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Wagner Moura: platitudes, rebanhismo, capslockismo

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Wagner Moura escreveu um artigo para o Zero Hora, um dos jornais mais afiadamente ligados ao PT de todo o país. Juca Kfouri, um dos jornalistas mais afiadamente ligados ao PT, divulgou em seu blog no UOL. Wagner Moura é conhecido pelo Capitão Nascimento, de Tropa de Elite. Quem não assiste Rede Globo e seus filmes globais não faz a mais puta idéia do que mais Wagner Moura fez da vida além disso.

Wagner Moura comenta a extinção do Ministério da Cultura (MinC, que na verdade foi fundido ao Ministério da Educação sob a gestão de Michel Temer, em quem aparentemente Wagner Moura votou). Com os argumentos prontos da esquerda e do PT.

Na mitologia grega, Procrustes era um bandoleiro que queria tornar todas as pessoas iguais, então as atacava e as prendia em uma cama, o famoso leito de Procrustes, cortando pedaços delas quando eram muito grandes ou as esticando em barras de metal quando eram pequenas. É uma lição mitológica poderosíssima sobre o pensamento de esquerda e a busca por “igualdade” entre humanos diferentes. Também se nota que o leito de Procrustes afeta o cérebro de pessoas de esquerda.

Wagner Moura pensa em bloco. A esquerda nunca atingiu uma igualdade econômica, mas produziu pensamentos rigorosamente idênticos em seus acólitos. É como se seus raciocínios saíssem de uma linha de produção fordista. Enquanto a direita, de Maritain a Louis Lavelle, de Eric Voegelin a Olavo de Carvalho, busca a consciência individual e uma noção de si mesmo perante um mundo hostil com um certo e um errado nem sempre claros, a esquerda pensa em manada, confiando no poder da boiada e do modismo. É o que Erik von Kuehnelt-Leddihn chama de rebanhismo.

wagner-moura-marcelo-freixo-psolQual a opinião de Wagner Moura sobre o Ministério da Cultura? A mesma do Juca Kfouri. Qual a opinião de Wagner Moura sobre o aborto? A mesma do Leonardo Sakamoto. Qual a opinião de Wagner Moura sobre as drogas? A mesma do Marcelo Freixo. Qual a opinião de Wagner Moura sobre os ministros do Temer? A mesma da Cynara Menezes. Qual a opinião de Wagner Moura sobre orixás? A mesma do Jean Wyllys. Qual a opinião de Wagner Moura sobre a crise de refugiados na Europa? A mesma do Vladimir Safatle. E assim se estende ao infinito.

O que, afinal, seria do socialismo no Brasil se não fosse a Rede Globo?

Wagner Moura em dia de fúria

Wagner Moura fala em “obscurantismo”. A mesma palavra usada por praticamente todos que criticaram a extinção do Ministério. Não se usou um sinônimo, como medieval, atrasado, fora do tempo, retrogrado, ignorancia, boçalidade, burrice, desconhecimento, estupidez, incompetência. Se o primeiro a comentar fala em “obscurantismo” ou “retrocesso”, todos repetirão a mesma palavra. Para eles, este método de “pensamento” não é nada obscurantista.

Para Wagner Moura, se as leis trabalhistas agora vão redefinir a atual concepção de trabalho escravo, significa que a Fiesp quer escravizar pessoas. O ator global nunca parou para averiguar se as leis atuais são boas para os trabalhadores e protegem de fato o trabalhador contra o trabalho escravo.

Pelas leis atuais, um seringueiro que desbrave a floresta precisa de um leito para dormir para não ser considerado um explorado escravizado. Após andar quilômetros na floresta, nenhum seringueiro está muito disposto a voltar todos os quilômetros só para dormir, ao invés de estender uma rede. É este tipo de coisa que os próprios trabalhadores querem mudar. Para Wagner Moura, basta dizer que a Fiesp, coitada, quer escravizar pessoas. Esquerdistas, em bloco, acreditarão.

black-bloc-viaturaO problema do Brasil para Wagner Moura é Geraldo Alckmin. Sempre em bloco, reclama que o Secretário de Segurança do governador tucano paulista mandou “descer a porrada” nos invasores de escola e nos manifestantes de 2013. Para Wagner Moura, fechar ruas e escolas que os próprios estudantes querem desinvadidas (e eles próprios tiraram os coleguinhas invasores “na porrada”) não é problema. O problema é a retomada do que a maior parte da população quer sem objetivos socialistas alcançados.

Também reclama Moura do novo Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, “ex-advogado de Eduardo Cunha”. O mesmo que já fizeram com Janaína Paschoal: por acaso um advogado se confunde com o seu cliente? O advogado do Lula deve ser preso pelo mensalão? O advogado de Dilma deve sofrer impeachment e ter sua OAB cassada? Apenas quem não pára 1 segundo para pensar em tais questões pode se encantar com este canto de sereia. É algo estúpido. E são logo essas pessoas que acusam os outros de fascistas – defensores daqueles regimes em que os acusados não têm muitos direitos de defesa.

Depois do pensamento em bloco (alguma novidade além das desculpas inventadas pelo primeiro esquerdista, que todos os esquerdistas seguem e repetem irrefletidamente logo atrás?), vem o capslockismo:

Mas claro, a faxina não estaria completa se não acabassem com o Ministério da Cultura, que segundo o genial entendimento dos golpistas, era um covil de artistas comunistas pagos pelo PT para dar opiniões políticas a seu favor (?!!!).

