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Música

MC Carol critica Lava Jato em funk. Já leu as outras letras dela?

A funkeira carioca MC Carol criticou a Operação Lava Jato em sua nova música. Podemos ver sua relevância moral lendo suas outras canções.

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A funkeira carioca MC Carol, que aparentemente também se apresenta como MC Carol Bandida, criticou a Operação Lava Jato em sua última música, “Delação Premiada”. A MC Carol Bandida criticar a Operação Lava Jato soa auto-explicativo.

Para quem ainda tem dificuldades em entender a política nacional recente, e está confuso, inquieto ou em crise de identidade político-ideológica, a frase é suficiente.

Para entender a mentalidade de quem critica a Lava Jato, podemos ler o trecho anti-Sergio Moro e pró-PT do funk de MC Carol (ouvi-lo é submeter nossos neurônios a uma tortura próxima ao Estado Islâmico):

Delação premiada

Sete da manhã
Muito tiro de meiota
Mataram uma criança indo pra escola

Na televisão
A verdade não importa
É negro, favelado, então tava de pistola
Cadê o Amarildo?
Ninguém vai esquecer
Vocês não solucionaram
A morte do DG

Afastamento da polícia é o único resultado
Não existe justiça
Se assassino tá fardado

Para entender bem como funciona a cabeça de um crítico da Lava Jato, uma boa dica é ler a letra das outras produções artísticas e intelectuais da funkeira MC Carol, em sua reveladora postura da mentalidade trabalhadora, honesta e explorada pelo capitalismo, mostrando que a culpa de nossa miséria econômica, moral e jurídica é mesmo dos outros.

Por exemplo, a canção Vou largar de barriga, que versa:

Eu não moro na tua casa, nem como da sua comida
Vou te processar botar seu nome na justiça
Vou chamar o advogado, te acuso de agressão
Conto umas historinhas pra te ver no camburão
Conto mentira pros meus pais pra conseguir tudo o que eu quero
Roubei o seu caráter, te joguei no inferno
Estourei a camisinha sou esperta pra caralho
Ganhei na justiça, te dei golpe de estado

E e fodeu
Que a missão vai ser cumprida

(…)
E a missão vai ser cumprida
Vou largar de barriga, vou largar de barriga
Com as pernas “esculhaçadas” e a perereca toda fodida
Vou largar de barriga, vou largar de barriga

Sua forte carga moral, bem adequada a uma crítica à Lava Jato, mostra exatamente o que pensa quem critica a Operação da Polícia Federal. A inspiração de MC Carol só pode remeter às Musas de Homero – ou talvez seja explicada por outra canção da poetisa, que demonstra ser quase uma pitonisa de Apolo:

Bateu uma onda forte

Caralho, caralho
Bateu uma onda forte
Tô vendo um macaco em cima do poste
Ai caralho, que mina maluca
Tô vendo um macaco em cima do poste
Caralho, bateu uma onda forte
Tô sentindo um rato dentro do meu short
Novinho interesseiro, eu vou te deixar forte
Vai fumar maconha segurando o meu malote
Novinho interesseiro, eu vou te deixar forte
Vai fumar maconha segurando o meu malote

Mas também podemos ver um aprofundamento da cosmovisão moral, jurídica e mesmo metafísica e religiosa da autora MC Carol, naquele sistema que “transcende a pele” no belo dizer de Nassim Nicholas Taleb.

É quando a poetisa MC Carol demonstra a causa e conseqüência jurídica para as ações humanas, e por que a Lava Jato tanto merece ser criticada e o PT ser tão defendido:

Jorginho Me Empresta a 12

Filho da puta
Me deixou a pé
Veio pra cá pro Baile
Pra comer outra mulher

Me trancou em casa
Me deixou sem dinheiro
Jorginho me empresta a 12
Vou matar esse maconheiro

Ôh Jorginho me empresta a 12
Pra mim fazer um barulho
Vou matar esse maconheiro

Aqui o epos narrativo confronta a maledicência de seu amado-opressor, que convida a amada MC Carol para bailar, mas num desvio ligado aos males da Igreja (o diabo, a carne e o mundo) acaba por esquecer de sua donzela em um canto para carcar a caralha em lorto fétido alheio.

O baile, como sabem os escritores versados na arte da narrativa de Christopher Vogler em sua Jornada do Escritor, que tanto paga tributo a Joseph Campbell e seu Herói de Mil Faces, é onde o herói conhece aliados e inimigos, e conhece um pouco as regras de um mundo inexplorado, diferentes da do seu mundo circundante antes da aventura, recheada de romantismo e perigos que exigem a arte de salvar o mundo.

Note-se ainda o epíteto dado ao seu antigo romântico swashbuckler, “maconheiro”, mostrando que a poetisa MC Carol possui fortíssimo repúdio ao mau hábito de queimar uma brenfa.

Tal epos moral e cívico contrasta dialeticamente com o que versa a poetisa em outra canção:

Meu Namorado É Maior Otário

Meu namorado é maior otário
Ele lava minhas calcinhas
Se ele fica cheio de marra eu mando ele pra cozinha
Se tu não tá gostando, então dorme no portão
Porque eu vou pro baile, vou pra minha curtição

Aqui vemos o eu-lírico da poetisa justamente em diálogo com a outra canção, mostrando uma abertura para o mundo do baile, longe da proteção do lar e da familiaridade com o Umwelt, o mundo circundante, e ela agora é que encontra no baile a sua libertação.

Mas se ainda resta dúvida sobre quem defender no caso da funkeira MC Carol criticar a Lava Jato, basta ler a belíssima descrição da vida avançada de quem é contra a Lava Jato e sabe que Dilma Rousseff é inocente e que o PT é um partido íntegro, a ser defendido e novamente votado. Está no seguinte poema:

Tô usando crack

Tô usando crack
Tô usando crack

Larguei minha família
A escola, você sabe
Parei com a maconha
Tô usando crack
Tô usando crack

Larguei minha família
A escola, você sabe
Parei com a maconha
Tô usando crack

No copo de Guaravita
Eu fico suave!
Tô usando crack
Tô usando crack

A maconha te engorda,
Use crack que é mais light!
Tô usando crack
Tô usando crack

Vou perder os meus amigos
Se prostituir faz parte
Tô usando crack
Tô usando crack

Não nos esqueçamos de que afirmar qualquer coisa sobre MC Carol afirme sobre ela própria é, no contato intermediado com a realidade que a esquerda produz, machismo, racismo, homofobia e fascismo.

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Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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