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Liberté, égalité, Mbappé

A farsa do multiculturalismo francês (e ocidental)

É um vício moderno crer que "multiculturalismo" é a defesa de diversas culturas, o que seria uma obviedade. Trata-se da destruição da cultura ocidental por força ideológica.

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Revolução Francesa com bandeira no rabo

Tão logo a França ganhou seu segundo título de futebol na Copa do Mundo, as redes foram tomadas por trincheiras de uma curiosa guerra: SJW (Social Justice Warriors) estariam dizendo que a seleção francesa  é poderosa e foi imbatível por ser uma prova de que o “multiculturalismo” deu certo, já que quase a totalidade dos seus jogadores é descendente de imigrantes.

A seleção francesa é composta por jogadores cujos pais vieram das Filipinas, Mali, Mauritânia, Senegal, Argélia, Itália, Congo, Haiti, Angola, Camarões, Guiné, Marrocos, Togo e Martinica e Guadalupe (!). Não é exatamente uma seleção de francos. O mais próximo a isso fica com o goleiro Hugo Lloris, de origem catalã. Os nomes dos jogadores dificilmente são aprendidos em uma aula de francês. Não há um Pierre, um Louis, um arquetípico François.

De fato, a seleção francesa não é nem bem uma seleção lá multiétnica, a não ser que contemos unicamente as etnias africanas. Se em 1998 a França conquistou o mundial com o conceito que ficou conhecido como black-blanc-beur (“negro-branco-árabe”), o blanc de 2018 ficou basicamente restrito ao goleiro. Sintomático e simbólico da posição dos franceses dentro da própria França, hoje.

Isto para não falar do encrenqueiro atacante Karim Benzema, do Real Madrid, que não foi à Copa de 2018 alegando pressão da “direita racista” francesa (sic). Benzema entrou em polêmica em sua terra natal por não cantar La Marseillaise, o hino francês – e não satisfeito, dar uma cusparada ao fim de sua execução, o que fez com que a ex-ministra francesa Nadine Morano pedisse sua expulsão da seleção.

O caso lembra uma história curiosa contada sobre as Guerras Napoleônicas, quando uma frota naval francesa se preparava para invadir o Haiti. Tão logo chegou perto da terra firme, percebeu algo estranho: quem cantava La Marseillaise eram os haitianos. Um resumo curioso da nação regicida fundada pela guilhotina e por revolucionários degolados, crendo sempre estarem falando em nome de um “povo” abstrato ou, folie suprême, de todos os povos, sobretudo aqueles que acabam precisando serem massacrados no processo.

É o retrato neo-iluminista do que chamam de “multiculturalismo”, como jornalistas e palpiteiros pelas redes adoram repetir. É fácil defender a existência de mais de uma cultura no mundo, o que basicamente só é negado pelo Estado Islâmico pela Westboro Baptist Church. Todavia, haver mais de uma cultura no planeta absolutamente nada tem a ver com “multiculturalismo”, este termo tão sedutor – da mesma forma que uma “contribuição” estatal é imposta sob risco de cadeia, ou que matrimônio não é o feminino de patrimônio.

A ideologia (e é preciso frisar que é uma ideologia) do multiculturalismo é, pelo contrário, a defesa de que a sociedade ocidental deve abrigar pessoas que não respeitem a sociedade ocidental para não ser acusada de racista. Não se trata de uma política de acolhimento de refugiados de guerra (que sempre existiu, desde pelo menos a chegada de Enéias ao Lácio para fundar Roma, escapando do massacre de Tróia), e sim de uma substituição.

Currículos multiculturalistas na Academia anseiam por trocar estudos das artes liberais e do cânone ocidental, de Homero a Thomas Pynchon, por estudos “étnicos”, em que vale mais pertencer a uma etnia não-caucasiana do que produzir o Direito Romano ou Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister.

Uma política econômica multiculturalista tem como pedra fundante a idéia de que todo o dinheiro do pagador de imposto local deve ser transferido para um sistema de “seguridade social” para pagar pela vida neo-européia dos recém-chegados (décadas de uma crença histórica chamada “colonialismo” repetida como se fosse verdade factual, e não uma visão parcial).

A ideologia multicultural, por fim, trata como racismo ver países fundados por grupos étnicos claros (sejam francos ou anglo-saxões, que já são duas etnias, sejam celtas ou nórdicos, sejam góticos ou lombardos), preferindo uma substituição da população local, descendente dos fundadores da nação e que comunga com o passado de uma mesma visão aproximada de mundo, por outros grupos étnicos, com outros costumes, outra religião (ou seja, sempre o islamismo) em nome da “diversidade”.

Qualquer oposição é automaticamente considerada racismo, mesmo que se trata de uma mera discussão de idéias (o termo “obscurantista” também pode aparecer se o multiculturalista estiver de bom humor) ou intolerância, preconceito e seus derivados. Já notou como toda a política mundial, ao invés de lidar com crimes, orçamento ou moral pública, basicamente se resumiu a uma caça aos “preconceituosos” do dia? Como todo cristão é um fundamentalista racista, mas um jihadista degolando crianças é sempre um pobre coitado que degola por falta de oportunidades, que certamente se corrigirão com mais impostos e um discurso mais cidadão. Quem sabe até com as mulheres usando hijab de brincadeirinha.

