Haddad contra o Uber: um conto urbano
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Imagine que um cidadão A plante batatas. Deixada ao natural, a terra é apenas terra, e não alimento. Quando o cidadão A planta batatas, ele transforma a terra em alimento, criando uma riqueza que antes não existia.
Imagine que um cidadão B plante tomates. Da mesma forma que com o cidadão A, ao natural, a terra não é alimento, e a riqueza desejável que é criada só existe graças ao trabalho do cidadão B.
Imagine que o cidadão A e o cidadão B não queiram só comer batatas e tomates, respectivamente. Então, eles plantam além da sua mera subsistência, e trocam o excedente entre si – por escambo, ou por alguma tecnologia mais poderosa, como o dinheiro.
Agora, ao invés de pobres agricultores, podemos ter cidadãos que se alimentam de comidas mais ricas e complexas, e que podem aumentar sua riqueza mutuamente criando mais coisas desejáveis a si e a outras pessoas. Nenhuma “exploração” no processo.
Imagine agora que o cidadão C não plantou nem batatas, e nem tomates, mas tem desejo por batatas e tomates. Ao invés de plantá-los, ou trocar com o cidadão A ou B por algo que estes desejem, ele diz que antes mesmo de o cidadão A e o cidadão B plantarem o que quiserem, ambos lhes devem 60 mil batatas e 60 mil tomates, do contrário não têm nem mesmo o direito de plantar ou vender ou comprar nada.
Vamos chamar o cidadão C hipoteticamente de Fernando Haddad.
Foi no comando da prefeitura de São Paulo que Fernando Haddad conseguiu deixar saudade da sua atuação como o ministro da Educação – que só piorou os péssimos índices e ficou marcada por escândalos como o do “kit gay” e os fiascos do ENEM.
Fernando Haddad e sua prefeitura moderninha (moderníssima, futurista, quase) quis proibir o Uber, o aplicativo de caronas privadas, na cidade de São Paulo.
Através do Uber, o cidadão A pode oferecer caronas por um preço X, enquanto o cidadão B e tantos outros cidadãos, desejosos dessa carona, trocam o fruto de seu trabalho (sejam agricultores, professores, advogados, médicos, artistas etc) por esta carona, livremente, através de dinheiro.
Os motoristas do Uber são avaliados anonimamente pelos próprios usuários do aplicativo, o que torna a experiência, por uma aplicação simples das leis de oferta e procura, das mais promissoras: ao contrário dos táxis, motoristas mais bem avaliados e que satisfaçam mais seus clientes obtêm melhor pontuação – e sendo tais pontos desejados pelos próprios motoristas, que ganham mais clientes, os motoristas buscam criar a melhor experiência possível para os usuários: os motoristas de Uber são sempre considerados muito atenciosos, educados e sem trambiques (os taxistas podem ser os melhores possíveis, mas dependem apenas de sua própria vontade e de seus caprichos para tal: não recebem incentivos e recompensas por isso, e ganharão o mesmo se não satisfizerem seus clientes).
Tudo no Uber funcionava muito bem, até a prefeitura de Fernando Haddad (e tantas outras prefeituras “modernizantes” pelo país, tão preocupadas em nos salvar de nós mesmos) instituir que o Uber está proibido. Após uma liminar revogando a proibição, sua gestão na prefeitura teve uma idéia melhor: exigir licenças para os motoristas de Uber que chegam até a R$ 60 mil.
Por que R$ 60 mil? Ora, porque Haddad assim determinou. A prefeitura não produz a riqueza ou o serviço desejado pela população. Mas o cidadão C achou por bem exigir que os cidadãos A e B não possam melhorar suas vidas através do Uber sem antes deixar R$ 60 mil para os cofres de planejamento estratégico de Fernando Haddad.
Claro, a prefeitura não apenas não ajuda, como atrapalha: reduz a velocidade de vias expressas da cidade para 50 km/h, colocando um radar em cada poste e até fiscais que ficam com uma pistola nas pontes (!) para gerar multas (o “modelo” arroga-se copiado de cidades do primeiro mundo como Londres, onde a limitação é apenas no perímetro central, e as vias expressas ultrapassam os 120 km/h de limite).
Mas por que não ajudar tungando mais um pouquinho? Diga-se, aliás, que o modelo de prefeitura de “aceitação” do Uber é torná-los todos pretos, chamando-o de “táxi preto”. o Uber não é um táxi, ou perde a sua função e até a sua segurança. E isto mina justamente o modelo do Uber que atende atualmente a periferia, onde táxis nem sequer aparecem, oferecendo uma alternativa barata para quem mora em bairros violentos.
Para Fernando Haddad continuar na prefeitura e dormindo sonhos tranqüilos sem acordar transformado em uma barata, tudo tem sempre uma desculpa social, um planejamento central.
Sempre alguém vai dizer que o cidadão C, apesar dos pesares, é o correto na relação econômica. Afinal, ele está proibindo que A possa acabar ganhando mais dinheiro do que um concorrente se for bem avaliado, que B solte pum no carro, algo do tipo. É o mistifório de “corrigir as desigualdades” ou coisa assim através da “regulamentação”.
Tudo por um planejamento central, aquilo que, para uma mentalidade moderninha, vai corrigir todos os nossos problemas, bastando ter alguém jovem, bonitão e bem intencionado para proibir as coisas erradas e obrigar as coisas certas através do controle intervencionista. Eles acreditam que é mais eficiente para gerar bons serviços do que avaliações anônimas que recompensem até financeiramente a boa prestação.
Para moderninhos, que juram que Londres ou Amsterdã têm alguma coisa a ver com a gestão Haddad, pode ser que seja convincente que a prefeitura moderninha seja a que nos faz andar como lesmas por vias expressas, tornando mais dispendioso o uso de uma via que foi feita para ser, ehrr, expressa. E talvez por isso mereça uns R$ 60 mil de cada, apenas pelas boas intenções. Afinal, foi Fernando Haddad que, em entrevista ao El País deste domingo, afirmou: “Sou um agente da civilização contra a barbárie” (sic).
Seus caudatários são gente que não leu O Caminho da Servidão, de Friedrich Hayek: cada nova atuação estatal servirá para corrigir a atuação estatal anterior, e em pouco tempo nem nos lembraremos de qual foi a desculpa para a primeira intervenção.
Em nossa realidade longe de firulas intelectuais, ainda vemos como justos apenas os cidadãos A e B, não conseguindo enxergar nem alguma coisa justificada, nem muito menos algum heroísmo em dar R$ 60 mil para o cidadão C.
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