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Lula de Schrödinger

A manobra de Favreto para soltar Lula foi um ataque kamikaze

O desembargador Rogério Favreto praticou um verdadeiro ataque kamikaze para "soltar" Lula: sabia que não serviria de nada, mas foi sacrificado para fazer um showzinho.

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Rogério Favreto Lula selfie

O desembargador Rogério Favreto, plantonista (podemos dizer, “substituto”) do TRF-4, filiado ao PT entre 1991 e 2010, que sempre subiu na carreira por indicação de petistas como Dilma Rousseff, fez uma manobra kamikaze para tentar tirar Lula da cadeia.

Rogério Favreto ficaria de plantão enquanto os desembargadores “oficiais” estariam de recesso. Em questão de meia hora de expediente, numa jogada nitidamente ordenada, os deputados petistas Wadih Damous, Paulo Pimenta e Paulo Teixeira entraram com pedido de soltura do perigoso criminoso.

O desembargador Favreto emitiu um conjunto de 33 laudas pedindo soltura de Lula, digamos, “em nome do TRF-4”. É pouco crível que alguém tenha escrito 33 laudas após meia hora, mesmo que o sobrenome do desembargador fosse “Chalita”, mas tem gente que acredita até mesmo que Lula é preso político e que foi condenado sem provas e que o impeachment foi golpe.

A trama urdida era perfeita: o Brasil estaria de férias de julho. Todo o povo estaria preocupado com o Brasil nas semi-finais da Copa do Mundo, contra uma máquina de matar chamada França. São Paulo, o estado com 45 milhões de habitantes (um quarto do país) estaria celebrado o feriado prolongado de 9 de Julho (simbolismo curioso, por ter sido contra o fascismo). Boa parte da população estaria fora da cidade, evitando mobilizações como o dia anterior à prisão do próprio Lula, quando a Av. Paulista foi tomada (para ficar apenas em São Paulo).

Ou o dia que deveria ser considerado feriado patriótico tão ou mais importante quanto 7 de setembro: a quarta-feira de 16 de março de 2016, o Dia do Bessias, quando Moro liberou o grampo que provava que Dilma queria indicar Lula como “ministro da Casa Civil” (quem se lembra disso sem rir?) para evitar que ele fosse preso (sim, já naquela época). Sem nenhum grupo conclamar nada, uma parte gigante do país saiu do trabalho diretamente para as principais avenidas de suas cidades para exigir a renúncia imediata de Dilma Rousseff. Como petistas podem esquecer daquele dia?

Desta feita, melhor ainda: Sérgio Moro havia acabado de tirar férias. O juiz mais querido do hemisfério parecia não poder fazer nada.

O risco parecia ser zero. Tudo já estava arquitetado (ou, por outro lado, podemos crer que, por mera coincidência, Wadih Damous, Paulo Pimenta e Paulo Teixeira entraram com recurso naquele momento, e o eficientíssimo Rogério Favreto, mais rápido do que uma bala, despachou 33 laudas goela abaixo da sociedade em meia hora).

A única coisa que deu errado: a seleção brasileira não foi para as semi-finais, perfazendo a primeira vez na história que nem Brasil, nem Argentina e nem Alemanha estão nas semi-finais de uma Copa do Mundo.

De repente, aquilo que era uma trama maravilhosa, o tiro de misericórdia, teve de virar mesmo uma manobra kamikaze. Suicida, mas ao contrário dos guerreiros japoneses, samurais proibidos pela ocupação americana pós-Segunda Guerra, não envolvia honra.

Com tudo errado graças à derrota da seleção para a Bélgica, restava levar o plano até o fim na marra, mesmo sabendo que, se o original era ruim, o plano derrota era ainda mais brega. Rogério Favreto, que poderia, com muita sorte, conseguir, digamos, algumas horas de Lula na entrada da Superintendência com ajuda de algum elemento pouco confiável na Polícia Federal, de repente fez tudo simplesmente pelo teatrinho.

Tal como os kamikazes, que pensavam no coletivo e não em si próprios, Favreto pensou no partido. Sabendo que era um juiz substituto, agiu contrariando um órgão colegiado (que decidiu sobre toneladas de papéis e provas, e não de supetão, em meia hora), mesmo sabendo que uma norma do CNJ o proibia e mesmo sabendo que seria representado e punido (como certamente o será, ainda que os processos não tenham grandes conseqüências).

Ligando aos berros para a superintendência da Polícia Federal, exigindo um bizarro “prazo de uma hora” para Lula ser solto (mais parecendo um seqüestrador de filme de Supercine do que um juiz), Favreto conseguiu uns holofotes e fazer o Brasil prestar atenção numa movimentação em pleno domingo de feriado prolongado. Mas sabia que era só porque era teatro. Alguém sério faria isso? Com a nossa Justiça?

Antes mesmo de qualquer um dos jornalões ficar sabendo do caso, Manuela D’Ávila, Lindbergh Farias e aqueles de sempre já estavam com seus beleguins prontos, com hashtags, imagens buriladas, tudo.

Essa turma não tem mais medo do ridículo (leia análise sobre o lulismo em nossa revista). E se há leis no Brasil, certamente mesmo uma trama como esta não será representada (embora fique o convite para os operadores do Direito com poder para tal). Mesmo que não apaguem os rastros, que mostrem que estavam tramando contra a República, ainda preferirem fazer um ataque kamikaze. Favreto que seja sacrificado nas representações disciplinares, ao menos fica o teatrinho em ensaio para o grande espetáculo em outubro.

Fique também o aviso.

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Assuntos:
Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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