O “argumento” aqui fica por conta das exclamações entre parênteses. Então o Ministério da Cultura não está aboletado de comunistas (Wagner Moura vota no PSOL, o partido que prega socialismo) pagos (o Ministério da Cultura não cuida da Lei Rouanet?) pelo PT (não era o PT que geria o MinC, e agora com o PMDB Moura está dando siricutico?) para dar opiniões políticas a seu favor (Wagner Moura não está dando opiniões políticas a seu favor?).

No caso, vale o mesmo contra-argumento: ?!!!

wagner-moura-dilmaEste tipo de estrilo serve apenas para manter os ânimos dos já convencidos (ou seja, comunistas pagos [ou não] pelo PT para dar opiniões políticas a seu favor) de que não são comunistas pagos (ou não) pelo PT para dar opiniões políticas a seu favor. Por isso, apesar da contradição gritante, coloca um “?!!!” como se a indignação com a forma como é chamado fosse um grande argumento. Faltou só mesmo, além das exclamações repetidas, escrever em caps lock, colocar um monte de vírgulas e espaços fora de ordem, como aparecem em todo comentário de notícia na internet.

De novo, o rebanhismo: olham para a manada, vendo que nem todos os petistas são “artistas”, mas esquecem de sua consciência individual: não é Wagner Moura um comunista que recebe dinheiro que só conseguia receber de nossos bolsos através da gestão petista e, agora, mesmo psolista, lambe as botas do PT?

Se a coisa não vai bem com o espírito de manada em caps lock, o pior é Wagner Moura tentando, chamemos assim após ver seu esforço, “argumentar”. Vide este esforço, de novo com exclamações (algo nos faz crer que Wagner Moura escreveu mesmo em caps lock, o jornal que parece ter corrigido):

Praticamente todos os filmes brasileiros produzidos de 93 para cá foram feitos graças à lei do Audiovisual. Como pensar que isso possa ter sido nocivo para o Brasil?!

Que filme brasileiro é tão imperdível produzido de 93 para cá além de Tropa de Elite, cujo maior mérito é ter o próprio Wagner Moura interpretando um personagem que ele e o diretor Padilha construíram para ser um vilão, e acabou sendo enaltecido pelo público como um grande herói contra as drogas e o discursinho paumolenga de esquerda, nos dando vontade de ver Capitão Nascimento pegando Wagner Moura pelo colarinho, cuspindo em sua cara a la Jean Wyllys e Zé de Abreu e gritando: “Pede pra sair!! Você não é homem, é moleque, tira essa farda preta agora!!”?

cinderela-baiana-carlaperezO que o Ministério da Cultura faz, ou melhor, o que faz qualquer órgão público, é uma compra compulsória. Você não quer assistir a um filme de um diretor mequetrefe? O diretor não precisa se preocupar: basta diluir os gastos do seu filme por toda a população (já contando o lucro que ele pretende ter) e “captar recursos” via aprovação de burocratas ligados ao PT (do contrário, baubau ministério) e voilà. O povo, do Eike Batista à dona Jusecreide da faxina, paga pelo filme que nunca quis ver, e prefere não ver mesmo já tendo pagado.

Como nós, comuns mortais que não temos 1% do capital estocado por Wagner Moura, poderemos viver sem isso?

O ator global prossegue:

Como pensar que o país estará melhor sem a complexidade de um Ministério que cuidava de gerir e difundir todas as manifestações culturais brasileiras aqui e no exterior?

Fora do cinema, o que o Ministério da Cultura já fez? Como estão as “manifestações culturais brasileiras” aqui e no exterior? Temos hoje um Machado de Assis, um Guimarães Rosa, um Augusto dos Anjos, um Aleijadinho, um Gustavo Corção, um Mário Ferreira dos Santos, um Pedro Américo, um Rodolfo Amoedo, um Tobias Barreto? Todas estas manifestações culturais, de valor universal, de profundeza para a humanidade, foram feitas sem Ministério da Cultura.

Após sua criação por José Sarney, o que temos? Dinheiro para turnê de Luan Santana (R$ 4 milhões), para DVD do MC Guimê (meio milhão), turnê do Detonautas (R$ 1 milhão) e exposição sobre Brizola.

Sentiu a diferença? Quem está reclamando é a cultura nacional (o único país do mundo sem a menor chance de um grande Nobel vivo) ou os comunistas aboletados no Ministério da Cultura que recebem dinheiro do PT para dar opiniões políticas a seu favor? Aliás, quantos agraciados no reino da Rouanetolândia são contra o PT? É difícil a Wagner Moura, ele próprio um exemplo do fato, notar a regra?

https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10207499348936763&set=a.2613035960065.2129309.1080009076

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Se faltava argumento para ir contra (ou melhor, rir de) Wagner Moura, ele trata de coroar o bolo cerejosamente no fim:

Acabo de ler que vão acabar também com a TV Brasil.

Ótimo. Pra que cultura?

Vamos fazer uma aposta: pergunte rapidamente a Wagner Moura, longe de assessores ou do Google, se ele sabe em que canal passa a TV Brasil. Se ele sabe o que passa nela. Se ele sabe qual o programa de maior audiência desse importante rincão “cultural” que custa milhões ao bolso do trabalhador brasileiro todo ano. (dica: todos os programas mais assistidos são reprises da TV Cultura, com destaque para Cocoricó; o canal em que passa eu não faço a mais ínfima idéia.)

Este é o pensamento da esquerda em duas frases curtas: defender algo como o mais importante do mundo, torrefazer dinheiro público com isso, e não saber nem para que diabos é aquilo. Afinal, se você fala “cultura”, a manada já sai correndo como se fosse Shakespeare, sem saber que dará de cara com MC Guiné.

Este é o pensamento no leito de Procrustes de Wagner Moura. Este é o máximo que a esquerda consegue pensar, juntando os esforços sinápticos dos maiores “produtores culturais” do país.

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Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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