EXCLUSIVO: Entrevista com Janaína Paschoal, autora do pedido de impeachment de Dilma
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Já se somam 25 pedidos de impeachment da presidente Dilma Rousseff para apreciação na Câmara dos Deputados. Nenhum, no entanto, causou tanto impacto quanto a peça primeiramente redigida pela professora de Direito Penal da USP, a Dra. Janaína Conceição Paschoal.
Se a maior parte dos pedidos anteriores não haviam sido encarados pela narrativa corrente como muito mais do que reclames da oposição, a Dra. Janaína ganhou apoio de uma figura que deu um nó na cabeça de todos os defensores da continuidade do mandato de Dilma Rousseff: o jurista Hélio Bicudo, ex-ministro, ex-deputado e ex-vice-prefeito de São Paulo. Com um detalhe: estes últimos cargos, pelo próprio PT, que ajudara a fundar.
Um simbolismo tão forte não pôde ser ignorado pela esquerda – e nem pela direita. A primeira autora da peça, Dra. Janaína Paschoal, ganhou também o apoio de outro jurista de nome marcado no Brasil: Miguel Reale Jr.
Mais do que tudo, este pedido de impeachment foi a âncora para a oposição começar a busca por votos favoráveis ao impeachment. Com o ruído causado por uma peça que tem tudo para ser o maior pesadelo de Dilma Rousseff nos próximos meses, e apoiada pela oposição e até por ex-petistas, a advogada paulistana vem se tornando conhecida não apenas da Academia, tendo até sido entrevista no programa Roda Viva junto a Hélio Bicudo, em uma das maiores audiências do programa.
A professora livre-docente, canceriana de 41 anos, nos concedeu esta entrevista exclusiva para esclarecer algumas confusões e concepções errôneas que estão sendo veiculadas a respeito da peça que pode significar o segundo impeachment na história brasileira.
Senso Incomum: Há 25 peças pedindo o impeachment na Câmara, mas apenas esta causou um frio na espinha do PT, como mostrou uma capa do Estadão em um sábado. Por quê?
Dra. Janaína Paschoal: Nosso pedido tem muito fundamento jurídico; tomamos o cuidado de narrar os fatos e especificar as normas aplicáveis, de forma bem clara. A denúncia é técnica. Ademais, o fato de o Dr. Hélio conhecer o PT por dentro confere ao pleito maior legitimidade.
De quem a senhora pediu apoio para tal peça?
Há um bom tempo eu estou convencida de que era preciso pedir o impeachment. Porém, ao conversar com algumas pessoas, era completamente desencorajada, ou porque pensavam que não cabia, ou que não era o momento. Alguns juristas até entendiam que era o caso, mas não se sentiam confortáveis para expor seus escritórios, seus clientes. Quando a peça estava pronta, eu a submeti a pessoas de confiança e pedi que fossem bem críticas: a denúncia foi lida por 3 professores de Direito, um juiz, um promotor de Justiça, um procurador da República, um economista, um psicólogo, um padre e 5 advogados. Todos deram alguma sugestão, mas aprovaram. Maria Lúcia Bicudo também leu e, inclusive, colaborou indicando texto da psicóloga Denise Ramos.
Dentre tantas pessoas à oposição, ou mesmo na “direita”, o apoio mais notável a seu pedido foi o de Hélio Bicudo, que foi fundador do PT. O que representa a figura do Dr. Hélio neste pedido?
Eu não decidi pedir o impeachment para aparecer. Se alguém da oposição tivesse feito uma denúncia completa, eu jamais tomaria tal medida. Encontrar Dr. Hélio foi um alento, pois ele me revelou sentimentos e pensamentos que coincidiam muito com os meus. Ele me disse, por exemplo, que estava achando estranho ninguém o procurar para fazer alguma coisa.
A senhora não teme ficar “apagada” ao lado de uma figura tão simbólica?
Ficar apagada ao lado dele é uma honra.
Qual a base jurídica para o impeachment de Dilma Rousseff?
