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Dona Folha, já não passou da hora de demitir Gregório Duvivier?

Gregório Duvivier escreve coluna na Folha de S. Paulo criticando o próprio jornal. Apenas Duvivier consegue fazer a Folha parecer certa.

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Gregório Duvivier lê carta de demissão

A Folha de S. Paulo ficou marcada por uma das propagandas mais icônicas do século XX, mostrando que é possível contar mentiras apenas dizendo a verdade. A propaganda se inicia com vários elogios a um homem, que no fim se revela ter um nome: Adolf Hitler. O nazismo voltou à tônica hoje, em coluna de Gregório Duvivier intitulada “Dona Folha”.

Gregório Duvivier é um humorista amador do canal do Youtube Porta dos Fundos. Ou seja, um youtuber (essa nova profissão) que ganhou projeção e espaço na classe falante, a ponto de ter uma coluna no maior jornal do país. Ainda assim, suas tentativas de sucesso real fora do mundo youtuber são fracassos fragorosos, como seu filme, que arrecadou 7,5 milhões via Lei Rouanet (muita gente “confia” no sucesso antecipado), mas não vendeu mais do que 375 mil ingressos em 3 semanas em cartaz.

Do que um youtuber pode falar? Talvez uma coluna sobre como captar dinheiro com o governo: Gregório Duvivier certamente entende do riscado. Talvez falar alguma coisa para seu público jovem: como colocar uma camisinha, como cuidar de espinhas, o último episódio de Malhação, os melhores sites de pornografia gratuita.

Gregório Duvivier com boné do MSTMas não: Gregório Duvivier inventa de falar de política. Por que eu compraria um jornal para ler o que um youtuber de filme fracassado tem a dizer sobre política? Parece muito mais o caso contrário: a Folha é que transfere um dinheiro para Duvivier aproveitando-se do resto do jornal. O interesse da população pela ciência política à luz de Duvivier beira o vácuo absoluto.

A Folha, ou melhor, a “Dona Folha” foi atacada na semana passada por manifestantes e por um black bloc que tomaram o centro da cidade de São Paulo (onde o prédio da Folha fica) numa das manifestações do “Fora Temer” (sem vírgula).

Petistas e esquerdistas acreditam que se uma presidente que tomava o dinheiro do povo para “distribuir” entre seus apaniguados e seu curral eleitoral foi impedida após uma fraude fiscal comprovada, sendo julgada constitucionalmente, eles próprios passam a ter o direito de tomar e destruir obra do trabalho alheio à força. É o PT puro. É a esquerda bakunística e negriana em sua apoteose.

A Dona Folha, ao invés de notar o óbvio, ainda atenuou: repisou a surrada narrativa de que os “soldados da arruaça se infiltram em protestos de esquerda, cujas lideranças têm medo de repudiá-los”. A litania insistida neste refrão tenta dar a entender que os vândalos não são de esquerda – os “infiltrados” poderiam até ser de direita, e as lideranças têm “medo” de repudiá-los. Qualquer leitura básica sobre movimentos de massa demonstra exatamente o contrário.

Putsch de MuniqueÉ como crer que os marxistas que agitaram as massas na Rússia em 1905 (e depois em 1917) eram “infiltrados”. Ou que os teocráticos islâmicos da Revolução Iraniana de 1979 eram “infiltrados”. A Primavera Árabe, tão comemorada pelo jornal e que colocou a Irmandade Muçulmana no poder, matando todos que não fossem muçulmanos no Egito, teria “infiltrados”. E, para o exemplo óbvio tanto do editorial da Folha quanto da coluna de Gregório Duvivier, que os nazistas marchando e dando um Putsch em Munique seriam “infiltrados” em um movimento pacífico.

Fora a conivência malemolente e suicida com um movimento que não entende, nada mais explica o vezo da Dona Folha em tratar cada arruaça, protesto e tentativa malograda de revolução como uma festinha que durou mais do que o permitido pela Lei do Silêncio.

A Dona Folha, em verdade, não chega a tal conclusão, mas apenas pergunta, ao invés de responder:

Grupelhos extremistas costumam atrair psicóticos, simplórios e agentes duplos, mas quem manipula os cordéis? O que pretendem tais pescadores de águas turvas? Quem financia e treina essas patrulhas fascistoides? Está mais do que na hora de as autoridades agirem de modo sistemático a fim de desbaratá-las e submeter os responsáveis ao rigor da lei.

As questões já foram respondidas em diversos estudos, reportagens e livros, como Por Trás da Máscara: do passe livre aos black blocs, as manifestações que tomaram as ruas do Brasil, deste vosso escriba. Movimentos de massa buscam exatamente o que a Dona Folha induz, mas não responde com todas as letras. Falta a última coragem: citar intenções e nomes. E qualquer adolescente que leu 3 páginas de Bakunin e Proudhon sabe o que querem os anarquistas que flertam na periferia do PT.

Gregório Duvivier, que entende menos sobre isso do que os adolescentes que assistem seu canal de Youtube, surtou. Acreditando que o nazismo foi na verdade um movimento contra protestos, buscando a ordem (e não um protesto que toma o poder e coíbe toda a concorrência), inverte o editorial, critica a própria Dona Folha (o que não é exatamente difícil, mas escolheu um raro momento em que a Folha está certa) e dá a entender que não gostar de vandalismo é nazismo.

