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A esperança e a fraqueza do PT: confundir militância com povo

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CTB democracia ditadura nunca mais

Todas as semanas do último mandato de Dilma Rousseff foram a pior semana da história do PT para os petistas, sendo pior do que a anterior numa bola de neve assustadora.

Essa não é exceção, e nem promete esperanças caso finalmente tudo termine e o PT admita a derrota perante o impeachment: ao perder o mandato, Dilma perde o foro privilegiado para ser investigada para mais uma série de crimes pelos quais é investigada, entrega mais 5 ministros nas mãos de Sérgio Moro e, de quebra, elimina a chance de nomear Lula ministro para que ele não vá preso.

O PT conta cada vez mais com uma arma, um trunfo, uma mixórdia que parece crível para alguns, mas como um jogo de batata quente, pode selar o fim da narrativa de auto-justificação que o partido construiu nas últimas três décadas: confundir sua própria militância com o que chama de “povo”.

A tática já é conhecida dos brasileiros, inclusive dos petistas, que nunca ousaram refutar o famoso fator pão com mortadela, oferecido a pessoas de baixa renda e instrução para se fingirem de militantes e defensores do PT – os acólitos do PT apenas ignoram o fato, tergiversam, para, após a poeira baixar, afirmar que “o povo” está em peso nas ruas para defender Lula, Dilma et caterva.

A briga para ver quem tem o maior número, coadunada com a chamada “defesa da democracia” e “respeito às urnas”, sofreu um grave revés desde 13 de março, quando a maior manifestação pública da história da América Latina deixou até mesmo o Datafolha atarantado, fazendo com que o PT, que já teve o monopólio das ruas, apenas arregimentasse cerca de 5% do total de pessoas contrárias a Lula, Dilma e o PT. Isso com mortadela.

As notícias dessa semana dão conta do resultado dessa tática de tentar amalgamar dois conceitos distintos e praticamente opostos: a militância do partido baseado em sindicalismo e suas vertentes e “movimentos sociais”, como CUT, MST, UNE e outros coletivos políticos organizados, e o povo, gente normal, batalhadora do dia a dia, que não usa uniforme de partido, não veste apenas vermelho e odeia corrupção, ao invés de relativizá-la.

Lemos, por exemplo, que a polícia aborda ônibus com bolivianos que vieram para o Brasil protestar contra impeachment de Dilma, no Jornal Opção. A notícia seria hilária, não fosse a tragédia da manipulação de pessoas carentes para serem usadas como peões de infantaria, pelo dinheiro usado (dificilmente se pode crer que seja legal) e pela manipulação totalitária, para quem tanto afirma que a mídia é “golpista” e até “de direita”:

Três ônibus foram abordados pela polícia na quinta-feira, 14, na Rua 9, na Praça do Sol, no Setor Oeste, porque estavam atrapalhando o trânsito (ele estariam no Hotel La Residente). Pôde-se perceber que estavam lotados de bolivianos.

Se já é estranho ver a movimentação entre países bolivarianos, aqueles que servem ao Foro de São Paulo, o eixo de ditaduras socialistas satélites do totalitarismo dos irmãos Castro em Cuba, a coisa se complica ainda mais quando se lê sobre o uso de empresas estatais para fazer peso pró-PT. Nada além do esperado para o sindicalismo aparelhador do Estado, que tenta confundir o Estado com o Partido e seus caudatários com o povo.

Também lemos: Ônibus da Petrobrás transporta manifestantes do PT e da CUT em Brasília, no Diário do Poder. O contraste entre a militância e o povo é tão gritante que o povo é que denuncia a militância:

Moradores da quadra 712 Norte, em Brasília, denunciam o movimento de ônibus de órgãos púbicos, como da estatal Petrobras, transportando “manifestantes” favoráveis ao governo, em pousadas localizadas naquela região, segundo denúncia dos próprios moradores.

Na maior parte dos casos, são sindicalistas que chegaram a Brasília para participar da concentração de domingo, na Esplanada dos Ministérios. Os moradores fotografaram no começo da madrugada os ônibus estacionados nas proximidades de pousada usada frequentemente por militantes da CUT e do PT quando chegam a Brasília para participar de atos como o de domingo.

Um dos veículos é identificado como “Unidade Móvel de Treinamento” da Petrobras. Há também fotos de outros dois ônibus estacionados nas proximidades da pousa, após deixarem ali os militantes.

