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Óbvio lulante

O crime é OCULTAÇÃO de patrimônio. Qual a dificuldade para os petistas entenderem?

Antes de falar em "escritura" ou que o triplex é na verdade da OAS, explique ao amigo petista: o crime é de ocultação. Ocultação. Ocultação!

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Triplex no Guarujá de Lula.

Uma das características mais achapantes linguagens totalitárias, como estudadas por George Orwell (1984), Jean-Pierre Faye (Introdução às Linguagens Totalitárias) ou Victor Klemperer (LTI: A Linguagem do Terceiro Reich) é sua incapacidade de lidar com múltiplas camadas de significado ao mesmo tempo, possibilitando tanto o complexo pensamento poético quanto a precisão de um silogismo lógico.

Na linguagem totalitária, tudo é exagerado (“fascistas! golpe! destróem nossos direitos!”), enquanto a vida real continua completamente normal. O falante de uma linguagem totalitária é hipersensibilizado e reage a qualquer palavra de imediato, sem formá-la em uma frase (que dirá um argumento lógico, um discurso multifacetado, uma investigação com idas e vindas) e já sai correndo ao abraço ou ao cadafalso a cada vocábulo proferido (“homofobia! machismo! racismo! nazismo!”).

Graças a esta doença da linguagem e ao ensino socio-construtivista de Paulo Freire e quejandos, petistas e aqueles encantados pelo canto da sereia do discurso “social” da esquerda estão com uma dificuldade brutal de entender o que está em jogo na investigação do triplex no Guarujá e no sítio de Atibaia, utilizados por Lula.

O crime investigado é o de ocultação de patrimônio. Ocultação. Não ostentação, em termos capazes de serem apreendidos até por leitores de Leonardo Sakamoto. É ocultação. O ato de ter um patrimônio e ocultá-lo.

Para a esquerda, tão viciada em falar de “sonegação” e tentar resolver todos os problemas do mundo aumentando impostos, tirando dinheiro do bolso do trabalhador e o transferindo para o controle de políticos (o que pode dar errado?), bastaria fazer uma analogia. Talvez reclamar que Lula não tem pagado os impostos ajudaria a deixar esquerdistas com os cabelos em pé.

É claro, é preciso manter tal informação tríplice fresca nas sinapses (Lula desfruta de um bem; o bem não é dele; ele oculta que desfruta do bem) e adicionar o componente que transfere o caso de mero problema com a tão amada Receita Federal para a esfera criminal: o patrimônio, ao que tudo indica, lhe foi dado como propina em troca da facilidade de contratos com o governo. Correlato à ocultação de patrimônio, há o crime de lavagem de dinheiro.

Ora, é algo simples de entender: ao invés de dinheiro vivo, o que daria nas caras mesmo do partido mais profissional na lavagem de dinheiro, Lula recebia diretamente os bens milionários, sem precisar passar dinheiro por sua conta, o que faria com que a operação fosse percebida.

Assim, quando a defesa de Lula saca imediatamente a frase feita “Não há escritura em nome de Lula” para dizer que ele está ileso, está apenas jogando para a platéia de trouxas que sabem serem trouxas manipuláveis, tratando-os como imbecis: afinal, é tautológico que, num processo de ocultação de patrimônio, o patrimônio está oculto (se houvesse escritura, Lula dificilmente seria obrigado a mostrar como tem dinheiro para um triplex).

Juridicamente, é nulo: o juiz sabe muito bem. Para manipular uma militância que julgam ter a capacidade de raciocínio de uma planária, é uma aposta certa. Como Lula só não está preso pela comoção social, sua defesa sabe bem o que faz.

O mesmo se dá quando Lula garante que o triplex é da OAS. Pode facilitar a reação de quem pensa em uma única camada, de quem reage de pronto a qualquer palavra como uma mosca varejeira segue a direção de excrementos: juridicamente, ainda é o que a própria acusação está lhe dizendo. Ou quando blogs dizem que “não encontraram documentos provando que o triplex é de Lula” (o mesmo que precisar haver “documentos” provando que o dinheiro na Suíça é de Eduardo Cunha).

Se o crime investigado que Lula se confunde todo para tentar alegar inocência é de ocultação de patrimônio, o que se deveria fazer, tanto juridicamente quanto pela lógica mais rudimentar, é demonstrar que não houve interesse da OAS em lhe entregar um triplex. Que não havia interesse seu no triplex (“achei muito pequeno” e “só poderia ir à praia quarta-feira de cinzas” apenas confirmam as reformas que a OAS fez, tal como “Dona Marisa não gostava de praia” não se coaduna bem com suas fotos na praia e nem com “Dona Marisa é que cuidava de tudo com o Léo”).

Enquanto isso, pessoas que dificilmente escapam a essa incapacidade brutal de raciocinar o que qualquer povo incivilizado já podia perceber (é difícil crer que sejam apenas malvados, isso exigiria muito mais inteligência do que flagramos deles) são pródigas em soltar tais sandices, como a de Alex “black blocs são de direita porque usam máscaras” Solnik:

A confissão é a rainha de todas as provas – confessio regina probationum est, já sabiam os romanos. Se os indícios apontam para diversas reuniões que Lula não consegue explicar, documentos atestam que o triplex era um “presentinho” pelo qual ele nunca iria pagar (afinal, estavam praticando ocultação de patrimônio), há confissões e mais confissões que apenas complicam a vida dos confessores e a defesa Lula só sabe repetir que o triplex era na verdade da OAS e que não há nenhuma escritura com assinatura de Lula (mas há documentos em seu apartamento relativos à pequena gorjeta de três andares), quem ainda é trouxa de acreditar numa defesa repetindo flatus vocis, palavras vazias, para tontos repetirem asnaticamente?

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Assuntos:
Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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