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Lula ministro é jogada kamikaze

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Uma das cenas mais dramáticas do melhor filme de todos os tempos, O Exterminador do Futuro 2, mostra Miles Dyson (Joe Morton) invadindo o quartel-general da Cyberdyne Systems para explodir o material de pesquisa que criaria os ciborgues que escravizariam a Terra. Um tiroteio começa justamente acertando o peito de Dyson, que só tem como escape segurar o botão dos detonadores enquanto se agarra aos últimos fiapos de vida.

É o que se chama em linguagem bélica de “botão de morto”: em caso de estar para morrer, a única coisa a fazer é matar inimigos junto. Como puxar o pino de uma granada assim que percebe que possui poucos segundos de vida e está rodeado de adversários.

O PT inventar de nomear Lula não é exatamente um botão de morto: não vai conseguir ferir ninguém com isso. O que mostra o estado do partido após as manifestações de domingo e após mais bombas e bombas para todos os lados na última delação de Delcídio.

Até mesmo os trechos que se referem a Aécio Neves não foram denúncias partindo do PT para atingir um adversário: foram obras da mesma delação que complica Lula, Dilma, Mercadante e mais uma penca de petistas.

O que ninguém percebeu: por que o PT, que deve possuir as mesmas informações que Delcídio há tempos, não utilizou estas informações antes para prejudicar o adversário político? Não espere tal nível de raciocínio lógico e antevisão de jornalistas que acreditam no PT, mas vamos dar um pequeno spoiler dos próximos dias: Aécio sofrer significa fazer o PT sofrer. Não só porque a fonte da denúncia é a mesma, mas porque ambos são mais parecidos e próximos do que petistas sonham imaginar.

Tentar um ministério é um ato kamikaze do PT. Não foi um “botão de morto” – ou teriam acertado Aécio antes. Foi tudo ou nada, escapar da prisão ou suicídio. E nem conseguiram atingir ninguém – muito menos alguém que foi considerado um “líder” pelo povo nas manifestações, sem ajuda de tucanos ou da Rede Globo (estes que só eram inimigos do PT há quase 20 anos, mas o PT ainda não percebeu como o país mudou).

Se Lula aceitar o ministério, estará tão somente admitindo a culpa que tem e o valor da delação de Delcídio. Tudo pode vir a baixo por dois fatores: o pedido de prisão preventiva pelo Ministério Público de São Paulo, que ainda não teve resposta, e (ainda mais fortemente) pela homologação da própria delação de Delcídio pelo ministro do STF Teori Zavascki.

Alguém realmente acredita que, por mera coincidência, Lula precise virar ministro agora? De todas as pessoas no país que podem vir a ser ministros, apenas Lula é uma opção? Qualquer pessoa sabe que isto é tão somente para lhe dar foro privilegiado e não ser preso. O Paulo Henrique Amorim sabe disso, o Brasil 247 sabe disso, o Guilherme Boulos sabe disso. Apenas não têm mais o que fazer para defender o PT.

Traduzindo: a esquerda defende privilégios para o dono de um triplex e de um sítio, através de propinas com as maiores empreiteiras do país.

Como explicou o advogado Taiguara Fernandes de Souza, Isto é claro desvio de finalidade. Ademais, uma liminar suspensiva de nomeação suspende o foro privilegiado. Como se ainda não fosse suficiente, o crime cometido é de Dilma, ao nomeá-lo, o que piora bastante a sua situação já precária pós-domingo.

E há ainda um outro crime, o mesmo que prendeu Delcídio e o mesmo de Aloizio Mercadante (já em ritmo de tic-tac com a PGR estudando prendê-lo): obstrução da Justiça. O pedido de prisão preventiva de Lula pelo MP citou exatamente este crime, o que acólitos petistas como Ricardo Noblat afirmaram que “ainda não ocorreu”. Se as provas até hoje não eram suficientes, agora são – embora Janot, como informa O Antagonista, esteja provando que suborno e compra de silêncio podem ter sido legalizados no Brasil.

O resultado é que o PT perdeu o apoio da população e sua suposta onipotência eleitoral desde 2002 através do populismo e do enorme carisma de Lula. Chutou o balde e ficou apenas com o apoio de sua militância – apesar de a imprensa não saber interpretar a obviedade para os leitores e espectadores de jornal, até o povo instintivamente sabe que quem possui um uniforme da CUT nas manifestações pró-Lula não é povo, não tem identidade com quem paga impostos e não gosta de corrupção.

Quem confiava no PT pelo discurso pobrista e de “dar dinheiro de graça” já havia dado seus últimos estertores de apoio. Sobram os ideólogos, embora até mesmo a turma “meio intelectual, meio de esquerda” já comece a abandonar o barco do adesismo, como mostrou Marcelo Rubens Paiva pós-protesto.

A militância pode defender Dilma, Lula e o PT agora: mas isto significa o adeus ao PT pós-2018. Claro que alguns ficam ainda mais fanáticos, mas se tornam uma minoria que não cresce. Ninguém que não apoiava Lula passará a apoiá-lo a partir do momento em que os boatos de ministro se confirmarem, desde que, nesta semana, Brasília se tornou tão absurda que boato e realidade parecem o mesmo.

É um ataque kamikaze curioso: o longuíssimo prazo do PT só enxerga um fio de esperança até 2018. Após este período não existe mais o partido. Se o domingo garantiu a força total para adiantar o fim do PT para antes desta data, a movimentação de Lula em Brasília hoje mostrou que a esperança dos próprios petistas hoje não enxerga nada além de aproveitar o atual e claudicante mandato de Dilma.

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Assuntos:
Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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