Digite para buscar

Viva o padrão ocidental de beleza!

Compartilhar

pessoas-academia

João é administrador de empresas. Trabalha numa companhia na Avenida Paulista de 5 a 6 vezes por semana, vai à praia no Ano Novo com o seu look branco-escritório, possui sobrenome polonês, nunca fez um gol nas aulas de educação física e ganha mais de R$ 18 mil por mês.

Pedro é auxiliar administrativo (o novo nome para office-boy) que por ventura faz despachos na empresa de João. Começou como motoboy, é negro, não fez faculdade, seu hobby é praticar muay thai e jiu-jitsu e assistir UFC, pega ondas no litoral sul nos feriados e ganha menos de R$ 2 mil por mês.

Apenas com estes dados, qual o mais provável de fazer sucesso na balada: João ou Pedro?

Já era antes, mas em tempos de considerar a futura primeira-dama “bela, recatada e do lar”, exponencializou-se uma modinha pós-adolescente de criticar o chamado “padrão ocidental de beleza”.

pessoas bonitas malhandoNada pode ser mais contraproducente: o padrão ocidental de beleza é o mais democrático que existe. No padrão ocidental de beleza, qualquer um que deseje pode vir a ser considerado bonito. Pode ser branco, negro, ter cabelo liso, pixaim, ser pobre, rico, gostar de pagode ou rock progressivo, ser inteligente ou corintiano. Pode tudo.

Porque o atual padrão é o primeiro na história mundial a se basear não mais numa etnia, num padrão genético, numa dádiva da natureza, numa classe social e suas práticas, mas no esforço. Quem quiser se esforçar para ser bonito, será. Nada mais capitalista e meritocrático – portanto, nada mais universalmente acessível.

É por isto que hoje as pessoas torram suas fortunas e seu bem mais precioso, o tempo, em academias de ginástica.

mari gonzalez academiaAté pessoas ricaças, que estudaram e se empenharam em um trabalho em que usam o intelecto para não torrar em tarefas maçantes e repetitivas, estafantes de sol a sol, pagam para passarem vergonha em público fazendo poses ridículas e movimentos amacadados, justamente porque não querem depender apenas de sua etnia, de seus genes, de sua posição social ou de seus gostos e inteligência para serem atraentes. São os Joões supracitados se esforçando para serem um pouco como Pedros.

Com nenhum outro padrão de beleza isto ocorreu.

É comum o discurso abestalhado, repetido como 5 sessões de 15 ou até a falha do músculo na remada cavalinho, sobretudo por pessoas contaminadas pelo vírus do “feminismo”, de que o padrão ocidental de beleza é excludente. Ora, qualquer padrão é excludente. O contrário é viver sem padrões, o que nem a mais revolucionária feminista consegue, não importa o quanto diga (preferir a convivência de outras feministas, por exemplo, é já um padrão). O louvável é que o padrão ocidental é universalmente alcançável. Ou ao menos o que mais se aproximou disso.

lenny kravitz waterO que está por trás do atual padrão (ainda que “atual”, na moda ocidental, raramente passe de uma década) é justamente a idéia de um esforço centrado para o objetivo de cuidar do corpo. E o padrão do corpo é baseado, ora essa, em saúde e potencialidade máxima. Trabalhá-lo para que ele seja forte, capaz de realizar mais. Um corpo saudável é reconhecido instintivamente, e não apenas pelo sexo oposto.

Entender os motivos disso é que faria algum começo de sentido no debate. Ao contrário, lemos defesas apaixonadas de feministas e esquerdistas em geral defendendo coisas como o padrão de beleza renascentista, em que as mulheres consideradas belas eram bem rechonchudas. Como se de repente, por mágica (Foucault chamaria de episteme), as pessoas trocassem seu gosto, completamente sem razão.

Ora, se estas feministas soubessem as causas para tal mudança de padrão, iriam exigir a superioridade do padrão contemporâneo e sair pichando obras em museus (aliás, melhor não dar idéia…). Há finalidades nestes padrões.

