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Marisa Letícia e Celso Daniel: As mortes convenientes do PT

Muitos partidos podem tirar vantagens de tragédias. Mas nenhum com a proximidade que Marisa Letícia e Celso Daniel tinham para o PT.

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Lula no velório de Celso Daniel

Se a Teoria do Domínio do Fato foi preponderante para se imputar as penas no julgamento do mensalão, observando-se um todo global, looking at the big picture, o PT hoje pode sempre se defender com a Teoria da Mera Coincidência, como a batizou Olavo de Carvalho. Ela é excelente para explicar as mortes de Celso Daniel e Marisa Letícia, mulher oficial do ex-presidente Lula.

Marisa Letícia, a “Dona Marisa” de acordo com o lulismo, de simples sindicalista aposentada que não aparecia nem sequer à sombra do marido, se transformou em uma poderosíssima agenciadora e investidora post mortem, capaz de tratar de apartamentos milionários com os maiores empreiteiros do país sem que seu marido, o presidente Lula, o homem que mais fez negócios com OAS, Andrade Gutierrez e Odebrecht em nossa história, jamais ficasse sabendo.

Em vida, a “Dona” Marisa Letícia só ficou nacionalmente conhecida por seu brocado primeira-damesco “Enfiem as panelas no cu”. Assim que morreu, ocorreu um curioso efeito de herança e transferência de bens e responsabilidades invertidas, com a defunta como destino: todos os bens e ações e responsabilidades recaem sobre Marisa Letícia. Lula seria tão somente um ex-presidente do Brasil, sem poder sequer sobre o PT.

No processo, também Léo Pinheiro, chefe de uma empresa bilionária, foi transformado sem qualquer explicação em um revendedor imobiliário, parando seus negócios para tentar vender um único apartamento.

Quando Marisa Letícia faleceu, Lula discursou sobre seu caixão dizendo que a Lava-Jato havia matado “Dona Marisa”. Aparentemente, uma investigação de corrupção acelerou um câncer antigo que Marisa Letícia teve.

https://twitter.com/ajulysantos/status/864549067220631552

modus operandi segue o de outro famoso velório petista: o de Celso Daniel. Na tarde do dia 21 de janeiro de 2002, o então candidato Lula pediu para improvisarem um palanque – até um caixote serviria. no Paço Municipal de Santo André. Enquanto tentavam culpar a PM paulista e o eterno governador Geraldo Alckmin pela violência que, naquele dia, informavam ser “política”, como se houvesse uma grande perseguição a prefeitos petistas (o primeiro havia sido Toninho do PT, de Campinas), Lula disse algo que nunca mais teria coragem de repetir:

— Estou convencido de que você, Celso Daniel, não foi vítima do acaso e que não foi um incidente. Possivelmente, sua morte foi planejada, possivelmente tem gente graúda por trás disso.

(vide o livro Celso Daniel: Política, corrupção e morte no coração do PT, de Silvio Navarro, do qual fizemos uma resenha aqui)

Tal como a narrativa se inverteria no caso de Celso Daniel, quando não mais se podia culpar adversários políticos e qualquer visão de motivação política só inculparia o próprio PT, com “Dona” Marisa Letícia também a Lava Jato passou de algoz da inocente ex-primeira-dama a mero instrumento que mira no alvo errado: deveria mirar na verdadeira organizadora das transações, aquela que já está morta e não pode ser presa – nem, muito menos, falar qualquer coisa.

Celso Daniel, seguindo o lema dead men tell no tales, não importando quem tenha encomendado a sua morte, deu um alívio enorme para o PT e grandes figuras próximas ao partido. Marisa Letícia, vítima de um câncer com o qual vinha lutando há anos, certamente acabou facilitando a narrativa de “se alguém roubou, tem de prender, mas não pode prender, para o público não saber que algum petista roubou”.

De fato, muitos políticos têm podres horrendos. Mesmo os partidos queridinhos da mídia, que podem sempre contar com seu silêncio ou sua confiança forçada: vide o Partido Democrata de Hillary Clinton, que não é cobrado pela mídia a respeito do assassinato misterioso de Seth Rich, membro do DNC que vazou 44 mil e-mails Democratas ao WikiLeaks antes de aparecer morto.

Mas no caso de um dos melhores amigos e da própria esposa… bem, são poucos os políticos no mundo que puderam colher tantos lucros e vantagens de suas mortes como o chefe petista.

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Assuntos:
Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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