestação em sentido oposto, dizendo que os “rapefugees” não são bem-vindos – o que sempre acirra notícias e o medo de uma chamada “extrema-direita” – ainda mais na Alemanha, sempre associada imediatamente ao nazismo.

Enquanto isso, a eficientíssima polícia alemã é acusada de acobertamento, enquanto policiais dizem não poder fazer nada contra refugiados, para não serem acusada de racismo e xenofobia. Já a palavra árabe taharrush se torna conhecida do público leitor de política externa em países civilizados, mostrando que na língua árabe já há um conceito cristalizado para os atos de vários homens cercarem uma mulher para assediá-la sexualmente – o que mostra que sua cultura não possui casos de gang raping, ou melhor, de taharrush por mero acidente e desvio.

Estes movimentos contrários em pouco tempo podem servir a uma rápida reflexão sobre como encaramos a História.

Boa parte da historiografia contemporânea ainda paga préstimo ao filósofo alemão G. W. F. Hegel. São caudatários do hegelianismo tanto Karl Marx quanto o filósofo que pior escreve na língua inglesa, F. H. Bradley. Na contemporaneidade, tanto o revolucionário Slavoj Žižek quanto o ex-apóstolo do neoconservadorismo Francis Fukuyama derivam suas visões de mundo da filosofia hegeliana.

Num esquematismo bastante grosseiro, Hegel busca acompanhar o “espírito da História” aplicando a dialética ao passar contínuo do tempo. A filosofia, assim, derivaria antes da dialética (tese + antítese + síntese) do que com a lógica, a experiência ou a busca por quintessências.

Trabalhando com contradições, analisa todo o processo de descoberta da verdade, e mesmo da natureza, através de fenômenos contrários que vão se “concatenando” em sínteses de seus melhores elementos. É a base do materialismo histórico-dialético de Karl Marx, como também do “fim da história” (expressão de Hegel) de Francis Fukuyama.

koln gegen faschismus 1Para Marx, o evento definidor do materialismo histórico-dialético foi a Revolução Francesa, em que, em sua teoria, a classe trabalhadora teria se voltado contra o Ancien Régime. Como bem se notou desde aquela época, foi na verdade um esquematismo de intelectuais manipulando massas para seus novos projetos de engenharia social – exatamente como o próprio Marx o fará, sendo intelectual, sendo oriundo da burguesia, e suposto defensor único da classe que trata como inimiga da sua. Marx aplica tal dialética à própria humanidade, sustentando que “a luta de classes é o motor da história”, quando o único momento histórico em que “classes” supostamente terçaram armas em “luta” teria sido a Revolução Francesa.

Se a dialética não funciona para entendermos o todo da realidade (seu alcance é restrito, como todas as ferramentas da filosofia), muito menos com conceitos imperfeitos e manipulação ideológica como no caso marxista, tal análise é razoavelmente funcional para se perceber a média geral de reações as mais instintivas ao todo histórico.

Após o genocídio nazista, foi natural que a média de reações instintivas gerais quanto a qualquer coisa que se assemelhasse, por parecença ou aparência, por acarretamento ou analogia, ao nazismo, fosse sempre negativa. A Alemanha, mesmo dividida com o totalitarismo socialista, ainda se tornou rapidamente progressista ou, ao menos, anti-nazista em tudo o que pudesse.

Graças a isso, as reações gerais, muito mais determinadas por instinto de manada e histeria coletiva do que por uma fria análise racional, que exige distanciamento e um pensamento solitário, foram imprudentemente majoritárias a favor dos refugiados – não por um pensamento direto, por uma análise de causas e conseqüências, não por uma busca de se entender historicamente o que acontece no Oriente Médio e quem são os refugiados – mas apenas dialeticamente, pensando que se a Alemanha foi xenófoba no passado e o resultado foi ruim, não aceitar refugiados estrangeiros (xenos) poderia ser associado, por analogia, à xenofobia (e, logo, ao nazismo), então aceitar refugiados agora é bom.

koln gegen faschismusInevitavelmente, logo que as conseqüências inescapáveis de tais políticas vêm à tona, os ânimos gerais, também não analisados cuidadosamente, podem servir de convite a extremistas. É a “antítese” hegeliana. Todavia, como a associação ao nazismo é considerada forte demais, a simbólica de quem é contra os refugiados está sendo melhor cuidada (os cartazes costumam dizer que apenas os refugiados estupradores é que não são bem vindos, por exemplo).

O que não impede, claro, de a imprensa declará-los apenas “extremistas” e de “extrema-direita”, ou associá-los (o risco eterno das associações) à mera “xenofobia”, como se ver os riscos da aceitação massiva de refugiados que mal sabem viver na Europa fosse o mesmo que um preconceito estúpido contra qualquer coisa que não sejam eles próprios.

Assim, as vítimas do passado, os judeus, são agora motivo para tratar bem justamente os maiores perseguidores de judeus de todos os tempos, os muçulmanos. Como se, apenas por virem da mesma região, fossem todos iguais – e apenas o Ocidente fosse capaz de ter um preconceito contra o estrangeiro, como se nenhum imigrante possuísse preconceitos bem piores (e estes sim análogos aos dos nazistas).

Não temos mais no Ocidente um pensamento dado à fria análise, ao entendimento de fatos e fenômenos. Preferimos racionalizar, com ricos floreios acadêmicos e vernáculos intelectuais, nossas próprias reações em massa – com um medo incrível de andar na direção oposta do rebanho, para não cair no rótulo de “retrógrado”.

Justamente por acharem que são “o futuro”, nessa dialética de impressões que tentam ser cada vez mais frágeis e reativas, consideram-se “críticos”, sem perceber que o rótulo associado ao passado dado aos verdadeiramente críticos mostram que apenas são modistas que obedecem ditames e sentimentalismos sem o perceber.

É assim que se constrói um novo “senso comum”: não mais o conhecimento óbvio acessível a todos os homens, mas uma máscara de aprovação ou reprovação geral sobre nossas autômatas impressões superficiais.

O Ocidente está sofrendo hoje por tentar buscar uma “síntese” destas visões, como se as impressões divergentes fossem caso de “preconceito” de um lado e a construção de “uma nova cultura” de outro – e não que uma impressão geral foi culpada por uma outra impressão geral em sentido oposto.

Entender o que são os refugiados ou como tudo afeta o Ocidente não parece uma questão de ordem – e quem se arrisca a fazê-lo, sempre corre o risco (um fatalismo, na verdade) de ser acusado de xenofobia, racismo, “extrema-direita” e assim por diante.

Abdicamos de um pensamento baseado em saber o que as coisas são. Apena ao que elas podem ser associadas. E sempre olhando para o que é considerado horrível ou maravilhoso no passado, para servir como continuidade ou antítese – Daí o apelo de vocábulos de forte valor sentimental, como “crise humanitária”, “refugiados” ou, por outro lado, “extrema-direita” ou “xenofobia”.

Enquanto brincam de dialética, o Ocidente morre sem saber o que está acontecendo em seu coração.

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Assuntos:
Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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