Digite para buscar

Ofendendo quem não é bela, recatada e do lar

Compartilhar

vadias livres

A revista Veja chamou a futura primeira-dama do Brasil, Marcela Temer, de “bela, recatada e do lar”. O Twitter pirou com a descrição, criando até a hashtag #belarecatadaedolar para zombeterar a revista – confirmando a tese de que não importa quantas críticas a revista Veja mereça, é a crítica ir parar nos Trending Topics para se ter certeza de que a Veja está certa.

Dúvida: Marcela Temer não é bela? Não é recatada? Não é do lar? Então… qual o raio do problema com a descrição da revista, cazzo?

Lendo-se posts por aí, descobre-se facilmente o óbvio ululante para quem estudou movimentos como o feminismo. Segundo consta em posts de intelectuais gabaritadíssimos no Facebook, a revista está sendo machista (e talvez racista e homofóbica e, quiçá, nazista) por defender que Marcela Temer é bela. E recatada. E do lar.

https://twitter.com/mvsmotta/status/722822447758712832

https://twitter.com/mvsmotta/status/722822447758712832

Ou seja: ao descrever o comportamento de Marcela Temer, comportamento real, que Marcela Temer possui, a revista está automaticamente defendendo este modelo para todas as mulheres. Incluindo que todas as mulheres devem ser belas, quando basta um giro pela mocreiosfera progressista para se ver que as mulheres feministas não são lá bem recatadas, nem do lar, menos ainda belas.

Acarretamento lógico para elas: que estamos vivendo oficialmente sob o nazismo mais nazista, e mulheres como Dilma Rousseff, não bela, segundo sua (deles) visão não-recatada (!), pouco do lar, estão sendo escorraçadas da política por uma limpeza étnica para trocá-la por mulheres belas, recatadas e do lar.

Este é um dos mais sérios problemas da nova versão do marxismo, que trocou a luta de classes pela luta de “minorias” contra supostas “maiorias”. Da Escola de Frankfurt à análise do discurso, marxismo, psicanálise e semiótica são sempre usados para se buscar “roupagens ideológicas” em tudo o que se diz.

Ugly FeministsResultado: enxerga-se apenas uma propaganda política de dominação contra supostos oprimidos, quando se apenas se descreve a realidade (“está aí uma moça bela, recatada e do lar”). A linguagem se torna um fim em si mesma, sem nenhum referencial à realidade, apenas sendo objeto de disputa não apenas política, mas eleitoral (logo logo estarão chamando de “tucanos” quem considera Marcela Temer bela. Ou recatada. Ou do lar.).

A realidade já não importa: dizer que Marcela Temer é bela (ou mesmo coisas ainda mais irrefutáveis, como ser recatada e do lar, fatos sólidos e indisputáveis) é proibido. Pois tudo seria “ideológico”. Sem perceber, os arautos do “pensamento crítico” colocam a sua própria ideologia antes da realidade, juranto que encontram “ideologia” em todos os que narram a mera realidade sem dar opinião nenhuma.

Assim, descrição vira propaganda, e falar a verdade é sempre um ato reacionário, digno de receber um quadrimestre de críticas em colunas de Leonardo Sakamoto e Nana Soares. E toda a preocupação pública se foca apenas na luta dxs oprimidxs de ocasião, e não nos resultados.

Ou seja: se antes a luta era pelos pobres, o capitalismo provou que consegue enriquecê-los muito mais do que o socialismo (pergunte aos coreanos de ambos os lados da fronteira). Então, ao invés de abraçar o capitalismo, critica-se os ricos (mesmo os que eram pobres na geração passada ou há 10 anos), porque passam imediatamente a fazer inveja aos pobres.

Motivo óbvio: pobres que enriquecem não precisam mais de você e sua política “emancipatória”. Logo, é bom dizer que fins mundos e fundos pelos pobres, mas até quase eles se tornarem livres. Livres livres eles já não servem mais.

feminazi suvaco peludoComo a esquerda econômica é sempre uma espécie de teimosia da ideologia perante a realidade (precisamos de mais de meio século entre um Keynes e um Piketty, já que a esquerda é sempre minoritária na economia), restou recriar a luta de classes marxista no tripé raça-gênero-sexualidade, o que ainda dá a vantagem de ricaços bens de vida nadando no conforto opulento do capitalismo se considerarem extremos da opressão por serem negros, mulheres ou terem alguma frustração sexual que não é aceita publicamente pelo lado “arcaico” da sociedade (incluso aí aqueles que só não querem que você faça nada sexualmente ativo em público, mas defendem sua liberdade entre quatro paredes de fazer o que você bem entender com o seu anel de couro, incluindo, mas não se limitando a, dar, vender, alugar, emprestar, leiloar, penhorar, hipotecar, rifar, ceder nas formas de leasing, comodato ou alguma outra forma de alienação prevista pelas legislações tributária e civil vigentes).

