Digite para buscar

Violência

Black blocs e Freixo: perguntas em aberto

Os black blocs que mataram Santiago Andrade irão a júri popular - mas o júri não responderá o que precisa ser entendido pela população.

Compartilhar
Cinegrafia Santiago Andrade, morto por artefato disparado por black blocs na Central do Brasil, Rio de Janeiro

Para um país sem ciência política, e insistindo em ensinar ideologia nas escolas com seus típicos reducionismos, analisar um fenômeno como os black blocs gera análises que soam como blasfêmias.

Para a ideologia, não há uma descrição objetiva da realidade, mas apenas a criação de palavras que provoquem reações determinadas nas pessoas. Foi assim que Alex Solnik, de esquerda, afirmou que “black blocs são de direita” sob o argumento de que “usam máscaras”, quando se associar aos anarquistas pegará mal com o público, a um só tempo em que o PSOL, em seu site, apregoava diálogo e convivência com a tática black bloc, retirando às pressas o texto do ar quando dois blockers assassinaram o cinegrafista Santiago Andrade, da TV Bandeirantes, no Rio de Janeiro.

Quem não se lembra, na mesma toada, de Caetano Veloso, Marcelo D2 e quejandos vestidos de black blockers, com direito a elogio de Caetano Veloso aos olhos verdes da black blocker Emma, capa da Veja? Caetano Veloso pode viver tranqüilo sabendo que seu público nunca iria lhe cobrar por isso.

Tudo é dito para reforçar alguma narrativa, provocar algum sentimento, mover a população para a adesão a alguma causa ou se livrar de sentimentos ruins que alguma prática possa gerar. O curioso é fazerem isso com black blocs, uma tática tão antiga quanto a anarquia: sua única diferença para o método da ação direta de Bakunin e Proudhon são as roupas pretas e cobrir o rosto. E mais nada.

É o suficiente e sobejante para que Esther Solano, Willian Novaes e Bruno Paes gastem páginas e páginas escrevendo um livro revelando “a verdade” dos mascarados, apenas para se surpreenderem por não terem entendido nada e descobrirem que aquele “A” com um círculo da anarquia é uma mensagem política. A América e a pólvora, ou melhor, a roda, estão à caminho.

A notícia de que os dois blockers irão à júri popular imediatamente faz todos pensarem em um político: Marcelo Freixo, agora candidato à prefeitura do Rio pelo PSOL. Apesar de os dois blockers se mostrarem algo mais próximo de dois desocupados tentando sufocar o vazio de suas existências acendendo rojões contra a polícia pelo motivo de que outras pessoas estão fazendo a mesma coisa, algumas perguntas permanecem em aberto, que deveriam ser colocadas para o candidato a prefeito responder.

A primeira e óbvia é: onde está Elisa Quadros Pinto Sanzi, a “Sininho”? A ativista cujo papel era usar seu charme para liderar turbas enfurecidas de marmanjos cobrindo o rosto, dando alguma organização ao que só aos olhos pouco versados na realidade de agitações militares e populares pode ser encarado como “espontâneo e horizontal”, está sumida do noticiário. Mas seu aparecimento se deu justamente por arrumar advogados para blockers presos, sempre usando seus “contatos” no PSOL como fonte (não se sabe se também pecuniária). Marcelo Freixo afirmou apenas conhecer de passagem a moça. E ficou por isso mesmo?

Em segundo lugar, uma pergunta cabeluda de Leão Serva, na Folha: Por que só um tipo de ônibus pega fogo? Ora, apenas entre o começo de 2014 e o meio de fevereiro do ano dos black blocs, 45 ônibus foram queimados, gerando um prejuízo de R$ 23 milhões. Até aí, nada de estranho na ação direta: como já definia Ortega y Gasset a respeito da Rebelição das Massas, “as massas populares costumam procurar pão, e o meio que empregam costuma ser o de destruir as padarias”.

Mas há algo estranho: há dois sistemas correntes de ônibus em cidades como São Paulo: as empresas com licitação e as concessionárias, os antigos “perueiros” regulamentados. Contudo, 94% dos ônibus queimados são de empresas, e apenas 6% de concessionárias, embora 60% dos ônibus em circulação em São Paulo sejam destas últimas.

Como é possível? Por uma mera coincidência? Se black blockers são presos e sempre se vê o nome do PSOL rondando a tática, citando-se até o nome de Marcelo Freixo, por que a pergunta nunca é feita, ficando perdida numa coluna de jornal que todos providencialmente ignoraram?

Por fim, resta uma pergunta contábil, sem nem exigir um Excel, tão infenso aos típicos universitários de cursos de Humanidades que perfazem o eleitorado do PSOL de Marcelo Freixo. Será mesmo que as pessoas não prefeririam pagar 20 centavos a mais no preço da passagem para poder ter as vidas ceifadas pelas manifestações iniciadas em junho de 2013 de volta? Será mesmo que há milhões e milhões de centavos que valham essas vidas?

Com efeito, não se trata apenas de criticar black blocs – uma crítica fácil, que qualquer um pode fazer. Mas, tal como o PowerPoint do Ministério Público circundando Lula, parece ser mais uma questão de ligar pontos entre informações que todo o público possui, mas estão desconectadas: por que tudo o que envolve black blocs circunda de perto o PSOL de Marcelo Freixo, com seu nome possuindo estranha familiaridade com os blockers?

https://twitter.com/GABRIELPlNHEIRO/status/780920020746534912

Quanto tempo será que falta para que o ideário defendido pelo partido e seu socialismo teen deixar de ser tratado como algo à parte da tática black blocs tão criticada pela população?

Há perguntas sem resposta e a população costuma crer que vários aspectos da criminalidade e da violência são como raios que não vêm da mesma tempestade. Talvez ligando os pontos, o nome do PSOL apareça exatamente circundando tanta violência política.

Contribua para manter o Senso Incomum no ar sendo nosso patrão através do Patreon

Não perca nossas análises culturais e políticas curtindo nossa página no Facebook 

E espalhe novos pensamentos seguindo nosso perfil no Twitter: @sensoinc

Saiba mais:

[amazon asin=8501103594&template=iframe image2][amazon asin=8567394821&template=iframe image2][amazon asin=8571644578&template=iframe image2][amazon asin=B007SYS8I2&template=iframe image2][amazon asin=B003TO5838&template=iframe image2][amazon asin=8580330866&template=iframe image2]
Assuntos:
Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

  • 1
plugins premium WordPress