Isto quando não lembramos de notícias mais antigas, como as dos protestos de 2014, que teve até haitianos que não falavam português e não sabiam pelo que protestavam com camisetas da CUT (que “povo” você conhece que tem uma camiseta da CUT no armário?) e só foram aos protestos em troca de R$ 35. Alguns até acreditavam que o protesto era para derrubar a Dilma.

Até um carro de transporte da Secretaria Municipal de Saúde de Guarulhos, ao invés de estar atendendo pacientes e doentes (o povo), estava carregando manifestantes com uniforme da CUT para a Avenida Paulista – o que, num país sério, ao invés de ser comentado apenas num pequeno site, deveria por si ensejar mais do que um impeachment.

https://www.youtube.com/watch?v=PQe4wyUZpdw

Esta mania de amalgamar conceitos que só parecem ter uma relação analógica, tratando-os como sinônimos (povo e militância, Partido e Estado, vencer eleições e democracia, investigação e perseguição, estatal e do povo, impeachment e golpe) foi o que manteve o apelo do PT por décadas a fio. E é a última esperança para o partido se safar pós-impeachment.

Ao contrário do que se pensa, o que os maiores filósofos da humanidade, como Aristóteles, Marco Aurélio, Cícero, Sêneca et tutti quanti sempre souberam é que as vitórias políticas se dão por narrativas. O estudo de narrativas ainda é quase inexistente no Brasil, mas foi com narrativas que Lula e seu partido amealharam tanto poder no Brasil.

E tome-se propagandas de Duda Mendonça e João Santana focando-se em temas como “operário que saiu da extrema miséria”, “partido dos pobres que, se alguém não gosta, é por ser rico que odeia ver pobre com dinheiro” ou “mídia golpista” (esta cunhada por Marilena Chaui). Abandonou-se os bordões das derrotas nos anos 90, como “a luta continua, companheiros!” (Duda explicou para Lula que luta lembra bagunça, desordem, crime) e apareceu o Lulinha paz-e-amor de 2002.

Narrativas valem mais até do que a lei – é uma narrativa de “golpe em curso” que impede que simplesmente se aplique a lei, pois até cumpri-la, na situação em que o país está graças ao PT, é iniciar uma possível convulsão social que exige o adiamento de prisões que já teriam sido efetivadas, se fossem comuns mortais sendo julgados, e não Lula e Dilma. É exatamente essa narrativa que está sendo comprada com mortadela para segurar a letra da lei, a Polícia Federal, o Ministério Público, Sérgio Moro e, em setembro, o Tribunal Superior Eleitoral.

O grande analista político americano Bill Whittle afirma que a verdadeira superioridade da direita em relação à esquerda no campo eleitoral é que a esquerda precisa esconder a realidade com tapumes, enquanto a direita, por despreparada, atrapalhada e mal assessorada que seja, só precisa mostrá-la. É o diagnóstico perfeito para o Brasil hoje, potencializado ao máximo nesta semana.

O PT tem essa grande esperança, mas também esta criação de narrativas falsas é seu calcanhar de Aquiles, sua enorme ferida exposta. Confundir militância com povo só funciona enquanto quem conta é o Datafolha, enquanto o teatrinho está sendo feito através de manifestações compradas, fotos aéreas com ângulos fechados, colunistas de esquerda e blogs que recebem muito mais do que “30 conto” e um pão com mortadela.

Assim que a realidade dos números aparece, com a população majoritariamente contrária ao PT, com ninguém comprando a litania de “golpe”, ninguém que não seja sindicalista ou universitário frustrado desesperado por acreditar que o impeachment acaba com a nossa democracia, o PT só pode se desesperar, e ver toda a narrativa que construiu por 3 décadas se esfarelar.

E aí, adeus Lulinha paz e amor, e já lemos notícias diferentes antes mesmo do resultado do pleito: que Lula não sairá das ruas, que petistas já avaliam montar “bunker” no Palácio da Alvorada, que o Planalto já discute a hipótese de decretar Estado de defesaAnd so on.

Quanto maior a ilusão, maior a decepção. E quando a verdade vir à tona, a esperança petista de confundir sua própria militância com o povo que dá um dígito de aprovação a Dilma será o maior baque político em uma ideologia que já aconteceu em nosso país. Os jovens finalmente conhecerão o PT perdedor e agitador dos anos 80 e 90.

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Assuntos:
Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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