Portanto, se uma geração de pobres enriquece (novamente, pergunte a um sul-coreano sobre seus pais), adeus, esquerda. Se uma geração de pobres fica com algumas migalhas a mais, viva a esquerda. Se uma mulher vence na vida, se realiza, tem os filhos que quiser, a religião que quiser, o marido que quiser e for dona da empresa lucrativa que quiser (pergunte à Sylvia Design), adeus, esquerda. Se ela for dependente não mais do tal “patriarcado”, mas de um grupo que diga que se você possuir uma genitália engravidável você deve votar neles e ser contra o impeachment, uhuuuu, a esquerda me liberta, a direita é opressora.

marcha-vadias-2015Ou seja: pessoas realizadas, que têm o que querem da vida sem serem dependentes, são as pessoas mais odiáveis para a esquerda, que é, por definição, a teoria de que todos devem ser dependentes do Estado.

O curioso é que para o teatrinho funcionar e se fazerem de “livres” graças à adesão a um grupinho (o que é a própria definição de dependência absoluta e integral), precisam se pintar de “vadias”, “vítimas potenciais de estupro” e garantirem que sofrem preconceito por sua liberação sexual, quanto mais longe estiverem de poder potencializar tais condições.

Lembram bastante o que Will Durant dizia de Nietzsche, tão crítico da moral cristã, quase tão casto quanto um padre: criticando a negação do mundo do cristianismo, não deixava de ser um santo que sonhava em ser um pecador.

Além da contradição óbvia, gera ainda outro efeito contraproducente: aquilo que é visto como desejável (enriquecer, ser considerada bonita, ter o que se quer da vida, não sofrer preconceito etc) passa a ser destacado como motivo de zombaria se concretizado. Quem vai precisar de revista Fórum, de Lola Aronovich, de discussões sobre padrão ocidental de beleza, de feminismo, de Socialista Morena, de psicanálise, de Marcha das Vadias, de Jean Wyllys, de “oficina de siririca e chuca” em faculdade de Humanas, de Simone de Beauvoir, de Jandira Feghali, de Laerte Coutinho se alguém possui uma vida social, afetiva e sexual satisfeita?

marcha das vadias fubangasPior: ninguém pode ser maior adversário da esquerda do que uma “minoria” que não precise da esquerda. É um traidor. Pobre que não precisou de Bolsa Família para subir na vida e não considera o petrolão uma “corrupção do bem” e nem chama o mensalão de “ação penal 470, o chamado mensalão”? Coxinha tucano pau mandado da elite. Negro que não esteja perigosamente no limiar do racismo contra brancos? É “negro de alma branca” ou “capitão do mato”. Homossexual que não seja gayzista? Quase um Adolf Hitler. Mulher que não grite contra a gordofobia e se considere vítima do patriarcado machista opressor? Praticamente um Jair Bolsonaro de saias.

O feminismo, então, apesar da propaganda sobre todas as mulheres, só pode defender as mulheres aguerridas na implantação da agenda politicamente correta e do controle político de linguagem. Se uma mulher quiser ser feminina, dona de casa, mãe, conservadora, ir à igreja no domingo, defender família tradicional e considerar o PT corrupto e até um pouquinho anti-republicano em sua mania de confundir o Estado com o partido, a feminista já desiste de defender sua liberdade feminina, mas passa a considerá-la um protótipo do que deve ser estereotipado como uma submissão horrenda, usando uma caricatura sua para prejudicá-la pessoal e socialmente.

marcha_das_vadias monstroÉ a crença de que uma mulher só é livre caso se torne uma ativista, uma maluca usando sua condição de mulher para defender o que o partido atual a mande defender, para fazer campanha de “famosas” para achincalhar sua reputação, usando qualquer traço feminino seu desavergonhadamente como algo a ser ridicularizado.

Marcela Temer foi a pessoa a provar à nação o que já afiançava o gênio G. K. Chesterton: “O feminismo trouxe a ideia confusa de que as mulheres são livres quando servem aos seus empregadores, mas são escravas quando ajudam seus maridos”.

Curiosamente, em três simples expressões, a revista Veja conseguiu mostrar por que as esquerdistas odeiam mulheres de direita que lhe fazem inveja, enquanto feministas nunca conseguem provocar inveja de sua “liberdade” e “consciência crítica” em mulheres realizadas e satisfeitas com suas conquistas. E olha que Marcela Temer está a anos-luz de ser uma mulher “de direita”.

Afinal, o feminismo só quer impor um novo padrão de beleza, baseado na feiúra, essa que é universalmente atingível, para trocar toda a psicologia humana pelo vitimismo partidário.

marcela temer

Contribua para manter o Senso Incomum no ar se tornando nosso patrão através de nosso Patreon – precisamos de você!

Não perca nossas análises culturais e políticas curtindo nossa página no Facebook 

E espalhe novos pensamentos seguindo nosso perfil no Twitter: @sensoinc

Saiba mais:













Assuntos:
Flavio Morgenstern

Flavio Morgenstern é escritor, analista político, palestrante e tradutor. Seu trabalho tem foco nas relações entre linguagem e poder e em construções de narrativas. É autor do livro "Por trás da máscara: do passe livre aos black blocs". Tem passagens pela Jovem Pan, RedeTV!, Gazeta do Povo e Die Weltwoche, na Suiça.

  • 1
plugins premium WordPress