A questão primordial sobre o multiculturalismo permanece a mesma: por que apenas a sociedade ocidental, que legou ao mundo o sistema filosófico mais rígido do mundo, o Direito considerado mais avançado (algum multiculturalista o trocaria pela shari’ah, pelo sistema de castas ou pelo sistema de aversão a descendentes fujões dos japoneses?), a tecnologia mais sofisticada e, claro, os países mais desejáveis para se morar precisa ser “multicultural”?

Ou, como resumiu com elegância Thomas Sowell, toda a visão multiculturalista pode ser resumida como a defesa apaixonada de todas as culturas, exceto a ocidental. Exatamente a única cultura que permite o tal multiculturalismo.

Chega a soar como piada alguém pregando multiculturalismo para o Irã, a Coréia do Norte, Cuba, Venezuela ou, claro, para países islâmicos, tão defendidos pela esquerda e pelos multiculturalistas como “vítimas” daquele pedacinho de terra israelense. Entretanto, basta-se pensar em políticos como Barack Obama, Emmanuel Macron e Justin Trudeau para ver como são considerados semi-deuses, fofos e benéficos ao mundo sem um único mérito em suas carreiras simplesmente por consubstanciarem o multiculturalismo e avançarem, com um sorriso agradável para jornalistas, o processo de destruição de seus países e substituição por um multiculturalismo que significa sempre uma cultura única: a islâmica.

Mesmo o crítico literário marxista Terry Eagleton ri dos faniquitos multiculturais dos modistas ocidentais: multiculturalismo “é imaginar que existe algo inerentemente positivo em ter um leque de diferentes visões quanto ao mesmo assunto. Seria interessante saber se esse é o caso quando se trata de indagar se o Holocausto algum dia ocorreu.” É bastante curioso imaginar fazer de fato essa pergunta aos islâmicos importados pela França e pela Alemanha, que costumam ter mesmo uma visão, digamos, “multicultural” sobre o que ocorreu com judeus no Terceiro Reich.

Multiculturalismo, afinal, é algo fácil de ser aplicado à Islândia, à comunidade marítima, a uma festa de danças exóticas. Algo mais complicado quando se trata de analisar os neonazistas, o Hell’s Angels, a KKK.

Resta a mesma contradição das cotas nas universidades: querer que aqueles malfadados pelo Destino a viver em uma cultura inferior possam ser acolhidos (com toda a facilidade que os pais dos nativos não tiveram) em uma economia próspera e em uma cultura poderosa. Porém, mantendo todos os traços de sua antiga cultura, da qual acabou de “fugir”.

Há mesmo uma substituição do Ocidente e sua religião ecumênica e não étnica, seu Direito colour-blind, sua economia capitalista tão criticada e tão desejada, sua civilização próspera e “culpada” de tudo, por qualquer outra “cultura” que nunca conseguiu produzir nada disso em nome da “tolerância”. Todo multiculturalista crê em todos os povos unidos e abraçando árvores (como os revolucionários franceses da Marseillaise), mas acaba por sucumbir a uma cultura mais forte do que seu discurso pacifista. É costumeiro que só percebam tardiamente que nem todas as culturas querem a paz, e que uma cultura com uma espada irá se impor sobre uma cultura com discursinhos floreados. Exatamente como aqueles tais “ultra-nacionalistas”, que só queriam que seu país continuasse igual, tanto alertaram.

Os acólitos do multiculturalismo adoram tais pechas negativas para aqueles que observam a substituição da cultura, inclusive da população local (o que muçulmanos chamam de hégira). Entretanto, não querem que os não-ocidentais cheguem a um país que não tenha o garbo e a elegância de nomes como França, Alemanha, Inglaterra… ou Europa. Ou América. Ou Ocidente.

Nenhum retrato pode ser mais claro dessa contradição do que a “comemoração” dos, digamos, franceses por sua seleção sagrar-se bicampeã do mundo: motins, 2 mortos e mais de 300 feridos nos “festejos”. Dezenas de carros incendiados em “acidentes”, como reportados pelo Estadão (como se carros pegassem fogo sozinhos).

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É o retrato perfeito do que Ortega y Gasset definiu sobre os homens-massa, homens que apenas seguem o fluxo da manada, sem interioridade, sem moral, sem algo de próprio a defender além da pilhagem: são pessoas que querem pães, e o meio que logram para tal é queimar as padarias.

Todos querem ser ocidentais. Até mesmo para jogar por seus times. Até mesmo para cuspir em um hino como La Marseillaise, que prega justamente um ecumenismo forçado entre todos os povos. O multiculturalismo é a substituição do Ocidente por qualquer coisa, mas não sem antes tomar para si os brios, glórias e benesses que apenas o Ocidente legou ao mundo. Esses malditos imperialistas racistas colonialistas obscurantistas ultra-nacionalistas que todos querem tanto como vizinhos…

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Assuntos:
Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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