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Ideologia

Datafolha estupra a verdade

A pesquisa do Datafolha sobre estupro para confirmar o discurso feminista abusa da linguagem popular para uma causa de progressistas ricos.

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Hashtag #nãomereçoserestuprada, popularizada após pesquisa Datafolha

O Datafolha, instituto de pesquisa do grupo Folha, deve ser a entidade menos confiável no Brasil. É o índice de pesquisa estatística com um modelo “científico” de estro próprio, que ninguém mais no mundo utiliza.

Seus resultados, com um método contando “público flutuante”, sejam na Parada Gay ou nas manifestações pelo impeachment, já chegaram a calcular 4 milhões de diferença da PM, gerando sempre uma guerra de números em seu noticiário.

Segundo o Datafolha, eu não estou aquiCuriosamente, os erros do Datafolha não são de todo aleatórios: sempre acreditam em bons números para causas de esquerda, e péssimos números para qualquer causa em dissonância com a linha editorial defendida pela Folha. Foi o Datafolha que acreditou poder “contar” quantas pessoas “iam e vinham” na penúltima manifestação pelo impeachment de Dilma Rousseff, provavelmente a maior manifestação de rua da história mundial, calculando que apenas 210 mil pessoas compareceram ao protesto.

Quem quer saber tanto, inclusive quantas pessoas transitaram de um quarteirão para outro, parece acabar sabendo menos do que qualquer um que tenha olhos para ver.

Como resultado, apenas veículos mais petistas do que Lula saíram “festejando” o número, para encabeçar a narrativa de que o povo não apóia o impeachment: seria apenas um plano pessoal de Cunha e Temer, estes dois cidadãos tão mancomunados e amigos.

Para o Datafolha e a esquerda, pessoas normais, como as que habitam o Brasil ocupando lugar no espaço, não existem.

O Datafolha não erra aleatoriamente: erra com método. Sempre para a esquerda. Quando o Datafolha afirma que 62% da população já reprovava Dilma em seu terceiro mês de segundo mandato (logo após a descoberta do petrolão e a crise instalada por suas pedaladas) e quando afirma que 68% do povo quer o impeachment e que Dilma tem 10% de aprovação, pode-se ter certeza de que o número está errado: para menos. O número real certamente é bem maior. Basta ver que o instituto também apostou que o impeachment não passaria na Câmara. E como os seus erros nas pesquisas eleitorais sempre inflaram números petistas e sempre erraram os da oposição para baixo.

Manchete pega-trouxa

Mais uma vez, o Datafolha inventa uma manchete sensacionalista – e repetindo o mesmo tema, não mente com números, mas com palavras.

Hashtag #naomerecoserestupradaDe acordo com a última manchete modelo “aponta pesquisa” do grupo, feita sob encomenda para engabelar quem se impressiona com manchetes sem ler, ao invés daqueles que duvidam do que leram, pensam no que está errado e pesquisam a respeito (se a passagem da primeira categoria para a segunda elimina 99% de quem teve contato com a informação, os números até a última categoria são datafolhamente ínfimos em relação ao primeiro montante), em negrito, Um terço dos brasileiros culpa mulheres por estupros sofridos.

By the pricking of my thumbs, Something wicked this way comes. Não há de se levantar os olhos em suspicácia de uma pesquisa cujo tema é justamente um bordão? E logo o jargão repetido roboticamente pela nova modinha da esquerda, depois de seu fracasso público retumbante como gestora do país? Não há mesmo nada a se suspeitar, algo que pareça estranho só de ler a manchete?

Logo após a manchete da Folha, lê-se:

“A mulher que usa roupas provocativas não pode reclamar se for estuprada.”

Logo após a frase, o texto começa: “A frase, capaz de provocar calafrios, é alvo de concordância de um a cada três brasileiros…”. Alguma pesquisa estatística já foi noticiada pela Folha assim, começando citando a pergunta feita? Não há um abuso do que, na retórica clássica, se chama de capitatio benevolentiæ, a arte de atingir o sentimento da platéia, causando enebriamento antes da exposição racional? Por que pesquisa, afinal, foi feita justamente com o clichê da modinha feminista atual?

