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São Paulo

Sério, qual o problema com o Doria de gari?

O prefeito de São Paulo foi criticado por se vestir de gari. De tudo o que pode ser criticado em Doria, os jornais escolheram uma qualidade.

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João Doria se veste de gari em seu primeiro dia como prefeito

Há muitos problemas com João Doria que fazem com que a cidade de São Paulo precise ficar de sobreaviso quanto à sua gestão. A troca de favores com seu horrendo partido é o mais óbvio, mas há coisas que exigiriam muito eufemismo para dizer que apenas “precisam de explicação”, como o R$ 1,5 milhão que recebe em propaganda do governo do estado para sua revista Caviar (sic). O novo prefeito de São Paulo, enfim, pode ser alvo de críticas, mas a imprensa inventou de criticá-lo por se vestir de gari na sua primeira manhã como prefeito.

A Folha de S. Paulo, por exemplo, tratou de alertar que a Praça 14 Bis, onde Doria esteve, já tinha passado por uma faxina antes da visita do “gari” Doria. O jornal do sr. Frias só não conseguiu ser ainda mais impactante porque não avisou que Doria, na verdade, é rico, e foi muito sutil colocando aspas na palavra “gari”, quando poderia muito bem ter colocado um foca gritando “Eureca! Eureca!” e correndo pelado ao redor da praça.

Alguém aí acredita que Doria estava “varrendo” a cidade, no lançamento do programa Cidade Linda? Não era seu intuito, diga-se. Como Jânio Quadros não prometeu varrer (com aspas ou sem) a cidade inteira, literalmente, com seu jingle “Varre, varre, vassourinha”. Ninguém esperava que Doria fosse “limpar” a maior cidade do hemisfério no muque para ser bom. Seu uniforme de gari não é uma fantasia, é um símbolo.

Não significa, ao contrário do que pensam os jornalistas que só tiveram aula de estruturalismo e outras nóias na faculdade, que seja um ato ou palavra vazio de significado. Jânio Quadros queria limpar a cidade da corrupção de seu arqui-inimigo, Adhemar de Barros, cujos acólitos popularizaram o mantra “rouba, mas faz”. João Doria, não é preciso ler o profundo Tratado de Simbólica de Mário Ferreira dos Santos para perceber, falou em humildade e mostrou que, apesar de podre de rico, dá a entender que está preocupado com o simples trabalhador e morador da cidade, que, após 4 desastrosos anos da gestão petista de Fernando Haddad, está saturado de discurso engomadinho de riquinhos se fazendo de pobres – o que inclui todo o staff da Folha de S. Paulo – e achando que a cidade melhorou com uma Cracolândia com Bolsa-Crack, vias expressas em terceira marcha e com um raddar a cada 50 metros, pichações e rolêzinhos de “música” vagabunda e um emaranhado cabeludo de ciclofaixas usadas apenas por pombos. Quem mais sofreu com Haddad, afinal, foi o gari.

Para uma cidade tão esculhambada e enfeiada como São Paulo, João Doria, que tem como “defeito” supremo ser rico, segundo a narrativa dos jornais, não teve medo de vestir as sandálias da humildade como primeiro ato e honrar o trabalho honesto, não importa quão seja simples. O gari é um símbolo perfeito.

Afinal, o que um gari tem a ver com Fernando Haddad e suas pichações e sua Cracolândia? Não importa quanto a Folha tente “problematizar” o caso, a apreensão primeira da realidade pelas pessoas normais, que não se envenenaram lendo desconstrução derridadaísta na faculdade, é óbvia e direta. Os jornais poderiam se preocupar com os verdadeiros defeitos de Doria. Acabaram se estrepando, soltando aquele Boris Casoy falando fora do microfone que todo esquerdista caviar guarda dentro de si, e tentaram criticar o que não merece crítica. Sai ganhando Doria, perde a investigação de seus reais defeitos.

O mais curioso foi o adjetivo de 2017 que tentaram colar no candidato: midiático. Até Júlio César era midiático. Na era da infowar, a guerra de narrativas pelos jornais, e da netwar, a criação de narrativas em rede que só aparentam ser “espontâneas”, um político que saiba se vender não é apenas inteligente: é quase um atestado de sobrevivência. Doria vestido de gari incomoda a esquerda justamente porque ela não tem como responder ao ato.

Será que a Folha e os outros jornais, tão críticos do novo prefeito paulistano e apontando sua hipocrisia, fariam o mesmo com seus cupinchas? Quando Pepe Mujica, o ex-presidente uruguaio que legalizou a maconha, apareceu de sandálias (e a Folha acreditou que era em um evento oficial), publicou a fake news em seu Facebook com um ♥. O clima pode ser sentido na manchete “Relembre sete momentos em que Mujica foi muito, mas muito Mujica”. E Barack Obama, o presidente com o pior legado em política internacional da história americana? Basta sorrir e ler uma frase no teleprompter para “deixar saudades” contra o malvado Donald Trump. Não são midiáticas tais manchetes? Não é preciso entender da mídia para sobreviver nesse reino pantanoso?

https://twitter.com/editorahumanas/status/815923530822991872

Definitivamente, na novilíngua do jornalismo e do assassinato de reputações da esquerda, mesmo quando você tem defeitos, não são eles que são criticados – apenas sua externalidade. Não se trata de um certo e um errado, sob o qual todos serão julgados igualmente. Trata-se apenas de saber se você faz parte da patotinha ou não. Não se julga pelo que você é, e sim pelo que você pode ser associado.

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Assuntos:
Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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