Feminismo e estupro: quem, onde, como, por que, quando?
O feminismo denuncia o estupro, uma realidade terrível. Mas o que diminuirá estupros não serão cartazes e textões: serão leis concretas.
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Hoje estava andando pela Vila Madalena (longa história) e dei de cara com um cartaz que se tornou onipresente em meus pensamentos durante todo o caminho. Era um cartaz feminista dizendo que a cada 11 minutos, uma mulher é estuprada no Brasil.
Mesmo para quem é desconfiado de ativismos de massa com discurso muito marqueteiro como o feminismo, o número de estupros impressiona. E assusta.
Assusta ainda mais por um detalhe: por mais que eu não saiba a fonte de tal pesquisa (e não pesquisei), é fácil crer que o número é verdadeiro. O Brasil é muito grande e, sobretudo, muito violento. Um país com 64 mil homicídios por ano certamente não teria homicídios sozinhos: teria todos os crimes associados a ele ali do lado: roubos, estupros, seqüestros etc.
E, diferentemente de países com elevadíssimo padrão de renda e qualidade de vida como a Escandinávia que têm como preocupação o politicamente correto, aqui o estupro é estupro mesmo, é violência, faca apontada, porrada dolorosa, todo um ritual antes da consumação do ato.
Para quem mora em grandes centros urbanos, pode parecer uma realidade estranha. Para quem conhece o Brasil profundo, para quem sabe como é a vida nas periferias, nos morros (aquilo que hoje chamam de “comunidade”) e nas zonas onde a civilização, a moral e a lei (a lei policial, a lei que chega, a lei que pode chutar a porta e, justamente por tal ameaça, mantém a paz), a realidade é bem outra.
Mas o que incomoda mesmo não é brincar de numerologia. Feministas não costumam ser de Exatas, nem eu sou, e a estatística pode falhar demais.
Em primeiro lugar, o que incomoda é a separação total de crimes. A mania de falar em “cultura de estupro” como se fosse um crime integralmente sem relação com roubo, seqüestro, assassinato etc. Não há estatística no mundo que mostre aumento de estupro sem aumento dos outros crimes, nem queda. É como crer que seqüestros possam aumentar, sem assassinatos seguirem morro acima.
A crença feminista na separação do estupro gera uma bizarrice. Uma grita tão forte por um crime tão real, sem falar de tudo o que o permite. Ao invés de se criticar criminosos e o que os move – hedonismo, uso de atalhos na vida, conquista pela força, imoralidade, prazer acima de valores –, critica-se justamente os inocentes que podem ser tão vítimas de estupro quanto ela.
Não se vê blogs feministas criticando os homicídios brasileiros, a altíssima criminalidade: para elas, o assalto, o mais violento que seja, é culpa da desigualdade, da pobreza, de algum dado estatístico recortado de seu contexto. Já o estupro funciona por outra regra: a culpa é apenas do criminoso, o estuprador, que deve refrear seu desejo de ter algo de outrém e não usar a força para ter atalhos a seu desejo e seu prazer às custas do sofrimento alheio.
O que escapa completamente ao feminismo na manobra é que justamente o que exigem do estuprador é o que, por exemplo, a direita, os conservadores, os reacionários tão odiados já exigem do estuprador e também de todos os outros criminosos.
Isto é o erro de análise. Um olhar errado. Há ainda outro de execução.
Quando se toma ciência de uma estatística chocante, e sabendo que os crimes de estupro brasileiro são reais – não há mulher não-feminista, e inclusive homens, que não saibam do perigo que correm –, ao invés de exigir providências concretas, o que se faz é justamente adotar o discurso de onde tais crimes são irreais, como no politicamente correto nórdico?
Por acaso estão pedindo alguma coisa séria contra o estupro? Algum destes cartazes vem com um * para se ler as letras miúdas: “A propósito, queremos penas duras para estupradores”? Algum foi visto numa passeata pedindo redução da maioridade penal em caso de estupro? Algo de concreto contra estupros foi proposto após apresentar a estatística, como revogar o estatuto do desarmamento para mulheres poderem ter uma arma, e não um cartaz e pedidos de “conscientização de estupradores” (sic) para não serem estupradas?
Nada, nothing, niente, rien, nichts. Parece que algo gravíssimo não é motivo para uma solução seriíssima: é muito mais um ensejo para pessoas que vivem protegidas na civilização e afastadas do amoralismo hedonista da lei do mais forte que tanto pregam se fazerem de vítimas da sociedade com performances e textões de Facebook. Não é uma questão Direito Penal: parece tão somente um divertissement de Artes Performáticas.
Infelizmente, a realidade precisa menos de indignações descontextualizadas e gritas contra vilões abstratos e nebulosos como “cultura de estupro” através de Artes Performáticas e mais de Direito Penal contra criminosos reais. As vítimas concretas que o digam.
Pela confusão mental em que feministas se metem ao falar tanto do seu principal assunto, que entendem menos do que quem fala muito menos dele, exigir algo concreto contra estupros seria, justamente, ser da “cultura de estupro” e promover estupros, que provavelmente só serão resolvidos com seus textões e cartazes.
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