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Witzel quer processar o Paraguai… O governador deveria é pedir desculpas!

Ao reduzir drasticamente sua taxa de homicídios, o Paraguai deveria ser visto como um caso a ser estudado e, quiçá, seguido

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violência, desarmamento, Paraguai, Witzel, Bene Barbosa

Desde os anos de 1990, o Brasil se colocou a culpar os países vizinhos, incluindo o Paraguai, pelas suas mazelas no que diz respeito à segurança pública, em especial o abastecimento do mercado criminal de armas e munições. A pressão foi tão forte que a indústria nacional de armas e munições deixou de vender suas armas para países limítrofes. Regra de mercado, outros fabricantes supriram a demanda e, na prática, nada mudou para o Brasil, que continuou recebendo ilegalmente armas e munições pela nossa frágil e gigantesca fronteira terrestre.

 

De forma generalizada, o Paraguai ainda é visto no Brasil como um país lar de falsificações e contrabando, onde impera a criminalidade, o caos e o descontrole. É considerado aquele amigo que leva o seu filho para o mal caminho, que oferece maconha na porta da escola, afinal, ninguém gosta de imaginar que o filho é o único e verdadeiro problema. Essa visão distorcida do Paraguai no imaginário coletivo é tão forte que na semana passada, de acordo com a Agência EBC, o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, manifestou, na ONU, querer processar o Paraguai por tráfico de armas.

 

“Vamos fechar a fronteira com o Paraguai. Não comercialmente, mas policialmente. Eu colaboro, mando policiais para a fronteira. E vou pedir a outros estados que mandem policiais para lá. Não é possível que o Brasil continue sangrando com essas armas e ninguém faça nada. Determinei à Procuradoria-Geral do Estado que iniciasse estudos para nós representarmos o Paraguai perante a ONU e a Corte Interamericana dos Direitos Humanos. O Paraguai é um grande comerciante de armas e não tem controle para quem as vende. As armas do Paraguai, dados da Polícia Rodoviária Federal, indicam que vêm pela fronteira à vontade.”

 

Não bastasse isso, o governador pretende processar empresas que fabricam e vendem esses armamentos. Ai, ai… Que preguiça! Lembrei imediatamente de uma frase do personagem Homer Simpson: “A culpa é minha e eu boto em quem eu quiser”.

 

Mesmo fazendo fronteira com o Brasil que exporta sua criminalidade organizada para lá, ao reduzir drasticamente sua taxa de homicídios, o Paraguai deveria ser visto como um caso a ser estudado e, quiçá, seguido.

 

Em setembro de 2017 fui convidado para expor na XXX reunião do Grupo de trabalho sobre armas de fogo e munições do MERCOSUL, que ocorreu no Palácio do Itamaraty, em Brasília. Pela primeira vez na história do grupo – vejam que foi a trigésima reunião! – alguém não alinhado com a fracassada política desarmamentista estava presente para contrapor os argumentos de sempre, entre eles o de que um dos problemas do Brasil é o comércio legal de armas nos países vizinhos, que acaba por abastecer, via contrabando, o comércio ilegal no Brasil. Deixei algumas indagações para o grupo: “Afinal, por que as armas são contrabandeadas para o Brasil? E, principalmente, por que essas mesmas armas não são um problema nesses países e o são no Brasil?”. As respostas são de uma simplicidade vergonhosa! A culpa é única e exclusivamente dos nossos gestores de segurança pública que, por décadas, apoiaram e incentivaram, direta ou indiretamente, a impunidade.

 

Em 2002 o Paraguai tinha uma taxa de homicídios de 24,91(1), uma das mais altas do continente. O Brasil no mesmo ano teve a taxa de 28,46(2), portanto bastante semelhantes. Dezesseis anos depois, em 2018, o Brasil apresentou a taxa de 24,7, ou seja, a mesma do nosso “vizinho-problema” em 2002, enquanto o Paraguai reduziu sua taxa de homicídios para 5,1 por 100 mil habitantes(3),tornando-se o segundo país com a menor taxa da América Latina, perdendo apenas para Chile! Tenham isso em mente sempre: o Paraguai tem hoje uma taxa de homicídios menor que a dos Estados Unidos! 

 

Se armas trazidas ilegalmente para o Brasil vão parar nas mãos dos criminosos que continuam cometendo suas barbáries com elas – e isso não ocorre nos países de origem – esse fato demostra que o problema não está lá, mas, sim, aqui! O problema – óbvio do óbvio – não são as armas, mas sua utilização criminal. Ao culpar as armas, Witzel acaba por repetir a mesma ladainha desarmamentista que nos trouxe até aqui, culpando a existência e o comércio de objetos inanimados, sem vontade própria, como se estes fossem os causadores dos crimes.

 

O martelo de Thor tem a personalidade de Thor, ou seja, o que dá a legalidade ou não a uma arma é a sua utilização, pouco importando como foi comercializada. Imaginar que seremos capazes de fechar 15 mil quilômetros de fronteira terrestre e mais de 7 mil quilômetros de fronteira marítima e impedir que criminosos continuem se armando é utopia eleitoral.

 

Se alguém merece reclamar não é o Brasil. Armas paraguaias são atravessadas pelas nossas fronteiras e, em contrapartida, do Brasil partem criminosos da maior e mais poderosa organização criminosa que colocam em risco a segurança nacional daquele país. Basta verificar que, não sem motivo, o único lugar no país vizinho com altas taxas de criminalidade e violência é exatamente a fronteira com o Brasil.  Em resumo: o Brasil consegue estragar até a política de segurança do Paraguai, e não o contrário.

 

  1. https://datosmacro.expansion.com/demografia/homicidios/paraguay
  2. https://www.unodc.org/documents/lpo-brazil/Topics_crime/Dados/Numero_e_taxa_de_homicidios_no_Brasil_PT.pdf
  3. https://es.insightcrime.org/noticias/analisis/detenciones-policias-corruptos-expansion-pcc-paraguay/

 

Assuntos:
Bene Barbosa

Bene Barbosa é analista de segurança, escritor, presidente do Movimento Viva Brasil, palestrante, autor do best-seller Mentiram Para Mim Sobre o Desarmamento e Instrutor de Armamento e Tiro.

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