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Política das hashtags – A ilusão do poder popular sem organização

O sintoma da desorganização da direita é claro: deputados se comportam como influenciadores digitais e estes se comportam como políticos. Resta resolver a causa do problema

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Depois de décadas sem uma verdadeira representação conservadora na política, eleger Bolsonaro contra a força do establishment político e da imprensa gerou uma das maiores ilusões dos últimos tempos: a crença de que o apoio popular ao presidente seria suficiente para que o governo tivesse sucesso. Essa ilusão foi ampliada pela forma como a campanha foi feita: sem dinheiro, sem tempo de TV, apoiando-se em redes socais. Agora, a realidade manda a fatura.

Os últimos meses foram marcados por uma série de frustrações para eleitores de Jair. A cada boa expectativa criada por uma fala do Presidente, tuítes de influenciadores ou manifestação de apoio nas ruas, uma reação quase imediata da oposição jogou água no chopp do público, fazendo muita gente se sentir perdida e até sem esperança. Afinal, como um presidente democraticamente eleito, com apoio popular, não consegue governar e nem mesmo proteger ativistas perseguidos em seu nome?

É natural que muita gente procure as respostas no próprio Jair Bolsonaro. Uns dizem que o problema é a falta de uma assessoria melhor. Outros, que é falta de coragem ou que ele estaria de mãos atadas por forças obscuras de tons verde oliva. Claro, quem procuraria as respostas no espelho?

Vejo em Jair Bolsonaro uma enorme vocação para liderança. Tão grande que rompe a rígida hierarquia militar e o leva para a política, onde sobrevive há mais de 30 anos, vence 9 eleições e se torna presidente da República após uma carreira que andou pari passu com suas bases eleitorais. Um perfil tarimbado e confiável. Sinto vergonha alheia quando vejo gente que nunca foi nem síndica de prédio, que nunca encarou uma assembléia de condomínio, indo às redes sociais dar bronca no presidente, mas reconheço a legitimidade desse tipo de manifestação: são tão legítimas  e úteis – quanto dicas de coaching quântico a um engenheiro nuclear. Sei que poderia ser melhor o que está em volta do presidente, mas ele é grandinho. Mais vale nos preocuparmos com o que outros atores desse cenário podem fazer além de subir hashtags, alarmar o público e reforçar ilusões.

A primeira coisa é entender que as necessidades de uma campanha eleitoral são muito diferentes das necessidades de um governo. É relativamente fácil motivar pessoas a saírem de casa para apertar um botão na urna. Basta explorar as indignações e “jogar pedras” nos adversários. Difícil é motivar pessoas a suportar a forte e diária pressão de oposição, que é especialista nisso e não tem escrúpulos. A ‘nova direita’ brasileira está no papel de vidraça. Não há como criar o ambiente psicológico adequado a isso sem uma comunicação muito bem feita.

A segunda é entender que o que falta para essa comunicação não tem muito a ver com o presidente, nem com alguma secretaria específica. O que falta é a estrutura através da qual essa comunicação ocorre até chegar nas bases. Essa estrutura é o que dá coesão entre o presidente e o povo. Ela já existe, mas foi sumariamente ignorada pela leva de novatos que ascendeu ao poder junto com Jair, iludidos por uma idéia de “nova política”, como se fosse possível mudar o sistema antes de ter poder real sobre ele: é o sistema político partidário (assessores, escritórios políticos, diretórios partidários e recursos que alimentam tudo isso). É nele que se acomoda a militância profissional que dá capilaridade e organiza as bases.

A terceira é que não existe poder popular útil sem ordem, a não ser para quem lucra com a desordem: movimentos revolucionários. Conservadores tiram proveito de ordem. Só que não existe ordem sem hierarquia, nem hierarquia sem disciplina, nem disciplina sem treino, nem treino sem plano, nem plano sem líder para apontar a direção. Eis o problema: desenvolver as lideranças nacionais e estaduais e fomentar as lideranças municipais e locais, criando as condições para organizar minimamente o poder popular.

A quarta é que não existe vácuo de poder. Então, na medida em que não houve o desenvolvimento de uma estrutura hierárquica de lideranças, efeitos ruins foram gerados. Um deles é uma crise de papéis: deputados se comportam como influenciadores digitais e estes se comportam como políticos. Outro é que as manifestações ganham sempre um caráter de “espontâneas” e isso faz delas terreno fértil para oportunistas de todos os tipos, incluindo intervencionistas que ajudam o establishment a classificar como antidemocráticos quaisquer atos de apoio a Bolsonaro.

Sem entender essas coisas, fiando-se apenas na idéia de que um poder popular acionado por redes sociais resolveria tudo, políticos e formadores de opinião levaram o povo às ruas de forma desordenada e o resultado foi que o “bolsonarismo” se tornou previsível. A última manifestação útil foi em maio de 2019. Em junho, quando ocorreu mais uma, já havia elementos que demonstravam que o establishment havia entendido como tirar proveito da reatividade dos apoiadores de Bolsonaro, da inexperiência e do ego dos convocadores.

Seria bom se os deputados, enquanto ainda possuem algum controle sobre recursos, dessem mais atenção à organização das bases. Já imaginou quantas lideranças conservadores poderiam ser eleitas neste ano se essa lição de casa tivesse sido feita no começo de 2019?

Infelizmente, agora é tarde, mas antes tarde do que nunca. Isso é bem pouco perto do que um movimento precisa para se estabelecer na política, mas é melhor do que nada. Base organizada é poder real. Quem tem base organizada para disputar espaço nos municípios, consegue influenciar a dinâmica das negociações nos parlamentos. Isso exige adaptações nos gabinetes e nas agendas dos deputadas, pois a presença física é necessária, mas isso é tema para outro texto.


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Herbert Passos Neto

Jornalista, especialista em comportamento.

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