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Infowar

URGENTE: Não deixem a narrativa “São todos iguais” pegar!

A narrativa de que são todos iguais é tentadora no momento. Mas a corrupção do PT deve ser contada às gerações futuras como particular.

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Aédio, Dilma, Cardozo, Lewandowski

Apesar de a crítica ser clichê, a verdade é que nem quem faz a crítica costuma tomar o puxão de orelha para si: o brasileiro não lê livros, não faz livrarias terem lucro. Um rápido passeio pela seção de política de qualquer livraria mostra uma miríade de livros sobre o impeachment de Dilma – praticamente todos com a mesma narrativa: Dilma Rousseff foi vítima de um golpe, dado pela elite, protagonizado pessoalmente por Eduardo Cunha e Michel Temer, e que o povo foi às ruas chorar pelo fim dos direitos e pelo fim da democracia com a nova ditadura.

É óbvio que estes livros são ainda menos lidos do que a auto-biografia do José Serra, mas o que importa é quem os lê: não pessoas interessadas em uma bela literatura após um dia de trabalho, ou em se informar de algo (já que seu público é composto por pessoas que já concordam com a tese dos livros de antemão), mas sim profissionais da área: professores de história, jornalistas de meia pataca e outros profissionais da arte de criar narrativas para quem ainda não as conhece.

Seu público-alvo real não é circunscrito ao mesmo número que seus leitores, e seu foco, portanto, não é o convencimento imediato de seus leitores, mas o trabalho, sobretudo com desconhecedores do que ocorre: jovens usando tais leituras em sala de aula, que não compreendem as forças em disputa, mal decoram os nomes dos protagonistas, não imaginam que quem lhes conta a narrativa possui uma agenda e se surpreendem ao ler “especialistas” escrevendo em livros – rapidamente passam a acreditar inclusive que são os únicos, os primeiros a ficarem sabendo que Dilma, coitada, sofreu um “golpe”, e que tudo aquilo que os mais velhos lhe ensinaram sobre o fim do principal governo de esquerda no país é falta de “estudar História”.

Quantos livros contando a história do impeachment, aquele convoluto ano de 2016, existem sem serem escritos por rábulas do PT? Por defensores da corrupção e do totalitarismo? Por gente sem querer incutir uma narrativa a ser facilmente deglutida e repetida roboticamente?

Quantos livros já estão escritos, para serem usados em sala de aula, para ensinar às gerações vindouras, que as pedaladas de Dilma Rousseff foram indescritivelmente maiores do que as já nefastas pedaladas anteriores? Que Dilma comprou um lixo tóxico chamado Pasadena a preço de ouro com o dinheiro do povo brasileiro para favorecer seus financiadores? Que a PF e o MP têm em mãos denúncias e mais denúncias de como Dilma sabia de tudo, e impeachment é apenas uma punição mínima para o que geraria cadeia no caso de ser alguém normal?

Que o PT colocou um certo Waldir Maranhão, presidente interino da Câmara, para anular o processo de impeachment pedido pelo povo? Que Dilma Rousseff, e isto foi esquecido pelo Brasil, chegou a indicar Lula como Ministro da Justiça quando ficou claro que ele poderia ser preso a qualquer momento, por um processo que se desenrola lentamente até agora, enquanto qualquer denúncia contra os corruptíssimos Aécio Neves ou Eduardo Cunha chega a veredictos em questão de horas, já que o povo não os apóia, como a militância petista apóia a corrupção e aumento de poder petistas?

Que Lula já avisou que vai mandar prender jornalistas que falem mal dele se for reeleito, usando o Executivo como poder de política que nem o AI-5 permitiu aos presidentes militares, e se enrolou para se explicar a Sérgio Moro? E que este Lula diz que só se encontrou com a diretoria da Petrobras 2 vezes, ao mesmo tempo em que ninguém visitou mais a Petrobras do que ele, e que não sabe explicar documentos do triplex do Guarujá em seu apartamento em São Bernardo do Campo, nem como a cozinha do triplex e do sítio em Atibaia são idênticas e por que o sítio tem pedalinhos com os nomes de seus netos?

E que Lula mandou “baterem nos coxinhas” e “tomarem tanta porrada” que nem iriam se lembrar do que aconteceu? E que dona Marisa só é lembrada pela frase “Enfiem as panelas no cu”? E que Lula pôs a culpa toda do processo do triplex (e provavelmente do sítio) na própria esposa falecida? E que Lula, para perseguir a jurista Janaína Paschoal, perguntou onde estavam as mulheres “de grelo duro” do PT (sic)? Que o MST não cogitou até o momento invadir o sítio de Atibaia, se não é de ninguém?