Venus of Urbino. Image licenced to Stephen Forsling FORSLING, STEPHEN by Stephen Forsling Usage : - 3000 X 3000 pixels (Letter Size, A4) © Scala / Art Resource

No Renascimento, uma mulher bonita era da aristocracia, não da plebe. Uma mulher aristocrata não trabalhava e não se exibia (trocando-se o convento pela sua alcova, havia pouca diferença entre a vida de uma freira e de uma donzela). Não tomava sol nem a pauladas. Comia gostosamente, ao contrário das servas, que trabalhavam no sol e tinham uma alimentação mais espartana. Qualquer traço corporal que fizesse referência à atividade física era considerado sinal de pobreza. A pele clara tampouco significava racismo, e sim a vida longe da natureza, protegida por muros.

Já em meados do romantismo o padrão muda, também por finalidades diversas, e não mera arbitrariedade geral (para quem consegue acreditar em algo do tipo). O padrão vitoriano, por exemplo, exige uma vestimenta mais ortodoxa do que alguns países islâmicos. O espartilho contraria a natureza, forçando uma cintura fina que forçasse uma idéia de juventude – hoje trocada pelos seios e bunda firmes. As longas saias indicam tanto a posição social quanto o idealismo da intocabilidade – uma imposição que também protegia as mulheres, cada vez mais urbanas, em cidades cada vez mais violentas (aquela proteção dos castelos ao menos servia para alguma coisa).

Buscar motivos afasta qualquer um do esquerdismo típico da puberdade.

padrões ocidentais de belezaEm resumo, há causas, motivos, razões e circunstâncias para os padrões. Não é algo aleatório, eventual, acidental, impensado, adventício e randômico como quer crer quem não pára para pensar ou quem lê Michel Foucault. Se as gordinhas socialistas de hoje estão usando o Renascimento como “prova” de que ser gorda pode ser considerado belo, mal sabem elas do porquê disso.

Foi a ascensão do capitalismo e seu desenvolvimento mais avançado hoje que permitiu um padrão como o atual, em que ricos pagam para agir como pedreiros, em que a saúde, e não decoro e padrões de comportamento de classe, é que são determinantes.

gorda tatuada banheiraE isso é o mais natural possível. Seios fartos e bunda larga indicam uma boa capacidade de manter uma gravidez. Coxas grossas indicam força e boa capacidade de locomoção (incluindo fugas, de ataques de javalis ou assaltantes protegidos pela Maria do Rosário). A pele mais clara (e, tadaaaaaa, isso vale também para as negras!) indica juventude (sim, as negras são mais claras quando mais jovens).

Algo curioso, já que as feministas não criticam o padrão de beleza que pede por poucas rugas, já que dificilmente feministas passam dos 30 anos de idade sem arrumar um emprego ou parecerem velhas loucas dos gatos.

gordo academiaPara os homens… ora, o padrão de beleza masculino atual é tão óbvio que é ultrajante ter de explicá-lo. Força, muita força, mas sem parecer que vive apenas para a força. Curiosamente, critica-se tanto o padrão feminino, mas quantas vezes se viu uma crítica ao padrão masculino? Como se ganhar ou transformar banha em músculos fosse muito mais fácil do que malhar, destacar os olhos com lápis ou, em casos extremos, fazer uma lipo (não, não existe “lipo” para os braços nem para a barriga tanquinho, meninas).

E o “recatada e do lar”, qual o problema? Isto tampouco é uma imposição (muita gente não quer um parceiro ou parceira recatada, e gente “da balada” costuma preferir outras pessoas “da balada”, do contrário não estaria na balada procurando parceiros). Destaca apenas uma certa vantagem. Depois da fase de adolescência tardia (cada vez mais tardia), tende-se a preferir (repetindo: preferir) uma pessoa que saiba cozinhar e regar as plantas do que uma pessoa que ouça techno, freqüente raves e conheça cada inferninho do baixo Augusta, da Lapa ou quejandos.

marcelatemer_belarecatadadolar

Ambas as coisas exigem um certo esforço, um comprometimento, um empenho custoso para se chegar a tal patamar.

vera fischer velhaO que os “críticos do padrão ocidental” querem não é dizer que dá para viver (sem trocadilho, ou com, whatever) sem estar no padrão. Afinal, quase a humanidade inteira está fora do padrão, incluindo pessoas que já foram belíssimas (Vera Fischer nos exime de outro exemplo) ou que sempre foram lindas quebrando todas as regras (Madonna, Kurt Cobain, Amy Winehouse ou P. J. Harvey não seguem regras: ditam). Elas querem é serem consideradas bonitas por quem não as considera. Uma imposição de gosto. Algo quase inédito na humanidade. Como se não tivéssemos direito mais nem ao nosso instinto, em prol da tal igualdade.

