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Precisamos falar sobre Renan Calheiros

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Todo mundo tem um amigo, parente, agregado, conviva ou boneco de madeira falante que foi contaminado pela síndrome do E o Cunha? no último ano, distúrbio seríssimo, bem mais grave do que dengue, H1N1 e Chikungunya somados, só comparada à peste negra e ao feminismo em sua capacidade de infeccionar um percentual tão assustadoramente alto da população em tão pouco tempo.

Algo que marca o discurso do enfermo como escaras marcam a pele: a quantidade de “E o Cunha?” proferida é inversamente proporcional ao conhecimento do cidadão sobre a política, as idéias, as práticas e os personagens em questão no momento.

É uma pandemia poderosa e irrefreável, que deixa o infectado com padrões de comportamento monomaníacos, causando em pouco tempo um reducionismo absoluto de suas funções de raciocínio – todas elas, simplesmente todas elas reduzidas à repetição ad nauseam do mote “E o Cunha?” sobre qualquer tema, sobretudo os que dizem respeito à sua própria condição.

É o que o Antigo Testamento já definia como um shibboleth, uma palavra ou expressão que não faz mais referência a algo concreto na realidade, mas que apenas marque o enfermo como pertencente ao grupo dos infectados. Algo que não significa mais nada, mas marque a pessoa como pertencente a um grupo específico.

Mas hoje, o ministro do STF Teori Zavascki deu um golpe de misericórdia na doença muito mais cirúrgico do que qualquer intervenção pública do Ministério da Saúde, afastando o deputado Eduardo Cunha e acabando com a única desculpa cabível dos enfermos da pandemia do E o Cunha? para continuarem negando a realidade. A gripe de Santo André é poderosa, mas o chá de Porchat é fatal.

Agora os enfermos com a monomania do agora ex-presidente da Câmara sofrerão um choque de realidade. É duro e difícil, mas é uma experiência pela qual eles precisam passar. São como os ritos de passagem das sociedades antigas, incluindo circuncisão e matar um búfalo: é algo duro, mas justamente sua dureza é que separa infantes daqueles preparados para a vida adulta.

fora lula dilma cunhaÉ praticamente impossível olhar o perfil no Facebook de qualquer um infectado pela pandemia que não tenha afirmado que afastar o PT não vai acabar com a corrupção (o que ninguém nunca disse), que ninguém fez passeata contra Cunha (Cunha era criticado em qualquer manifestação pelo impeachment), que o PT não inventou a corrupção (como Michael Schumacher não inventou a direção automotiva), que Cunha é igualzinho o PT (e qualquer pessoa repudia Cunha, mas comparar conta na Suíça com petrolão, pedalada, compra de poder e contas com sigilo em ditadura é para forçar demais a amizade).

Acontece que acabou, já era, vira o disco. Precisarão de outra desculpa. E mais do que uma desculpa, precisarão de uma justificativa nova para continuarem apoiando o partido com o maior escândalo de corrupção do mundo, com aliança com quase todas as ditaduras mais brutais do planeta, de Cuba ao Irã, do Zimbábue à Coréia do Norte.

https://twitter.com/LiberalismoBR/status/728257063793643520

E precisarão enfrentar os nomes que não enfrentaram até agora. Por exemplo, o que seria dos petistas se fossem confrontados com o fato de Waldir Maranhão, que assume no lugar de Cunha, ter votado contra o impeachment (sendo aliado de Cunha) e ser também investigado pela Lava Jato?

Mas confrontados mesmo, como eles martelaram, trovoaram e retrovoaram todos os dias em todo o jornalismo, na mídia, fazendo com que toda celebridade e subcelebridade e celebridade relativa (as celebridades que só são celebridades em relação a outra, como o Júnior, da Sandy) não terem dito outra coisa desde 2015 que não E o Cunha e o Cunha e o Cunha e o Cunha e o Cunha e o Cunha e o Cunha?

Que tal agora fazer uma intervenção em todos os nossos amigos petistas, das variações “Viva Marighella” até à isentosfera, passando é claro pelo “Não sou petista, mas”, e falar de alguns nomes que fazem Cunha, com todos os crimes dos quais é acusado, ir parar no Tribunal de Pequenas Causas?

https://twitter.com/MovBrasillivre/status/728331282271350784

Que tal falar do governista Renan Calheiros, tão aliado do PT que o partido e seus acólitos entrou com ação no STF para fazer com que o Senado tenha poder também de negar o pedido de impeachment, rasgando a Constituição e legislando ali mesmo, crendo que Renan Calheiros iria impedir sozinho, com seu poder de mando e de compra, o início do processo de impeachment?

Aquele Renan Calheiros, conhecido em Alagoas como um dos homens mais poderosos do continente, que transforma Alagoas quase em um feudo dividindo espaço com a família Collor, e que é desta família uma cria? Aquele Renan Calheiros com muito mais processos nas costas do que Eduardo Cunha, que manteve todos os maiores corruptos do país no poder nos últimos anos?

renan-calheiros-sustoSerá que este Renan Calheiros não está protegendo o PT por ter roubado junto com o partido, por estar sempre e inapelavelmente do lado dos maiores corruptos do país, dos mais larápios e, claro, dos que mais compram poder sobre a liberdade das pessoas, ou será que Renan Calheiros, de repente, se tornou um anjo, que agora não se deve falar dele?

Não eram os partidários da complexa e profunda filosofia E o Cunha? que afirmavam que os opositores do PT (o que é muito mais do que a nossa “oposição”) não falavam de Cunha, quando até bonecos dele faziam?

Aliás, Renan Calheiros que já foi acusado de ser dono, através de laranjas, de nada mais nada menos do que as afiliadas da Rede Globo, este Behemoth moderno, em Alagoas.

Será que não devemos intervir agora e pedir esclarecimentos aos nossos amigos fãs do povo, que não são coxinhas, são pobres, trabalhadores, contrários a toda forma de corrupção exceto a do PT, que supostamente não existe, e perguntar, assim, en passant, o que acham de Renan Calheiros?

É hora de finalmente admitir que não estão em jogo duas facções idênticas de bandidagem, como crêem os petistas. São, antes de tudo, duas formas de pensar. Duas mentalidades. Uma que não aceita bandido nenhum, uma que acredita tanto num partido que, quando descobre que seu partido rouba, parte para o negacionismo, passa pelo “todo mundo rouba”, chega na tentativa de dizer “mas o meu roubou menos”, está na fase “todo mundo rouba igual” e logo cairá na depressão. É o passo que falta para finalmente se livrarem da prisão mental.

Caros amigos petistas, e o Renan?

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Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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