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Socialismo do século XXI

Por que o PT pode se declarar socialista, mas não podemos chamá-lo de socialista?

Há um acordo tácito de que ninguém deve chamar o PT de socialista em público. Em privado, é apenas assim que o partido se auto-define.

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Hugo Chávez e Lula

No 3.º Congresso do PT em São Paulo, em 2007, o Partido dos Trabalhadores lançou suas resoluções para os anos vindouros, que vivemos sob a égide do partido: criar o “socialismo petista”, uma versão via eleitoral da lenta estatização da propriedade privada no Brasil. Tais Resoluções foram postas em prática e o PT, apeado do poder, sente uma necessidade: voltar para as bases e a militância mais histericamente aguerrida que lhe dá suporte, inclusive em confrontos físicos e crimes e destruição menos “colarinho branco”.

O vídeo do Congresso do PT foi retirado do ar naqueles primórdios de Youtube e redes sociais “compartilhadoras”, quando o PT ainda não fazia idéia de que um documento interno seria viralizado para aqueles que não deveriam dele ficar sabendo.

Lula mesmo, antes de passar por um banho de loja por Duda Mendonça, debatia com Collor em 1989 propondo um “socialismo democrático”, em cadeia nacional, no debate eleitoral.

No domingo de 16 de julho, Gleisi Hoffmann, atual presidente do PT, discursou no 23.º Encomtro do Foro de São Paulo, agremiação de partidos políticos socialistas da América Latina, realizado neste ano na Nicarágua. Também chamada de “Narizinho” e possível “Amante” na lista da Odebrecht, Gleisi Hoffmann não apenas reiterou a idéia de um “socialismo petista”, adjetivo que servia para tentar dar uma amenizada no substantivo tão assustador: partiu para a defesa desabrida do socialismo.

Gleisi Hoffmann manifestou o apoio petista ao ditador da Venezuela, Nicolás Maduro e, claro, ao regime totalitário cubano, sem uma eleição há mais de meio século, com perseguições políticas, fome e paredón que já matou provavelmente mais de 100 mil pessoas. Sobre Che Guevara, o assassino homofóbico que proibiu cabelos compridos e chegou a matar “contra-revolucionários” por quererem um pedaço de pão a mais, disse que é um “guerrilheiro heróico” que sofreu “queda em combate”. Além de defender, sem pestanejar, a Revolução Russa, o “socialismo raiz”, de Lenin, Stalin, Kruschev, Andropov e companhia, que deixou 30 milhões de mortos ao mundo:

Aproveitamos para manifestar nosso irrestrito apoio e solidariedade aos companheiros do Partido Comunista Cubano e ao povo de Cuba diante do retrocesso imposto pela nova administração do governo estadunidense em relação aos acordos alcançados com a administração Obama e a manutenção do criminoso bloqueio econômico.

Este ano comemoramos o centenário da Revolução Russa de 1917 e também o cinquencentenário da queda em combate e o assassinato posterior do guerrilheiro heróico, o comandante Ernesto Che Guevara, a quem recordamos para que tenhamos sempre presente a necessidade da transformação social de nossos países.

Gleisi também saudou as vitórias eleitorais com urnas eletrônicas dos bolivarianos Daniel Ortega, na própria Nicarágua, e de Lenin Moreno, no Equador.

https://www.youtube.com/watch?v=F4w2gXGlvbI

Sobre a Venezuela, a pedra de toque dos socialistas modernos, Gleisi Hoffmann ainda declarou:

“O PT manifesta seu apoio e solidariedade ao governo do PSUV, seus aliados e ao presidente Nicolás Maduro frente à violenta ofensiva da direita contra o governo da Venezuela e condenamos o recente ataque terrorista contra a Corte Suprema. Temos a expectativa que a Assembleia Constituinte possa contribuir para uma consolidação cada vez maior da revolução bolivariana e que as divergências políticas se resolvam de forma pacífica.”