O padrão é inclusive acessível às camadas mais baixas da população: até Carla Perez e a ex-sem-terra Débora Rodrigues já foram capas da Playboy, e basta pensar no padrão das axézeiras e funkeiras Brasil afora (nem sempre fácil de ser atingido).

mulher girafaNão satisfeito com isto, ainda é apenas um padrão, ou seja, um modelo a ser seguido, uma aspiração, uma idealização – não uma imposição, uma obrigação, um leito de Procrustes, uma prisão impossível de se fugir desde o berço. Pense-se nas mulheres Padaung, da tribo indígena Kayan, na Tailândia, que usam anéis de bronze no pescoço, forçando-o para o alto e enfraquecendo a musculatura. O pescoço chega a atingir até 30 cm na fase adulta, quando mais argolas são colocadas. Perto delas, as chinesas, que forçam os pés em barras para se tornarem pequenos, são até um modelo light.

Nas tribos africanas, de mutilações genitais a inserção de objetos gigantescos no corpo, como discos ou pesos deformadores, são uma tradição milenar. Tribos como mursi e surma, da Etiópia, colocam de discos a pedaços de animais mortos no corpo como sinal de força e beleza (parece um pouco pior do que puxar ferro na academia). O lábio inferior e o lóbulo da orelha são cortados para a introdução de um prato, até atingir a extensão máxima possível.

Na Nigéria, um hábito muito comum é a escarificação. Como as mulheres não usam roupas, cortes são feitos em sua pele marcando importantes eventos da vida. As cicatrizes vão formando uma espécie de renda, e são desejadas pelas meninas. Os cortes começam aos 5 anos, e obedecem uma seqüência até chegar à fase adulta e elas estarem aptas a casar.

Já a tribo Ndebele em Lesedi introduz pesadas argolas de metal no pescoço, braças e pernas depois que casam, para não fugir dos maridos. Para depois lermos feministas chamando o capitalismo judaico-cristão de “patriarcal” e “machista”…

musi-woman

mulher mursi disco

Isto não é o que chamamos de “padrão” (e só o nosso é, de fato, um padrão de beleza), mas um molde forçado a ser obedecido. Já nós temos a liberdade de achar algo belo ou feio. E quase tudo em nosso padrão é apenas uma aspiração, podendo ter muitos galhos na árvore. Na verdade, não temos um padrão ocidental, e sim vários: tem gosto pra tudo, de bela e recatada do lar até a punk de moicano roxo e piercing na gengiva. Fora dele, existe um só, e imposto.

Estes padrões indicam também escolhas. Um simples braço tatuado te faz ser adorado(a) (somos reacionários que não se adaptam a @ ou x) por muitos, enquanto passa a ser considerado horrível por muitos. C’est la vie.

tattooed girl

Quando vir alguém reclamando do padrão ocidental de beleza, pergunte qual o padrão dela. Pelo que ela quer substituir o tal padrão. Como seria viver sem padrões. Por que ela acredita que há alguma vantagem nisso, ou desvantagem na atualidade. Porque nunca tivemos um padrão tão natural, tão universal, tão povão, tão qualquer coisa está valendo.

Certamente quem o critica nunca parou para pensar nele. Infelizmente, o padrão ocidental médio de inteligência e pensamento pronto é que não tem nada de defensável.

Contribua para manter o Senso Incomum no ar se tornando nosso patrão através de nosso Patreon – precisamos de você!

Não perca nossas análises culturais e políticas curtindo nossa página no Facebook 

E espalhe novos pensamentos seguindo nosso perfil no Twitter: @sensoinc

Saiba mais:











Assuntos:
Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

  • 1
plugins premium WordPress