Nada disso vai nesses livros. A geração millenial, a geração Z, só fica sabendo que foi “um golpe” contra “os trabalhadores” (sic). Já tem uma narrativa feita para ser obedecida e facilmente copiada, sem grande necessidade de sinapses, de pontos obscuros, de descobrir quem são os malvados, de perceber que não há bonzinhos.

Nada melhor para tal caldo cultural do que o atual discurso de que “são todos iguais”. É óbvio que a nascente direita brasileira, contrária à corrupção, não vê quase ninguém com bons olhos, e não deve se encantar por nenhum canto de sereia, sobretudo vindo do esquerdista PSDB, tratando falsamente como “direita” por não ser do bloco sindicalista do PT. Felizmente, o PSDB, com Aécio Neves, vem desgastando sua imagem perante à população.

Contudo, é um perigo nivelar todos os corruptos, que são corruptos, e devem ser tratados como corruptos, como iguais. Há variegados graus de corrupção. Não significa tratar alguém como inocente, num binarismo reducionista e maniqueísta que só favorece o PT: trata-se de contar a história direito para a geração vindoura.

Em qualquer cenário atual, o PT é quem se favorece da idéia de que “são todos corruptos”, sem nenhuma explicação adicional: se são todos corruptos, o PT é só mais do mesmo e pode voltar ao cargo. Não importa que seja mais corrupto do que todos, e que, ao contrário de qualquer outro partido, tenha um projeto de poder estratégico que usa a corrupção como mero meio para ter um poder quase hegemônico sobre a mídia, a academia, os artistas e todas as instituições.

O PSDB foi facilmente vencido em 2002 (tal como seria em 1998, caso Lula já tivesse um Duda Mendonça na manga), enquanto o PT não consegue ser facilmente vencido nem mesmo após sofrer um impeachment (embora todo partido que sofra impeachment na América Latina não volte ao poder). É porque o PSDB é corrupto, safado, ideologicamente nojento e seus nomes, de Serra a Alckmin, de Aécio a Doria, estão todos envolvidos com maracutaias pelas quais já deveriam estar respondendo na Justiça – mas sua corrupção e sua ideologia nefanda não tem um projeto de poder com estratégia como o PT.

Se são todos corruptos, sem explicar quais são os graus de corrupção, são todos iguais. Danem-se os políticos neste momento: estão tentando emplacar a narrativa de que o povo é todo igual em corrupção. Isto não se pode aceitar.

Quem votou no PT, Lula e Dilma, queria Lula e Dilma mandando e desmandando. Acha que corrupção é uma forma de “distribuição de renda” e que todos são inocentes. Quem votou em Aécio Neves, que nem sequer uma militância possui, não queria Aécio Neves: apenas não queria Dilma e o PT. Votou com nojo, tapando o nariz na urna, esperando por um candidato decente, mas era o que tinha. Durante sua campanha inteira, o tratavam quase como uma marionete, tomando críticas a cada vez que não conseguia vencer o PT (dito e feito). O mesmo foi feito quando o deputado Eduardo Cunha, praticamente uma rubrica política local antes de 2015, foi alçado ao estrelato nacional.

O PT tenta agora emplacar a narrativa de que são “culpados” os que votaram em Aécio, como se gostassem dele, e portanto os petistas são todos inocentes e arautos da moral e dos bons costumes públicos. E que têm culpa os que apoiaram o impeachment, já que Michel Temer, em quem apenas quem votou no PT votou, o vice de Dilma, foi flagrado em corrupção.

Ninguém tenta explicar a verdade dos fatos. Muito menos em livros: enquanto a direita se desespera com o presente imediato, esquece que a história, como diz o próprio Lula, é implacável e julgadora – ou melhor, quem conta a história, sobretudo para quem ainda não a entendeu.

Ao invés de gastar todo o tempo em redes sociais, a direita deveria estar revisando toda a política desde 2013, sobretudo o ano de 2016, para explicar o que está acontecendo.

Todos são corruptos, como todos os terroristas são assassinos. Mas entre morrer com rápido tiro de sniper na cabeça, ou ser lentamente torturado, afogado, queimado, desmembrado e por fim degolado à faca fria, não tenham dúvidas de que é melhor pedir pela bala no meio da testa. Isso não torna os dois não-assassinos: apenas não se deve render à narrativa de que todo assassinato, ou toda corrupção, é igual. Quando ela nos afeta, ou afeta a geração futura, lembraremos da dor e já será tarde demais para vencer a narrativa do reducionismo.

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Assuntos:
Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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