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Crime e mídia

Habib’s na pós-verdade: Laudo revela que menino João morreu após uso de lança-perfume

Ao contrário da narrativa sem julgamento na mídia, o laudo da PM revela que o menino João Victor não morreu espancado pelo Habib's. E agora?

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O menino João Victor Souza de Carvalho, 13 anos, apareceu morto diante de uma lanchonete Habib’s na periferia norte de São Paulo, na Vila Nova Cachoeirinha. Câmeras de segurança flagraram o gerente e o supervisor arrastando o menino, que pedia dinheiro no local, aparentemente inconsciente para fora.

Imediatamente, a internet e posteriormente os portais de notícia, que hoje apenas obedecem ao que está pipocando no Twitter e Facebook, uniram os dois fatos para vender uma narrativa fácil: o menino teria sido espancado e morto pelos funcionários do Habib’s.

O motivo do espancamento repentino, sem menção ao fato de que pediram ao menino se retirasse, também seria óbvio: racismo. Pouco se leva em conta que a região da Vila Nova Cachoeirinha facilmente é mais freqüentada por negros do que por brancos. Menos ainda se leva em consideração que os funcionários de um Habib’s da região dificilmente são ricaços (nem com facilidade devem ser, de fato, brancos) prontos a linchar negros por racismo e elitismo.

O Habib’s, boicotado e criticado em atos organizados por “movimentos sociais”, segundo a Carta Capital, “ligados a direitos humanos” (?), surgiu como uma alternativa mais barata para oferecer a nem sempre barata culinária árabe a preços populares. Por seu preço, desbancou diversos concorrentes que pululavam nos anos 90 tentando conquistar espaço com preços mais altos.

Os movimentos sociais “ligados a direitos humanos” exigiram boicote ao Habib’s, por questões de direitos humanos, assentando o bordão “Nenhuma criança a menos” após acusar a rede de racismo. Aparentemente, não haveria outro motivo para tanta grita além de puro humanismo, puro bom mocismo, puro coração bom e amor pelos oprimidos: por que movimentos tão preocupados com direitos humanos iriam acusar uma rede inteira de pratos populares, o Habib’s, de racismo?

O Habib’s se sustentou com a versão de que teria tão somente retirado o menino do local, que, após uma confusão, usou um pedaço de pau para atacar os vidros da lanchonete e os carros dos clientes. O menino teria morrido de forma súbita após a discussão.

Preferindo a versão mais fácil dos primeiros parágrafos, o telefone wireless da internet chegou a postar comentários no Facebook como “Câmeras de segurança flagraram os seguranças do Habib’s espancando o menino negro com pedaços de pau até a morte”, no melhor molde Construção, de Chico Buarque.

Versões com interesse

Graças a tal mentalidade e tal narrativa que já havia pegado no imaginário da camada média da população, ficou mais fácil para o jornalismo também forçar um pouco mais a narrativa, falando do “Menino morto no Habib’s” em chamadas (um erro locativo de fundamental importância para uma reportagem policial), ou, como a Globo News o fez, o menino que morreu dentro de um Habib’s.

Hoje, entretanto, se descobre que o menino João Victor morreu em decorrência de uma parada cardíaca por uso de drogas. O exame toxicológico evidenciou presença de cocaína na concentração de 38 mg/ml, o que indica uso crônico de análogos da droga. Além de cocaína, o laudo do IML revelou que tricloroetileno e clorofórmio, componentes do lança-perfume, causaram a parada cardíaca. João Victor tinha 13 anos, e já era usuário de uma mistura de cocaína e lança-perfume. A notícia joga um banho de água fria em quem correu para acusar a polícia e o Habib’s de racismo e crimes piores, em nome dos direitos humanos.

Na era da infowar e, sobretudo, da netwar, a guerra de narrativas em rede, o telefone wireless produz boatos de proporção não raro continental. Por que os direitos humanos culparam o Habib’s, a rede inteira, e não os autores do SUPOSTO crime, como é de praxe em situações análogas? Por direitos humanos?