Datafolha e feminismo escondem ELITISMO

Qualquer análise lingüística a mais rasa da frase que gera a manchete revela um manancial de confusão. A frase foi escolhida a dedo entre frases feitas (tal como “quem tá na chuva é pra se molhar” ou “cachorro mordido por cobra tem medo de lingüiça”), cujo sentido não é extraído rigorosamente das palavras que formam a frase. A pragmática, ramo da lingüística que estuda a língua em uso, conhece muito bem a artimanha: sabe, inclusive, que não há de fato uma lingüiça na frase de exemplo, mas seu sentido é extraído do todo, não de palavras isoladas, que podem ser decompostas.

Hashtag #naomerecoserestupradaNa frase do Datafolha, o que significa “não pode reclamar”? Que a mulher estuprada é “culpada”, como tenta fazer crer o jornal? Dá para notar que, instintivamente, o pesquisador escolheu justamente aquela frase que, no linguajar mais popular, rés-do-chão, povão mesmo, quase toda a população usa, da boca pra fora, com um sentido diferente do dicionarizado. É a diferença entre lato sensu stricto sensu.

O Datafolha, para enaltecer o discurso feminista, tem de usar do mesmo artifício do feminismo: criticar a fala do povão, como se o que diz o seu Severino da construção e a dona Jusecreide da faxina refletisse um profundo tratado moral, uma axiologia arraigada e, mais do que tudo, um desejo de transformar palavras em letra da lei.

Como se quando a dona Jusecreide dissesse para sua filha Josefina “Não vá sair com essa roupa tão curta, depois reclama de estupro!” significasse que a dona Jusecreide acredita que sua filha não pode reclamar em caso de estupro, que a dona Jusecreide lutaria na Justiça pela inocência do estuprador da sua filha, que a dona Jusecreide tem como valor moral que sua filha foi culpada de ser estuprada, talvez até merecendo o mesmo modelo de punição muçulmana para mulheres estupradas (pela religião da paz, a mulher estuprada, se não tiver 5 testemunhas [!] a seu favor, ainda é punida com chicotadas pelo sexo fora do casamento).

Alguém acredita mesmo nessa hipótese estúpida?

Que tal uma pesquisa entre aqueles que concordam com a frase “Mulher que não faz regime não pode reclamar de ficar encalhada” e pesquisar na periferia, no sertão e nas favelas se há uma profunda “gordofobia” que “provoca arrepios” (sic) no Brasil?

#EuNãoMereçoSerEstuprada

É, de fato, um elitismo o mais vil: abusar da linguagem popularesca, atribuindo-lhe artificialmente significados que inexistem no original, para “confirmar” a tese de feministas universitárias riquinhas no Twitter, que vão fazer hashtags, ganhar seu dia de modelo com fotos sensuais com placas onde se lê #EuNãoMereçoSerEstuprada e se tornarem a fêmea-alfa de seu grupinho de amigas e passar os próximos anos jurando que “está provado” que a sociedade brasileira é “machista” e “todo homem é um estuprador em potencial” e “precisamos de feminismo” porque o Datafolha (o Datafolha!) diz.

Aguarde o comportamento de massa nos próximos dias no Facebook da sua amiga universitária de Humanas mais perto de você.

Quem confirma é o próprio Datafolha: sem explicar (sem nem notar) o óbvio, a Folha afirma que o “índice de concordância com a frase” (releia: o “índice de concordância com a frase”! que tal inaugurar o ICCF?) sobe entre quem mora em cidades diminutas, com menos de 50 mil habitantes (37%), pessoas com apenas o ensino fundamental completo (41%) e com mais de 60 anos (44%). Por que será?

O ICCF é menor entre aqueles com até 34 anos (23%) e com universitário completo (16%). Ou seja: quem tem um pouco mais de estudo gramatical percebe que a frase está mal feita e vai pegar mal.

Mesmo que seu sentido popular, que depende do uso e contexto, seja algo com o qual todo ser racional vá concordar, inclusive o inventor da pesquisa (que, ainda que instintivamente, percebeu exatamente isso para escolher a frase): há justamente mais chance de ser estuprada com roupas curtas, portanto mulheres devem, exatamente por isso, tomarem cuidado, porque há homens ruins porta afora (e mesmo porta adentro).

