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O ataque terrorista foi feito para iniciar a Terceira Guerra Mundial

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Às vezes o mais óbvio passa diante de nossos narizes sem que percebamos. E do mundo inteiro de uma vez, sem que o mundo inteiro perceba o óbvio mais ululante possível, fazendo com quem veja o óbvio pareça uma espécie de louco.

Apesar da aparência de conspiracionismo, foi o objetivo declarado do ISIS (Estado Islãmico) iniciar o maior confronto da história mundial para instaurar o califado universal – o que é, aliás, o próprio objetivo do ISIS desde antes de adotar o nome de Daesh.

O Ocidente chora por Paris (ao menos, parte do Ocidente, que trata tragédias como tragédias, e não as colocando na balança da indignação para fazer propaganda política). No entanto, o ISIS não conseguiu ainda o que queria, como se lê em sua própria declaração.

O comunicado do Estado Islâmico assumindo a autoria do atentado foi publicado picotado em diversos jornais, que, na autofagia jornalística denunciada por Rolf Kuntz, apenas replicavam os mesmos trechos do comunicado. Uma versão mais completa, com um trecho que diz respeito ao futuro da humanidade, pode ser lida n’O Antagonista:

“Os soldados do Califado tem como alvo a capital da abominação e do perversão”, diz o comunicado do ISIS.

O comunicado diz também que “os oito irmãos” que praticaram massacres em Paris foram recrutados especificamente para golpear “o Stade de France, durante a partida contra a Alemanha, assistida por aquele imbecil François Hollande“, e o Bataclan, “onde centenas de idólatras estavam juntos em uma festa pervertida“.

O ISIS acusa a França de “insultar nosso Profeta” e de atacar “o Califado com seus aviões, que não serviram para nada nas ruas fedorentas de Paris”.

O comunicado termina dizendo que “este ataque é apenas o começo de uma tempestade”.

(grifos nossos)

É até difícil encontrar jornais que tenham transmitido estes trechos grafados do comunicado, por algum motivo obscuro.

Mas, em primeiro lugar, estes trechos deixam claro: o problema, para o ISIS, antes mesmo de falar nos aviões franceses em operação militar no Oriente Médio, é “insultar nosso Profeta”, ou seja, Maomé. E por que (a pergunta que ninguém parece fazer) atacar uma casa de shows? Pois era uma “festa pervertida”.

Isto tem a ver com o chamado “colonialismo”, com uma “resposta” a supostas “agressões” do Ocidente? Não, tem a ver com a religião: ao contrário do discurso médio ocidental, o islamismo é uma religião que não permite algo como o show de uma banda chamada “Eagles of Death Metal”.

Como o islamismo é um djin, uma visão de mundo que engloba concepções cósmicas, metafísicas, religiosas, valorosas, sociais e políticas (não podendo ser dissociadas umas das outras), o islamismo, ao contrário de religiões que nascem considerando-se religiões, e não visões totais de sociedade e política, não permite tais “perversões” de “idólatras” assim que conquista uma região e impõe a shari’ah.

Se a primeira conquista foi a hijra (ou “hégira“) de Maomé para Medina, que marca o início do calendário islâmico, o evento mais importante do mundo para o muçulmano, assim serão feitas as próximas conquistas anteriores à imposição da shari’ah ao mundo dos idólatras.

Mas o principal parece ter passado despercebido. Vamos falar “daquele imbecil François Hollande”.

Duas bombas estouraram no Stade de France, onde se disputava uma partida entre França e Alemanha. A primeira deixou 3 mortos, próxima ao portão J. Um corpo foi encontrado mutilado, o que deixa uma sanguinária pista de que foi o primeiro atentado em solo europeu com um homem-bomba suicida. E uma nova bomba explodiu antes do fim da partida, fazendo com que todos os torcedores tentassem evacuar o estádio, quando metade dos portões foi fechado.

O presidente francês, François Hollande, que assistia à partida, teve de sair local às pressas.

https://www.youtube.com/watch?v=4j7AwyqQNCA

As bombas que estouraram, portanto, miravam o presidente francês, e não apenas 3 pessoas próximas a um portão. A segunda, do qual não temos registro de vítimas, parece não ter logrado êxito (e poderia ter sido a bomba a assassiná-lo), estourando nas imediações do estádio, provavelmente pelas medidas de segurança da polícia francesa.

Não é pouca coisa assassinar um presidente de um país coligado a outros através de pactos como a União Européia. A primeira Guerra Mundial se iniciou com o assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando, herdeiro do trono do Império Áustro-Húngaro, em Sarajevo, pelo separatista sérvio Gavrilo Princip. O assassinato de Sarajevo iniciou uma imensa disputa de heranças e alianças monárquicas entre as seis maiores potências do mundo de então, que culminou no esfacelamento das monarquias européias (e também no fim do Império Otomano, tão importante para se entender o Estado Islâmico).

O assassinato de um presidente, hoje, não significaria a mesma disputa interna, com a “amotinada Europa toda em paz”, mas uma união européia (não apenas da UE de fato) num objetivo comum.

Exatamente o que o ISIS quer: um conflito mundial, em que “os soldados do Califado tem como alvo a capital da abominação e do perversão”. Por enquanto, a Paris do Charlie Hebdo, dos aviões em ação na Síria. Logo, poderá ser outro país. E provavelmente este próximo país será a Alemanha, no epicentro da hijra, ou como é chamada em termos rasos jornalísticos, a “crise de refugiados”. Exatamente o país da outra seleção daquele jogo.

A Guerra Fria foi vencida por 26 palavras contidas no artigo quinto do Tratado de Washington, que fundou a OTAN em 1949: ‘The Parties agree that an armed attack against one or more of them in Europe or North America shall be considered an attack against them all.’ As partes concordam que um ataque armado contra uma ou mais delas na Europa ou na América do Norte deve ser considerado um ataque contra todas elas.

A OTAN, que trouxe paz ao mundo ocidental como nada antes, seria invocada imediatamente no caso de um ataque a um presidente. Todos os presidentes, a despeito deste Tratado, saberiam sentir o frio na espinha que também os ronda.

Por enquanto, um ataque terrorista de tal magnitude ainda está sendo considerado um “problema francês” e visto como uma questão interna da França, sobretudo pelo jornalismo e pela discussão genérica (que desconhece o que presidentes e o alto escalão de Inteligência de um país pensam), por crer que o ISIS apenas “revida” ataques sofridos.

O que o ISIS realmente quer é o apocalipse islâmico, o julgamento universal por Allah, e iniciar um confronto que lhes garanta o Califado global.

A mídia “esquecer” de que o alvo era o presidente francês François Hollande só demonstra o quanto estamos longe de compreender o que acontece diante de nossos narizes. A Terceira Guerra Mundial, afinal, pode já ter começado. Foi o Estado Islâmico quem garantiu: “este ataque é apenas o começo de uma tempestade”.

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Assuntos:
Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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