Habib's faz propaganda nos protestos pelo impeachment de Dilma Rousseff: "Fome de Mudança".Não custa lembrar, numa das mortais meras coincidências da vida, que o Habib’s foi praticamente a única empresa a se posicionar diante do impeachment de Dilma Rousseff, com a campanha “Fome de Mudança”, que lançou a hashtag #TodoMundoSeAjudando e uma propaganda na TV que começava com um homem gritando no telefone: “Caiu! Caiu! Caiu!” (o preço da esfiha), numa referência óbvia ao então governo cai-não-cai de Dilma Rousseff. Após críticas, digamos, “ligadas a direitos humanos”, o Habib’s ainda lançou a curiosa coxinha de mortadela, unindo os dois ingredientes que eram usados como acusação no país dividido.

Os “movimentos ligados a direitos humanos”, que, obviamente, só se preocupam tão somente com direitos humanos, sem nenhuma agenda por trás, sem nenhum partidarismo e sem nenhuma ideologia do que a pura defesa de direitos de seres humanos, e não devem nunca, sob nenhuma hipótese, de forma nenhuma, serem questionados de sua atuação, e muito menos se deve duvidar de suas reais intenções por detrás de um rótulo tão admirável, ecumênico e samaritano como a defesa de direitos humanos, foram os primeiros a acusar o Habib’s pela morte do menino João Victor.

Quais grupos seriam esses? Um dos primeiros organizadores foi o Mídia Ninja, o grupo de atuação do coletivo Fora do Eixo, que recebe dinheiro diretamente da Open Society, de George Soros, para promover protestos que possam minar o governo local (permitindo assim um abalo na soberania nacional, como é o desejo do bilionário George Soros em prol de um governo unificado). Seu nome deriva de “Narrativas Independentes Jornalismo e Ação”, nome que não junta bem as palavras, mas demonstra uma preocupação em criar “narrativas” que possam causar, afinal, ação e movimentação. Não importa muito o método, muito menos a verdade. Junho de 2013 que o diga.

O Mídia Ninja, para divulgar, antes da divulgação do laudo da polícia, que o Habib’s precisava ser boicotado, por que sem dúvida, sem a menor sombra de dúvida, com toda a certeza do mundo, havia espancado um negro tão somente por ele ser negro, compartilhou um evento de um tal “Perifa Livre”.

Mídia Ninja compartilha Perifa Livre para boicotar o Habib's

Na página do “Perifa Livre” no Facebook, logo de cara, vemos que o grupo tem uma agenda de esquerda e pró-PT, como por uma mera coincidência também o tem o próprio Mídia Ninja, os maiores especialistas no Brasil em criação de narrativas para agitação popular. arece que a Perifa Livre não é tão livre assim.

Perifa Livre, organizadora do boicote contra o Habib's, tem página contra João Doria

Por alguma meríssima coincidência que pouco tem a ver com a preocupação com os direitos do menino João Victor, dá para se apostar all-in, com segurança, que tanto Mídia Ninja quanto Perifa Livre já não gostavam do Habib’s e queriam que ele lograsse perda de lucros antes dos acontecimentos com João Victor.

De acordo com a Carta Capital, “movimentos ligados a direitos humanos” é que teriam organizado o boicote, afirmando coisas como “A esfirra mais barata do Habib’s é a carne negra” (sic). Afinal, por que outra razão que não preocupação com direitos humanos moveria alguém a tentar prejudicar a imagem de toda uma cadeia de restaurantes populares?

Os “movimentos ligados a direitos humanos”, essa curiosa agremiação de palavras, organizou, em nome dos direitos humanos e tão somente deles e mais nada, um “vomitaço” na página do Habib’s, postando o emoticon de vômito em seus posts. É uma versão virtual do modelo de protesto físico da esquerda, que envolve esquerdista introduzindo o dedo no orifício anal de outro esquerdista, esquerdistas introduzindo gelo e garrafas de vinho no próprio orifício anal ou então esquerdistas, no meio da rua, usando o orifício anal para defecar sobre imagens de Jair Bolsonaro.

