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Você votaria num candidato que diz: “Se me deixarem solto…”?

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O ex-presidente Lula se vê cada vez mais próximo de uma temporada na Papuda. Sua declaração mais recente, todavia, deixa um aroma embotado no ar. Como as redes sociais já sabem, Lula afirmou: “A partir de agora, se me prenderem, eu viro herói. Se me matarem, viro mártir. E, se me deixarem solto, viro presidente de novo”.

É uma aposta que pode funcionar: entre sua militância, formada nos estertores da ditadura e dissociando-se do antigo Partido Comunista, quanto mais “perseguido”, melhor. Até mesmo com o PT no poder há 13 anos, com o STF tendo 8 de 11 ministros indicados pelo PT, até mesmo com o Congresso comprado para aceitar leis vindo do Executivo (flagrante autoritarismo) no mensalão, o discurso hoje é voltado para tornar Lula um “preso político”.

Apesar do discurso triunfalista, que tira o melhor das piores situações (o que é chamado de “inteligência política” por tantos), aliando curiosamente o vitimismo ao heroísmo de “perseguido”, resta saber como o país e seu eleitorado que não é militância reagirá a tal vozearia.

Afinal, era o partido que se apresentava como “o partido da ética” na década de 90, o que hoje provoca uma doce ironia, com blogueiros e acólitos afirmando que a palavra “corrupção” é praticamente o que chamavam antes de “preocupação burguesa”.

Como a população comum vai aceitar um candidato a presidente que hoje tem de iniciar seus discursos com uma introdução como “Se me deixarem solto…”?

Claro que é uma bazófia de Lula em tempos de desespero. Alguns políticos ganham muito com bazófias e frases destemperadas. Basta pensar em Donald Trump. E também atiça radicais: radicais sempre gostam de dedo na cara, palavrões, brutalidade e falar cuspindo.

Contudo, como será o voto da dona Creide da faxina, que devolveu R$ 10 mil que achou no metrô, ao ouvir que seu candidato, aquele “dos pobres” e “dos trabalhadores”, ao saber que “a alma mais honesta do país” está presa? Aliás, o que Lula pensa a respeito disto é chocante, como mostra antigo vídeo de Lula presidente, dizendo que roubar dinheiro não é desonestidade.

Políticos, afinal, também são arquétipos, paradigmas. Não é apenas a ideologia e seus discursos inflamados que definem votos no imaginário coletivo: sua própria postura deve servir de modelo para a população. E parece que o modelo Lula só agrada a militância, cujos votos já são dados por imposição ideológica.

Seu eleitorado geralmente se divide entre acadêmicos ideológicos e a população carente e pouco informada. Os primeiros adoraram o PT 89 velho de guerra. Os segundos, incrivelmente mais honestos e conhecedores da dureza da realidade do que os primeiros, irão aderir à causa com a mesma força?

O PT até hoje só enfrentou uma oposição mais fácil de vencer do que bebês no UFC, contando com a conivência da imprensa e da classe falante – mas, para manter o tom de perseguido injustiçado, sempre enxergando uma “mídia golpista” e “fascistas” embaixo da cama.

Contudo, se sua oposição no Legislativo e nas disputas pelo Executivo era pífia, os órgãos técnicos do Estado, como a Polícia Federal e o Ministério Público, parecem entender muito menos a linguagem da ideologia do que, por exemplo, a compra de votos e as indicações para o STF.

Como o país reagirá a um político que precisa se fazer de forte ao ser preso – e contando com a ignorância do povo para tal?

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Assuntos:
Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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