A denúncia tem fulcro no artigo 85 da Constituição Federal e nos artigos 4, 9, 10 e 11 da Lei 1.079/50. Em resumo, se alicerça na falta de probidade administrativa, seja por ter protegido a diretoria da Petrobras, seja por negar os fatos sabidos na época eleitoral, ou por não contabilizar os empréstimos feitos junto a bancos públicos. A denúncia também tem base na afronta ao orçamento, haja vista que muitos dispositivos da lei de responsabilidade fiscal foram desrespeitados. Em especial a proibição de fazer empréstimos de bancos públicos e de fazer empréstimos (de quaisquer bancos) em ano eleitoral. A entrevista que o procurador do TCU, Julio Marcelo Oliveira, deu a BBC, há alguns dias, deixa esse expediente bastante nítido. No aditamento, por valiosa colaboração do Professor Miguel Reale Júnior, acrescentamos os decretos em que a Presidente abriu crédito suplementar, em valores consideráveis, sem autorização do Congresso.
Impeachment sempre causa algum desconforto. Quais os riscos para o país caso este processo se inicie?
Um processo de impeachment é sempre triste, afinal, melhor seria não ter motivo para tanto; mas na medida em que há motivos, pior é o pais deixar de enfrentar. A Constituição Federal prevê esse instrumento e estamos legitimados a usá-lo.
E como fica o Brasil se Dilma Rousseff permanecer no cargo?
Fingir que nada ocorreu afundara ainda mais o Brasil.
O Movimento Brasil Livre e o movimento Vem Pra Rua apoiaram formalmente este pedido. Qual o papel deles?
Logo após a apresentação da denúncia, recebemos o apoio dos Movimentos Anti-Corrupção, por meio da Carla Zambelli. A seguir, veio o MBL, por intermédio do Kim [Kataguiri]. E, por fim, o Vem Pra Rua, pelas mãos do Professor Miguel. Depois que Carla Zambelli me procurou, eu tive a idéia de buscar os outros movimentos. Penso que essa junção de forças é essencial, para conferir maior legitimidade. É muito importante deixar claro que, nesse processo, não houve interferência de partidos políticos.
Quais são os próximos passos que precisam ser realizados para que o impeachment logre êxito? O que é preciso que aconteça na Câmara e no Senado para o impeachment se concretizar?
O presidente da Câmara precisa receber a denúncia e submetê-la à Câmara, para que autorize que seja a Presidente processada; a seguir, o processo se instaura perante o Senado Federal, sob a presidência do presidente do STF. Trata-se de um processo bastante complexo. Mas entendo que o pais tem condições de enfrenta-lo.
Uma nova mentalidade parece estar surgindo no país recentemente, como a chamada “nova direita”. Como a senhora se posiciona a respeito desta movimentação?
Tenho um pouco de preocupação com chavões. Não me apego a rótulos. Nesse processo todo, achei que apanharia muito da esquerda, mas fui mais hostilizada pela direita. Não sei bem como me classificar, penso que as pessoas haveriam de procurar refletir mais individualmente.
Quais foram suas inspirações intelectuais e jurídicas para este pedido?
Ao conhecer Dr. Helio, eu percebi que estávamos, cada um no seu canto, esperando que alguém fizesse aquilo que nós já estávamos convencidos de que deveria ser feito. Percebemos, naquela primeira conversa, que o alguém que aguardávamos éramos nós mesmos. Meu estímulo foi buscar um pais mais correto. Muito embora a Constituição Federal confira a qualquer cidadão a legitimidade para pedir o impeachment, eu senti, como nunca, como foi importante ter estudado Direito. Lutar com uma arma firme, porém não letal.
Com o apoio da oposição social-democrata, quem a senhora julga que sairá fortalecido nas próximas eleições, com ou sem impeachment?
Não sei quem sairá fortalecido desse processo. De tanto fazer essa análise, nossa oposição ficou paralisada. Todos ficam preocupados com 2018. Se o pais continuar nessa toada, não haverá 2018. Dr. Helio, também nesse aspecto, concorda comigo.
Um processo de impugnação da candidatura inteira de Dilma Rousseff (o que destituiria toda a sua chapa, incluindo seu vice, Michel Temer), não seria ainda mais efetivo?
Se não aparecer nada comprometedor com relação ao vice-presidente, entendo que o menos traumático seria ele assumir, pois é assim que prevê a Constituição Federal e eu sou uma grande defensora da Constituição.
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