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Censura

Danilo Gentili x Maria do Rosário: Entre um humorista e um político, defenda sempre o humorista

Danilo Gentili é vítima de tentativa de censura de uma deputada usando o Estado com fins particulares. Mas quem é tratado como "opressor"?

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Danilo Gentili e Maria do Rosário

George Orwell, em sua devastadora análise do totalitarismo, percebeu que em um sistema onde tudo é controlado pelo Estado, a linguagem não poderia permitir alguma crítica ao governo. Assim, se criaria a novilíngua, uma língua que não permita ironia, duplos sentidos ou nada que não trate o governo como potência pura a ser obedecida.

A primeira vítima do totalitarismo, e os tempos atuais o provam, são os humoristas: usam justamente das falhas da linguagem oficial para chegar ao pensamento verdadeiro, não ao que o governo permite que se pense.

O humorista mais engraçado (por ser mais competente) e, portanto, mais perseguido do Brasil é Danilo Gentili, apresentador do The Noite, do SBT. Danilo Gentili é bom porque sabe fazer humor, que não são apenas piadas: são, muitas vezes, criticas mordazes, variando da ironia machadiana à verve sardônica de um H. L. Mencken, Jonathan Swift, Karl Kraus (que conseguiu a façanha de fazer ironia em alemão), P. J. O’Rourke ou mesmo dos antigos, como Aristófanes, Plauto e Calímaco.

O principal alvo dos humoristas, e esta sempre foi a tese da esquerda, são os poderosos (principal, mas não único). Danilo Gentili sempre faz troça mostrando a incoerência, o despreparo, a burrice aberta, o abuso dos nossos poderosos.

Uma poderosa, a deputada petista Maria do Rosário, ex-PCdoB, não gostou de Danilo Gentili fazer o povo rir de sua incoerência. A deputada é famosa pelo coitadismo penal, a defesa ideológica de bandidos os mais perigosos. Ficou famosa no Brasil inteiro pela defesa de um dos maiores psicopatas do país, Champinha, que sequestrou o casal Liana Friedenbach e Felipe Caffé em novembro de 2003.

Após ordenar a morte de Felipe com um tiro de espingarda na nuca, Champinha estuprou Liana seguidamente com seu bando por cinco dias. A menina foi tão estuprada que sua vagina foi destruída. Após falhar em pedir um resgate, já que o caso estava na mídia, Champinha achou por bem matá-la lentamente, com facadas em seu pescoço, costas e barriga, durante outra sessão de estupro na madrugada. Liana foi degolada a facadas frias, que fazem as execuções do Estado Islâmico parecerem matinê.

Mas, para Maria do Rosário, o psicopata Champinha, à época com 16 anos, era apenas “uma criança”, o que gerou sua famosa rusga com o deputado Jair Bolsonaro. Para adicionar insulto à injúria, Maria do Rosário ainda disse que Jair Bolsonaro, que pedia um debate por penas mais severas, era um estuprador. Logo ela, que estava defendendo o estuprador mais assustador do país.

Não surpreende, a quem está acostumado com a esquerda, que Maria do Rosário seja considerada “feminista”, e lute por “direitos humanos”, aqueles já chamados popularmente de “direitos dos manos”, por nunca defenderem o povo que sofre com bandidos.

Afinal, feministas criticam a “cultura de estupro”, mas não estupradores de verdade, como Champinha (preferem chamar de machista um Danilo Gentili, e de estuprador, um Jair Bolsonaro). E nunca ligam para os direitos humanos de vítimas de estupradores, se não podem catapultar uma tese comunista ou sobre luta de classes no bojo.

Danilo Gentili, como humorista que é, mostrou o ridículo que é percebido das contradições do pensamento de Maria do Rosário. É como o humor atua, filosoficamente (vide o famoso ensaio O Riso, de Henri Bergson): quando alguém que deve ser algo age em desconformidade com o seu dever ser, o efeito natural causado é o ridículo. Quando alguém falha em seu dever ser com estardalhaço, grandiosa e grotescamente, o efeito é hiperbolizado, e a derrisão é obrigatória. Ninguém consegue controlar o riso diante de um ridículo tão ridículo.

