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Política

Após a carta de Palocci, o que sobrou da narrativa de sobrevivência petista?

A narrativa petista passou de "partido da ética" para "eu não sabia de nada" para "salve-se quem puder". Morreu de vez com a carta de Palocci.

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Não é de hoje que o PT vive em clima de, literalmente, “salve-se quem puder”. A narrativa petista, de “partido da ética” nos anos 90 para “esperança” e, logo mais, uma série de desculpas com números artificialmente alavancados deu lugar, já na reeleição de Dilma, a um Deus-nos-acuda de disfarces, tergiversões, silêncios estratégicos e mudanças de assunto e foco do noticiário. Se no segundo mandato de Dilma o clima do partido já pegava fogo e no pós-Dilma os petistas graúdos são puro caso de polícia, o ex-ministro Antônio Palocci resolveu jogar a última pá de cal no PT.

A narrativa petista foi da acusação e da auto-congratulação (até hoje sem saber que seus “bons” números artificiais são a própria gênese de sua bancarrota) até as desculpas e o desespero.

O PT, engessado em seu umbigocentrismo, auto-diagnostica a crise afirmando que precisa “voltar às bases” – ou seja, ao PT anos 80, das cabritas, do piquete, do socialismo, dos perdigotos.

O único programa de Lula, o eterno candidato do Brasil, é “regular a imprensa”, uma proposta ditatorial apenas para censurar o que dele alguma pessoa ousar falar. A imprensa, ideológica até a medula, mal noticia o fato, e até gosta da perspectiva de se livrar da ínfima concorrência.

A estratégia é incensar petistas soltos (é assim que se deve se referir aos petistas na ativa: os petistas soltos), tentar comprar o silêncio de petistas recém-presos (o silêncio de Cerveró que Delcídio comprou, depois o silêncio de Delcídio que Mercadante tentou comprar, mas Mercadante conseguiu permanecer petista solto e…) e, por fim, negar qualquer amizade ou capacidade de falar a verdade de petistas presos que delatam malfeitos que respingam em petistas soltos. Quem é este tal de Palocci, afinal?

Entrevista de Lula à Veja: "Quem apostar contra o Palocci vai perder"

É claro que, para a militância, qualquer coisa dita por petistas, sobretudo por Lula e Dilma (como alguém conseguiu levar Dilma a sério, sendo uma pessoa de inteligência que faz Lula parecer Albert Einstein?) é tratada como verdade. E valia inclusive para Palocci, enquanto era um petista solto.

Mas como fica para o povo? A narrativa do “Eu não sabia de nada” se sustenta por quanto tempo? Quantos crentes restantes o PT perde a cada nova desculpa?

Para pessoas que lidam com crime, ou melhor, para qualquer um que lide com lógica, é fácil perceber que é impossível que cada delator delate a mesma história, encaixando peças em um quebra-cabeças complexo, apresentando documentos que comprovem o que dizem, e na verdade tudo seja uma armação.

Ou seja: vários delatores, de Youssef a Palocci, pegos com a boca na botija, cada qual em uma área (de doleiros a políticos, de empreiteiros a tesoureiros), narram trechos da mesma narrativa, unindo peças do mesmo quebra-cabeça.

É um quebra-cabeça que mostra que o PT sorteando contratos de licitação entre as poucas empreiteiras do país, agindo em cartel. Com as propinas, pagavam campanhas publicitárias. Os contratos eram para obras faraônicas, incluindo em ditaduras amigas como Angola, Venezuela e Cuba, que geravam os números de “pleno emprego”, economia crescente aumento da renda etc do PT. Basta ver como foi o discurso hegemônico do PT para suas 4 eleições.

Uma peça fora do quebra-cabeça e a Lava Jato não existiria. Uma pessoa que mentisse para se salvar enquanto delata (e delações exigem provas, ou são anuladas) destruiria todo o castelo de cartas sendo montado. Só é possível ter uma nova prisão na Lava Jato graças à prisão anterior.

Isto é lógica. Não é algo que afete petistas, naturalmente. Para eles, quem ainda está em estágio de petista solto é santo, quem vira petista preso é santo enquanto está calado, e quem vira petista preso delatando é mentiroso, nunca foi petista, é “o mais tucano dos petistas”, é traidor etc.

Tabela: Petistas presos e mentirosos x Lula honesto

Como ficará a desculpa agora que Antônio Palocci não apenas delata, mas ainda põe o dedo na ferida, ainda acreditando no modelo intervencionista social-democrata do PT, dizendo que o PT deve assumir seus erros? Que Lula foi dominado pelo poder e pelo “tudo pode”? Que a luta pelo poder se sobrepôs à luta pelas idéias, e que a corrupção trinfou? E que ele próprio foi corrupto?

O PT pode ter um discurso para sua militância. Mas quem ainda acredita que, na verdade, todos os delatores, entre petistas, melhores amigos de petistas, financiadores de petistas e homens que tocavam o projeto do petismo no Brasil e no mundo estão mentindo, e apenas Lula, o mais honesto do Cosmo, está certo.

Quanto tempo os petistas conseguem viver nessa mentira?

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Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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