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Leblon radioativo

O carioca precisa acabar

O leitor nos perdoe se parecer inconveniente tratarmos da questão em meio à pandemia, mas um assunto urgente é um assunto urgente: precisamos falar sobre o fim do carioca

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Antes do texto, um aviso importante:

Hoje, no canal do YouTube do Instituto Borborema, haverá uma live (https://youtu.be/c6ZkEdDPXpY) essencial para entendermos toda esta loucura diabólica acerca do COVID-19.

Por favor, divulgue e participe!

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Live do Instituto Borborema sobre COVID-19

Feito o anúncio, vamos ao texto.

Uma das possíveis reações psicológicas diante do mal é a apatia, estado em que se reduz a percepção das circunstâncias imediatas como forma de proteger-se dos escândalos da crueldade.

É como se a inteligência, por si mesma, compreendesse o risco de desarranjo psíquico para o sujeito no caso de lhe manter a apreensão normal da realidade; então, num instinto de autopreservação, silencia a própria potência intelectiva.

Assim, o apático perde sua sensibilidade emocional e torna-se impotente para o horror, o compadecimento, e a revolta. Victor Frankl diz que uma pessoa nesse estado “aos poucos, vai morrendo interiormente”.

Veja o carioca. É um povo que aprendeu a conviver com o assassinato e o tráfico como convive com o Pão de Açúcar; o ânimo frouxo e festivo, não o querendo deixar de ser, tornou-se apático. É um povo pródigo no cultivo de sua desordem. Sim: o carioca precisa acabar.

Falo do Rio, mas me refiro ao Brasil. O carioquismo é uma síntese simbólica mais clara desta quimera torpe a que candidamente chamamos “jeitinho brasileirinho” (um eufemismo bem infame, tendo-se em vista como o diminutivo nos faz pensar a respeito desta nobre marca cultural com todo um enlevo risonho e condescendente), por tê-lo assumido também em sua estética cotidiana.

O carioca materializa o nosso espírito mais do que qualquer outro patriota, e, por isso mesmo, assume o altar do bode expiatório. Portanto, sinto decepcionar o leitor sanguinolento, mas aqui tomo “carioca” apenas como sinédoque: a parte de um todo, como quem observa uma célula cancerígena de um organismo inteiro ardendo em metástase. Trata-se, em verdade, de um problema de ethos nacional.

Por exemplo: não fosse o Brasil inteiro materialista e frustrado, o marxismo, esta gambiarra materialista e pseudofilosófica perfeita para frustrados, não teria encontrado aqui solo tão fértil e se volatilizado em poucos anos, expandindo-se para muito além da praia do Leblon. Há muito que, para o mal, estamos mortos interiormente.

Ainda mais se considerarmos os problemas da queda abismal da inteligência pátria e da forte inclinação para o autoengano. Ou seja, tendemos, espontaneamente, ou a perceber mal as coisas, ou a apreendê-las em sua forma devida para depois, à maneira de um protagonista machadiano, deformá-las ao nosso gosto.

Bem. Para que o inimigo não tome conta, a ordem é vigiar e orar. Mas como orar com o espírito tíbio, e como vigiar com os olhos dormentes? Há sempre um lobo à espreita. Pode o cordeiro descrente de sua perversidade, ou mesmo duvidoso de sua presença, conseguir se salvar?

Termino com Nelson Rodrigues, o qual dizia que “o que nos falta é o que chamaria de ‘espanto político’. Aqui as coisas espantosas deixaram de espantar. (…) Se baixassem um decreto mandando a gente andar de quatro – qual seria a nossa reação? Nenhuma. Exatamente: – nenhuma. E ninguém se lembraria de perguntar, simplesmente perguntar: – “Por que andar de quatro?” Muito pelo contrário. Cada um de nós trataria de espichar as orelhas, de alongar a cauda e ferrar o sapato. No primeiro desfile cívico, o brasileiro estaria trotando na Presidente Vargas, solidamente montado por um dragão de Pedro Américo. E seria lindo toda uma Nação e modular sentidos relinchos e a escoicear em todas as direções.”

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Assuntos:
Caio Perozzo

Caio Perozzo é palestrante e professor de Literatura do Instituto Borborema. Escreve para o Senso e para a página @naotenhaismedo no Instagram.

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