Maria do Rosário poderia contra-argumentar, seja lá como seria possível. Ou poderia fazer algo mais de acordo com o seu dever-ser, como deputada que se pretende ser levada a sério: corrigir-se e apresentar-se elevada, abolindo a parte de seu pensamento que é contraditória, buscando um todo coerente do qual ninguém conseguiria rir.

O que Maria do Rosário preferiu fazer foi a ação política – exatamente aquela hybris que Édipo comete, tentando resolver um problema sagrado através do poder político: o uso da força para que aqueles que estão rindo de seu pensamento não riam mais. Ao invés de parar de dar motivo para as pessoas rirem, Maria do Rosário preferiu insistir na causa, e calar a conseqüência arbitrariamente, com o peso do Estado, do qual usa em causa própria não para moralizar a sociedade ou buscar uma justiça social, e sim para não parecer risível.

O marxista Jean-Paul Sartre dizia que se amamos uma mulher, é porque ela é amável. O mesmo podemos dizer de quando rimos de um deputado, seja lá qual for seu sexo. Já para o deputado, a realidade não importa: basta usar da força do Estado, por uma causa particular, para calar a realidade. Os fatos não são o que petistas mais buscam.

Danilo Gentili recebeu uma notificação extrajudicial da deputada. Uma notificação como esta, apesar do nome pomposo, não tem peso jurídico nenhum: é apenas um aviso. Maria do Rosário queria que Danilo se calasse e apagasse seus posts, pelo “crime” de rir de um político agindo em desacordo com sua função e com os anseios do povo. E com a lógica mais elementar. Aquele crime que George Orwell conhecia tão bem.

Em resposta, Danilo fez mais algo que fez o povo inteiro dar risada: rasgou a notificação, esfregou em suas gônodas e mandou de volta.

https://www.youtube.com/watch?v=icAuQpoS9QE

Imprensa, intelectuais, celebridades, artistas e outros membros da classe falante, aqueles que Emil Cioran chamava humoristicamente de “espermatozóides verbosos”, usando daquele manjado vocabulário da novilíngua que não permite críticas ao poder, sacaram palavras como “machismo” e “misoginia” para não ter de lidar com a lógica do caso.

Revista Fórum - Patrícia Lellis diz que Danilo Gentili é de mal gostoO que há de machismo ou misoginia em responder a uma tentativa de censura? Caso fosse Jean Wyllys respondendo a Jair Bolsonaro, certamente diriam que foi um “lacre”, que o deputado socialista “humilhou” o truão deputado. Tal como os sites progressistas já disseram que Janaína Paschoal foi “alvo de escracho” em aeroporto, quando foi ameaçada fisicamente, mas depois choramingam quando qualquer mulher de esquerda é “agredida verbalmente” (note a potência vernacular).

A resposta de Danilo Gentili foi de “mal gosto” (sic), como alguns alpinistas tentam escrever em péssima gramática? Ora, como se deve reagir a tentativas de censura, do uso do poder físico do Estado, para impedir pensamentos que apenas agem de acordo com a realidade? Maria do Rosário está sendo “educada” ao calar pessoas com ameaças?

Como uma das ironias da vida que a novilíngua não consegue proibir que se note, um dos tweets que Maria do Rosário quer mandar ao “não-ser” envolve justamente Danilo Gentili cobrando coerência da parlamentar quando a deputada defendeu os cuspes de José de Abreu (em uma mulher!) e Jean Wyllys.

Maria do Rosário - cuspe de José Dirceu e Jean Wyllys

Cuspir no rosto de uma mulher pode, é uma “reação imediata”. Ridicularizar uma tentativa de censura justamente à defesa de uma mulher inocente que foi cuspida por quem defende o cuspidor, ora, isto é “misoginia e machismo”? A qualquer defensor da liberdade, não é nem uma “reação imediata” – é uma reação obrigatória.

Nem voltemos a descrever o ato de Champinha.

Ainda que fosse de “mal gosto” (sic), é para isso que exige a liberdade. Se precisássemos nos adequar ao que um político pensa e quer, a novilíngua nem precisaria existir: o totalitarismo já existiria e todos trataríamos políticos como deuses.

Sabemos que alguns de fato fazem isso. Mas é justamente por conta desses negadores da realidade que existem humoristas.

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Assuntos:
Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

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