O Foro de São Paulo foi fundado por parceiros como José Dirceu, Lula e Fidel Castro, como o maior think tank do mundo após a crise do socialismo com a queda do Muro de Berlim. Reuniu partidos políticos socialistas de diversos matizes com um único objetivo: a construção da chamada “Pátria Grande”, uma América Latina inteira socialista, com submissão ao governo central em Cuba, nas mãos da família Castro.

José Dirceu já admitiu “ter sido” agente do serviço secreto cubano, como se alguém pudesse deixar de ser “ex-agente” de tal grau de inteligência (a única forma de dar baixa é via cemitério). Era o braço direito de Lula, e acabaria sendo o seu sucessor natural, não tivesse caído no escândalo do mensalão.

Mesmo assim, parece a norma obrigatória em toda a imprensa, Academia, redes, mídia e análises políticas tratar o PT como um partido de esquerda mais light, que rejeita o socialismo. Como se até, talvez, seu objetivo fosse o capitalismo, ainda que mais “social”, o que petista nenhum no Universo declararia como seu objetivo de vida, pelo qual mataria e morreria.

Apesar de petistas declararem, fosse em 1990, seja em 2017, que o partido é socialista, que quer um socialismo próprio, se aliar a ditadores totalitários brutais do jaez de Fidel Castro e Nicolás Maduro, há um acordo tácito no país inteiro para dizer que o PT não é exatamente socialista. É apenas “de esquerda”, de maneira genérica, como se isso fosse suficiente para definir qual o plano, objetivo e modelo político de alguém. Sempre o genérico da abstração, nunca a especificidade da realidade concreta.

O PT é aliado de Nicolás Maduro, de Fidel Castro, de Evo Morales. No eixo internacional, a política sul-sul do PT tinha como aliados ditadores brutais como Mahmoud Ahmadinejad, o socialista do Zimbábue Robert Mugabe (que expulsou à bala todos os brancos das fazendas numa reforma agrária que deixou a população comendo terra), de Muammar Kadafi (que Lula chamou de “meu amigo, meu irmão, meu líder” [sic]), além de dar uma embaixada para o Hamas com túnel expresso para o Congresso em Brasília e, por que não, uma embaixada brasileira na Coréia do Norte.

Não há nada no PT que indique o partido como não-socialista. Seu objetivo em Congressos internos foi a América Latina socialista, a submissão ao socialismo castrista Cuba, o apoio ao totalitarismo bolivariano da Venezuela de Chávez e Maduro.

Lula põe a mão no sacoNão é preciso encontrar os petistas mais aguerridos, os esquisitões que sentam no canto, não falam nada na reunião e depois escrevem cadernos internos de textos revoltados. Basta ver Gleisi Hoffmann, a presidente do partido, discursando. Ou José Dirceu, que quase foi presidente do Brasil. Ou, bem, qualquer petista, se não estiver dudamendonçado e preparado para a propaganda eleitoral para ganhar votos do povão.

Mas falar a verdade, descrever o que se vê, sem emitir opinião nenhuma no processo, é considerado extremismo hoje. Basta dizer que o petista disse o que acabou de dizer para ser rotulado de maluco, de extrema-direita, de exagerado.

É a confusão lingüística planejada, o tapume que se coloca sobre o real que nos impede de dizer que o vermelho é vermelho. Um homem pode se auto-declarar mulher para freqüentar o banheiro feminino, mas mesmo que o PT se auto-declare socialista, como a palavra pega mal entre pessoas normais, uma matilha de jornalistas puxa-sacos, uma farândola de professores abusando de sua autoridade artificial, uma camorra de intelectuais de 140 caracteres vai jurar que somos exagerados, paranóicos, malucos, psicóticos, extremistas. Tão somente por dizer que o PT disse o que ele disse, em auto-declaração clara.

Dizer que o PT é um partido socialista não é opinião, é fato. É conhecer o PT. Por que não podemos dizer que o PT é exatamente o que o PT diz ser?

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Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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