Também organizaram um protesto fechando dois Habib’s na zona norte, com ampla cobertura por meríssima coincidência e nada mais da revista esquerdista Carta Capital, que contou com a presença da família de João Victor. O pai do garoto admite que foi procurado pela lanchonete, mas “não quis conversa”. Afirmou: “Só quero justiça e que os caras que mataram meu filho sejam presos”. Resta saber se irá procurar agora quem vendia lança-perfume e cocaína para seu filho, com ampla cobertura da Carta Capital e torcida do Mídia Ninja.

Sua mãe foi ainda mais enfática no protesto que fechou duas lojas da rede. Na lanchonete onde seu filho foi morto, a mãe do menino de 13 anos que estava usando cocaína e lança-perfume gritou aos clientes: “Tenham piedade. Vocês estão comendo o sangue do meu filho“ (sic). É um exercício curioso notar como o parágrafo soa quando lido em voz alta, lentamente.

A jornalista esquerdista Hildegard Angel, também por mero amor aos direitos humanos, também apoiou o boicote, postando em seu Twitter: “Que horror a atitude do Habbib’s. Espancarem uma criança frágil provocando sua morte. Corações de ferro. Não passo mais nem na porta. Boicote!” Também Lindbergh Farias, o Lindinho, senador petista condenado duas vezes por improbidade administrativa, tentou condenar o Habib’s sem julgamento.

Protesto pelo menino João Victor e contra o Habib's é organizado pela UJC, União da Juventude Socialista, do PCB

UJC, União da Juventude Comunista, “coletivo”-disfarce do PCB.

Conflito de visões

Com efeito, a notícia de que funcionários do Habib’s são vistos perseguindo um menino e depois o carregando com as calças arriadas ainda deve ser investigada, e num primeiro momento levanta a suspeita de dois indivíduos fortemente suspeitos de terem espancado um garoto até a morte.

Todavia, para se acreditar nessa versão da história, é preciso acreditar num rol de meras coincidências que só podem se juntar por outras meras coincidências, que apenas por mera coincidência são a consubstanciação non plus ultra da narrativa perfeita para a esquerda se livrar de um adversário.

Afinal, duas testemunhas afirmam ter visto o menino ter sido “agredido”, segundo relatam os jornais: uma moradora de rua e um motorista de ônibus. A moradora de rua não foi arrolada por não ter endereço fixo. Mas por que só dois, em uma lanchonete que não estava vazia? O que é que de fato afirmaram? “Agredir” inclui até mesmo pegar o menino e arrastá-lo, o que já está nas câmeras.

Por que as câmeras, por mera coincidência, não filmaram exatamente esse momento? Se houve agressão premeditada por parte dos funcionários do Habib’s, por que o próprio Habib’s chamou a polícia? Como o laudo da PM indica que não foram encontradas marcas de agressão no corpo de João, mas indica com precisão exatamente as drogas que João utilizava e sua família admitiu?

Mais: por que o fato de João Victor ser um usuário rotineiro de compostos derivados da cocaína não foi mencionado pelos movimentos de direitos humanos, tão defensores dos direitos humanos que não podem ser criticados, nem questionados nem duvidados, muito menos que se verifique que movimentos são esses?

Por que ninguém se colocou no lugar dos clientes e funcionários, para refletir se um menino alterado pelo uso de cocaína que foi visto segurando um pedaço de pau (no que, no telefone wireless da boataria virtual, logo foi parar nas mãos… dos funcionários) constitui ou não uma cena que exija uma ação para retirá-lo do local, pela segurança das famílias presentes?

Por fim, caso a investigação policial confirme de uma vez que não houve culpa dos funcionários da loja (e muito menos da rede Habib’s), os movimentos de direitos humanos, tão preocupados tão somente com direitos humanos, irão pedir desculpas, vir a público e montar uma campanha de igual tamanho ou maior afiançando que estavam errados e a rede de lanchonete é inocente?