Feminismo: modinha de menina rica

Sem notar que sua própria pesquisinha foi encomendada e cuidadosamente escandida para se alinhar à roupagem do feminismo, o Datafolha deixa entrever, em seu recorte, que está abusando da linguagem do povo menos instruído para concluir que é um perigo mortal para uma mulher ver um homem por perto, pois um terço deles (inclusive 30% das mulheres, ora pois!) “culpa a vítima pela violência sexual sofrida”, como conclui forçando a amizade a Folha.

Não notar (ou ignorar) o óbvio é o que permite que a Folha emende ainda frases como:

“Trata-se de um déficit civilizatório do Brasil ter tantas pessoas que vinculam a vitimização da mulher a uma conduta moral”, diz Renato Sérgio de Lima, vice-presidente da entidade.

À despeito de a “conduta moral” (qualquer uma no mundo) existir precisamente para se evitar a barbárie e o crime, naquilo que filosoficamente pode ser expresso pelo grego antigo “dãããã”, o sr. Renato Sérgio de Lima, o Datafolha e toda a Folha parecem seres incapazes de juntar lé com cré para perceber que sua pesquisa também diz que 91% dos entrevistados concordam que é possível ensinar homens a não estuprar. 91% dos entrevistados. Então, cadê a “vitimização da mulher a uma conduta moral”, se os mesmos que respondem isso também crêem numa frase igualmente mal-construída como “É possível ensinar meninos a não estuprar”, o que, a rigor, é a base do Direito, do cristianismo, de qualquer prerrogativa moral em vigor no mundo pós-tribal, à exceção do islamismo?

Hashtag #naomerecoserestupradaA propósito, 46% dos homens também têm medo de ser estuprados. Nenhum comentário sensacionalista da Folha a respeito. Quanto a 53% dos entrevistados concordarem que “a lei brasileira protege estupradores”, idem: é uma mostra de que o mesmo povo que cai no ICCF também acha que é preciso punir mais estupradores. E tome projeto de Jair Bolsonaro contra o coitadismo do PSOL na caçoleta.

Será que os gênios da análise social, do pobrismo e do discurso progressista e propaganda feminista do Datafolha têm coragem de fazer o mesmo tipo de recorte para as eleições?

Nessas horas, tudo o que podemos lembrar de leituras de manchetes da Folha sobre pobres e ricos se inverte: o chocante são manchetes como “Candidato que não é petista tem mais votos entre a elite branca”, sem notar que a elite é elite justamente pelo mesmo curso superior que faz com que alguns não caiam na barbeiragem de uma frase que diz algo universal, mas que separa os ricos do ensino superior e hashtag no Twitter e leitorxs de blogs feministas dos pobres que repetem um dito popular sem atentar para seus detalhes e as conseqüências aparentes.

Há uma pesquisa que o Datafolha deveria fazer: qual o percentual da população brasileira que acredita no Datafolha? Esquerda ou direita, ricos ou pobres, instruídos ou peões, correríamos o risco de conseguir a primeira pesquisa com resultado unânime no Brasil.

Hashtag #naomerecoserestupradaBasta lembrar de como “institutos de pesquisa” foram citados na Lava-Jato para produzir pesquisas pró-PT, e a Folha, com seu vezo de copiar quase ipsis litteris os textos do Estadão, omitiu justamente esta passagem. Terá sido o Datafolha? Something is rotten in the state of Denmark.

Para não cair na logorréia da militância massificada, veja também Estupro, cultura e culpa – Vamos desmontar as farsas, compilado gigantesco de tal narrativa montada pelo Datalha por Felipe Moura Brasil. Não foi a primeira vez que o Datafolha tenta emplacar essa: certamente não será a última que irá engabelar justamente quem jura que não confia na mídia.

Ou também pode abraçar os petistas que caíram na Lava Jato e irem presos. Será que estupradores são enaltecidos justamente entre criminosos como tenta fazer crer o Datafolha?

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Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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