Alguém precisa ensinar para Greg, o youtuber, o que foi o Putsch na Burgebräukeller, em Munique.

A quantidade de aleivosias toscas de Gregório Duvivier para criticar a Dona Folha mostra que é um rapaz que se impressiona com facilidade absurda com manchetes de notícias que é integralmente incapaz de entender. Por que um garoto desses não usa sua coluna para falar de videogame ou da última Capricho? Sua tentativa de ser inteligente contra Michel Temer (em quem votou) provoca muito mais risos do que todas as suas atuações como youtuber:

O vampiro que nos governa acaba de recriar o Gabinete de Segurança Institucional. O ministro da Justiça pede menos pesquisa e mais armamento. Uma jovem perde um olho atacada pela polícia. Uma presidenta democraticamente eleita é derrubada porque teria cometido um crime, mas não perde os direitos políticos porque afinal ela não cometeu crime nenhum. O Senado que a derrubou por causa de créditos suplementares muda a lei em relação aos créditos no dia seguinte à sua queda.

Quem instituiu leis anti-terrorismo (ao contrário do que esperavam, bastante criticadas no livro deste vosso servo) foi ninguém menos do que Dilma Vana Rousseff, contra os protestos que poderiam minar sua Copa do Mundo, alardeada como “conquista” sua. A manchete sobre o ministro da Justiça esconde um fato claro: as pesquisas sobre criminalidade só mostram que o desarmamento (propagado por Duvivier na mesma toada do marco civil da internet) fracassou (mas que capacidade tem o Gregório de se impressionar com uma frase sem ler mais nada!). A jovem que perdeu o olho pregava violência e vandalismo com o olho dos outros nas redes sociais. Dilma não perdeu direitos políticos por uma manobra inconstitucional de petistas aliados a Renan Calheiros (diga-me com quem andas etc). O Senado que derrubou Dilma Rousseff acaba de aprovar uma lei que afetaria num total de zero absoluto o seu processo de impeachment, numa lei pedida por… Dilma Rousseff.

Gregório Duvivier faz a barbaA incapacidade de Gregório Duvivier de dar uma dentro o torna incapaz para escrever uma coluna para a vida adolescente, cuja maior preocupação é exatamente essa. Por que devemos ter a infelicidade de ter nossa juventude lendo as opiniões do youtuber-mor sobre Direito Processual Civil e história do Terceiro Reich na Dona Folha de S. Paulo?

Para o youtuber, os blockers que tacam fogo na cidade, interrompem e amedrontam a vida dos trabalhadores honestos, quebram propriedade pública e privada, incendeiam lixo e até um carro próximo à casa de Michel Temer, destróem e saqueiam lojas e concessionárias e atacam o prédio do próprio jornal que capitalistamente infla a conta bancária de Gregório Duvivier são na verdade micro-heróis da liberdade de expressão contra o “golpe”.

Ou melhor: em suas palavras, “‘black blocs’ em geral têm 12 anos, espinhas e mochila cheia de roupa preta e remédios pra acne”. OOOHHHWWWNNNN!! Ti fofinhu!! Alguém pode por favor entregar um livro de História (não um do MEC, um livro de quem já leu outros livros) para o youtuber no capítulo “Juventude Hitlerista”? Ele vai escrever uma coluna “mara” na semana que vem sobre as roupinhas de maloqueiros como Günther Grass, que logo ascenderia para a Waffen-SS.

Gregório Duvivier fantasiado de anjo viadoA fonte histórica de Greg, que um dia, após sonhos intranqüilos, acordou na cama metamorfoseado em um gigantesco palpiteiro endinheirado, é Bruno Torturra, do Mídia Ninja (George Soros em profusão). Sempre acreditando que qualquer forma de reprimir o ataque à propriedade alheia é o mesmo que nazismo (quando o nazismo usa como desculpa justamente a “burguesia” ou “raça” de outrém para atacar sua propriedade e vida), jura que qualquer defesa da integridade e da cidade é o primeiro passo para o nazismo.

Colocando-se uma imagem dos nacional-socialistas arruaceiros numa cervejaria de Munique em 1923 e a foto da polícia que os prendeu diante de Gregório Duvivier e Bruno Torturra e pedindo-se para ambos apontarem quem são os nazistas e quem são as forças da liberdade, é de se apostar alto num erro fragoroso dos dois revolucionários infanto-juvenis.

Antes de tentar dar uma aula à Dona Folha, a Dona Folha, vetusta e com histórico melhor sobre o Reichstag e Adolf Hitler do que youtuber, poderia ensinar alguma coisa a Gregório Duvivier: direito à propriedade e “repressão” a quem reprime a cidade existe para os garis e trabalhadores da cidade não terem de pisar em caco de vidro e lixo incendiado horas depois dos espinhentos de roupa preta voltarem para a casa do papai.

Será que Gregório Duvivier topa varrer a rua no dia seguinte? De fato, é um emprego para o qual o vemos muito mais qualificado do que ligar sua metralhadora de palpitaria na Dona Folha.

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Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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