E os dois funcionários acusados sem julgamento, sem provas de agressão e sem defesa, tratados pela mídia que comprou a história da esquerda como criminosos que terão sua reputação manchada pelo resto da vida, provavelmente tendo dificuldades de encontrar empregos dignos para sempre por boatos ideológicos, mesmo não tendo empregos caros e provavelmente sendo moradores da periferia com todas as dificuldades desta vida? Será que terão alguma forma de compensação ao assassinato de suas reputações por movimentos ligados a direitos humanos tão preocupados com os direitos e nada mais do que os direitos de todos os humanos?

A reputação da rede, que por algum alinhamento de estrelas é por uma conjuntura de coincidências é exatamente aquela que se posicionou contra Dilma, será recolocada no lugar, caso se prove que ela não acobertou crime nenhum e que seus funcionários não espancaram ninguém até a morte?

Ou os interesses dos movimentos sociais ligados a direitos humanos são, a bem da verdade, ligados ao poder de partidos de uma ideologia que não está nem aí para sacrificar funcionários, que nem de longe devem pertencer à elite, no altar do marketing político? Vale realmente qualquer coisa no reino das fake news e da pós-verdade?

Habib’s na pós-verdade

O conceito de pós-verdade foi inventado por jornalistas nos fins de 2016 para explicar por que suas análises sobre tudo o que era importante naquele ano estavam erradas. Segundo eles, eram boatos de internet, as tais fake news, que propagavam com suposto poder muito maior do que conglomerados como Associated Press, CNN e New York Times, notícias falsas que influenciaram nas eleições.

Nenhum estudo nunca provou que qualquer pessoa tenha votado a favor do Brexit ou de Donald Trump ou contra o acordo de paz com as FARC por algum boato (nem mesmo qual boato), mas a tese pegou… e assim a culpa dos erros dessa grande imprensa foi terceirizada para um reino de “pós-verdade”.

A grande verdade (aquela, conservadora e reacionária, anti-pós-modernismo e ainda pré-pós-verdade) é que os boatos vêm… da grande imprensa, que passou ela própria a ser chamada de fake news. Quando jornalistas praticam apenas buzzfeedzação e copiam o que está nas redes, a pós-verdade domina.

https://twitter.com/flaviomorgen/status/839165607710965760

O Habib’s foi o primeiro study case brasileiro, por isso merece atenção. Outros logo virão. O estrago já está feito após sofrer uma campanha de difamação, um assassinato de reputações que nunca ocorreria se a rede de lanchonete não tivesse pisado no calo da esquerda (mesmo para o padrão cerebral e moral rastejantemente mais baixo da esquerda, quantas vezes ela culpou toda uma rede ou uma marca, sangrando funcionários, para acusar alguém dos -ismos da moda?). Pergunte a qualquer vítima de boatos, difamações e calúnias: lucros, imagem e reputação ficam manchados para sempre, mesmo após tudo esclarecido.

Aparentemente, os movimentos ligados a direitos humanos, alavancados por ativistas de partidos que agem disfarçados de “coletivos” (daqueles tão antiquados que não eufemizam e confessam que são comunistas), conseguiu o que queria manchado a imagem do Habib’s. Se procuram mesmo a verdade, se estavam mesmo interessados no bem-estar do menino João Victor, será que algum fará um pingo de campanha, um post de 140 caracteres que seja, afirmando que erraram ao culpar funcionários do Habib’s pela morte, caso se conforme uma ausência de culpa?

De toda forma, quando tudo estiver esclarecido e caso a inocência seja comprovada, o Habib’s está convidado a anunciar neste espaço. A verdade deve prevalecer sobre as tentativas de insuflar massas acerebradas com mentiras, e depois fingir que a culpa é sempre dos outros.

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Assuntos:
Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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